Assalto à Petrobrás levou Lula à prisão
Na fila, Aécio, Temer, Jucá, Renan, Moreira, Padilha, Lobão, Collor, etc.
A prisão de Lula, após a encenação do final da semana passada, é um importante divisor de águas em uma questão decisiva: não importa quem seja o criminoso – Lula foi condenado por assaltar a Petrobrás, isto é, por receber propina de uma empreiteira que achacava a estatal – a lei é a mesma para todos. E o que a lei diz, assim como as mais elementares normas de convivência social, é que roubar é errado, que roubar é crime – mais ainda quando o roubo é ao dinheiro e à propriedade do povo. Mais ainda quando quem o comete é um indivíduo em quem a população depositou a sua confiança.
Há quem prefira se iludir sobre as razões que levaram Lula a ser preso – e não existe como curar uma toxicomania, se o sujeito prefere ser viciado. Mas as ilusões não mudam a realidade: Lula foi preso porque roubou. Não foi por outra razão.
No entanto, seria injusto que somente Lula, Cunha, Geddel, Argello, Vaccari e alguns outros (há, no momento, 77 condenados em segunda instância, na Lava Jato) sejam processados, julgados e presos. Se o direito do criminoso é a pena, a prisão não pode ser um privilégio de apenas alguns ladrões…
Logo, o próximo passo para colocar na cadeia os corruptos que cevaram suas contas e patrimônio com dinheiro público, é acabar com o famigerado “foro privilegiado”.
É essa instituição feudal que impede, por exemplo, o senador Aécio Neves de ser processado e julgado pela Justiça comum. Não há falta de provas, somente esse privilégio impede Aécio de pagar por seus crimes, vistos até em rede nacional, pela televisão. Debaixo da mesma redoma, estão Temer, Moreira Franco, Romero Jucá, Collor, e, claro, Gleisi Hoffman e mais outros heróis petistas.
Em dezembro de 2002, após a eleição de Lula, o PT, PMDB e PSDB aprovaram no Congresso a extensão desse “foro privilegiado” também aos ex-presidentes, ex-governadores e ex-prefeitos, algo que jamais existiu no país, pela simples razão de que o foro privilegiado é uma prerrogativa da função e não do indivíduo que exerce a função.
Por essa razão, o foro privilegiado para ex-governantes foi derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), até porque já havia decisão sobre esse assunto desde 1962, em uma das sentenças mais famosas da História do Direito do Brasil, de autoria do legendário ministro Vitor Nunes Leal – que, depois, seria um dos ministros do STF aposentados compulsoriamente por não se dobrar à ditadura.
Mas, vejamos a situação de agora.
No Brasil, o presidente da República, os ministros, os senadores e os deputados não podem ser processados pela mesma Justiça a que responde qualquer cidadão – seus crimes somente podem ser investigados e julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), “inclusive os praticados antes da investidura no cargo e os que não guardam qualquer relação com o seu exercício”.
Qual o resultado disso?
“… o prazo médio para recebimento de uma denúncia pela Corte [STF] é de 581 dias. Um juiz de 1º grau a recebe em menos de uma semana. (…) calcula-se que a média de tempo transcorrido desde a autuação de ações penais no STF até o seu trânsito em julgado seja de 1.377 dias. No limite, processos chegam a tramitar por mais de 10 anos. (…) mesmo após longa tramitação, o resultado mais comum em ações penais e inquéritos perante o STF é a frustração. (…) em 2 de cada 3 ações penais o mérito da acusação sequer chega a ser avaliado pelo Supremo, em razão do declínio de competência (63,6% das decisões) ou da prescrição (4,7% das decisões). Também no caso dos inquéritos, quase 40% das decisões do STF são de declínio de competência ou de prescrição” (cf. STF, rel. L.R. Barroso, Ação Penal 937, p. 8).
É por isso que todos os corruptos querem ser julgados pelo STF – a ponto de Lula promover Meirelles a ministro para fazê-lo escapar das acusações no caso Banestado, processo que corria, em 2002 e 2003, na Vara de um juiz chamado Sérgio Moro. Do mesmo modo, Dilma tentou nomear Lula ministro, para que ele escapasse, com o foro privilegiado, do mesmo Moro, agora juiz nos processos da Operação Lava Jato.
O ministro Barroso nota que isso nunca existiu antes no Brasil – e nem existe em país algum do mundo: “Tamanha extensão do foro por prerrogativa de função não encontra paralelo nem na história constitucional brasileira, nem no Direito Comparado. No Brasil, ainda que a prerrogativa tenha sido prevista em todas as Constituições anteriores, o número de autoridades beneficiadas inicialmente era muito reduzido, tendo sido progressivamente ampliado até chegar ao rol atual. Curiosamente, os membros do Congresso Nacional apenas passaram a deter foro por prerrogativa de função durante a ditadura militar, com a promulgação da Carta de 1969. Compensou-se a irrelevância política com prerrogativas processuais” (idem, grifo nosso).
Por essa razão – porque, no STF, o réu, com muito raras exceções, escapa da Lei e da Justiça – o ministro Luís Roberto Barroso propôs, no julgamento de uma ação penal contra um deputado federal, que o STF fizesse uma “interpretação restritiva” da Constituição, pela qual o “foro privilegiado” somente valeria para “os crimes que tenham sido praticados durante o exercício do cargo e em razão dele”.
Isto reduziria os processos contra políticos no STF a 10% da quantidade atual – por exemplo, todos os atos de corrupção perpetrados durante um mandato não poderiam ser protegidos por foro privilegiado em outro mandato. Portanto, 90% dos processos iriam para o juiz Moro e seus colegas.
No dia 23 de novembro do ano passado, oito ministros do STF já haviam votado sobre a restrição do “foro privilegiado” – sete deles a favor da proposta do relator, ministro Barroso, e um deles, o ministro Alexandre de Moraes, a favor de uma restrição mais leve.
A votação estava, portanto, definida – são 11 os ministros do STF –, quando o ministro Dias Toffoli, um ex-advogado de Lula, nomeado, sucessivamente, Advogado Geral da União e ministro do Supremo, “pediu vistas” do processo, impedindo o término da votação.
O pedido de vistas foi feito após uma reunião de Toffoli com Temer, quatro dias antes.
Qual o sentido de “pedir vistas”, numa situação em que a votação já estava definida?
O único sentido possível é, tão somente, impedir a proclamação do resultado.
No entanto, o recurso de “pedir vistas” não existe para isso – é uma forma de possibilitar aos ministros do STF um estudo maior do processo.
Mas não havia mais o que estudar nesse processo – e, mesmo que houvesse, não alteraria a votação em absolutamente nada.
Toffoli declarou, depois, que o objetivo do “pedido de vistas” foi dar tempo aos políticos para que fizessem mudanças na Constituição.
Obviamente, nada foi feito no Congresso. O projeto do senador Randolfe Rodrigues, aprovado no Senado, que acaba com o foro privilegiado, exceto para os presidentes de Poderes (presidentes da República, do Senado, da Câmara e do STF), nunca entrou na pauta da Câmara – e, nessa Câmara, chefiada pelo deputado Rodrigo Maia, jamais vai entrar. São investigados na Operação Lava Jato os que mandam na pauta da atual Câmara.
Em suma, para usar uma expressão comum, inclusive no meio jurídico, Toffoli levou o processo para casa, impedindo a conclusão da votação, e ficou quatro meses com ele. Somente no último dia 27 de março – depois que os ministros Barroso e Marco Aurélio ameaçaram considerar como encerrada a votação de novembro e enviar processos de deputados para a primeira instância – Toffoli devolveu o processo.
A data em que Toffoli o devolveu, no entanto, impediu que a presidente do STF, Cármen Lúcia, pautasse a conclusão do julgamento para abril.
Mas, claro, isso pode ser feito para maio.
CARLOS LOPES
” Se a tributação sem consentimento não é roubo, então todo o BANDO de ladrões só tem que declarar-se um governo, e todos os seus assaltos são legalizados”. São mal educados, sem moral, mal intencionados. Xilindró sem dó.
O HP devia ter um canal no Telegram. Fica aqui minha sugestão.
Perfeito, leitor. Vamos estudar a sua sugestão.