A Rússia ainda não pode comprovar as alegações de Washington sobre a eliminação do líder do Estado Islâmico, disse o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, acrescentando que Abu Bakr Al Baghdadi “é ou foi, se está realmente morto, uma criação dos Estados Unidos”.
“O ISIS, como tal, surgiu após a invasão ilegal do Iraque pelos EUA, o colapso do Estado iraquiano e a libertação de extremistas que os americanos mantinham anteriormente nas prisões lá”, acrescentou o chanceler russo à emissora russa Rossiya 24. Ele assinalou que, “se isso aconteceu”, os norte-americanos “eliminaram sua própria criatura”.
Lavrov disse ainda que os militares russos ainda não têm informações suficientes para confirmar com confiança que o autoproclamado ‘califa’ esteja realmente morto. “Queremos obter informações adicionais”, disse ele.
Como ressaltou o chefe da diplomacia russa, “tudo foi declarado triunfantemente e com júbilo. No entanto, nossos militares ainda estudam a questão e … não podem confirmar muitas declarações dos EUA até agora”.
O porta-voz do Ministério da Defesa russo, general Igor Konashenkov, revelara logo após o anúncio de Washington sobre o ataque a Al Baghdadi que “nenhum ataque aéreo” das forças aéreas norte-americanas da chamada coalizão internacional “foi registrado na zona de desescalada de Idlib no sábado e nos últimos dias”. Ele também desmentiu qualquer suposta “assistência russa” ao ataque norte-americano em Idlib.
PARTICIPANTES IMAGINÁRIOS
Também o presidente sírio Bashar Assad manifestou dúvidas sobre o destino do notório terrorista. “Tomemos as palavras de políticos dos EUA com um pouco de sal” – insistiu – ao comparar a suposta operação contra o chefão do Estado Islâmico com o assassinato de Osama Bin Laden.
Para o presidente sírio, a operação amplamente divulgada das forças especiais do regime Trump deixou mais perguntas do que respostas e não deve ser tomada pelo valor de face.
Damasco não participou do ataque de forma alguma, afirmou Assad, acrescentando que só havia tomado conhecido sobre a reivindicação de Trump por meio da mídia.
“É provável que adicionar participantes imaginários à operação dê credibilidade”, acrescentou o líder sírio, enquanto os países dessa lista provavelmente ficariam lisonjeados por fazer “parte de uma ‘grande’ operação’”.
“Nós não precisamos de tal crédito. Nós somos os que combatemos o terrorismo. Não temos relações e não tivemos contato com nenhuma instituição americana”, reiterou Assad.
MODUS OPERANDI
O presidente sírio então questionou a suposta execução em ataque de Al Baghdadi – que repetiu o cenário de Bin Laden -, comparando com o que foi mostrado por Washington quando da captura do presidente Sadam Hussein. E, acrescentaríamos, também da execução dele por enforcamento sob W. Bush e do linchamento do líder líbio Muamar Kadafi sob Obama.
“Por que os restos de Baghdadi não foram mostrados? Este é o mesmo cenário que foi seguido com Bin Laden. Se eles vão usar pretextos diferentes para não mostrar os restos, lembremos como foi capturado Saddam Hussein e como toda a operação foi mostrada de A a Z; eles mostraram fotos e videoclipes depois que o capturaram. ”
O assassinato dos filhos de Sadam também foi bem documentado e amplamente divulgado, acrescentou Assad, sugerindo que os americanos “escondem tudo” sobre o assassinato de Bin Laden e o de Al Baghdadi por algum motivo.
“Isso faz parte dos truques dos americanos. É por isso que não devemos acreditar em tudo o que eles dizem, a menos que apresentem evidências. Os políticos americanos são realmente culpados até se provarem inocentes, e não o contrário”.
RAIZ WAHABISTA
Em suma, “é improvável que a morte do líder do EI – se ele realmente foi morto – e até a destruição final do grupo terrorista mudem alguma coisa”, disse Assad. A raiz do problema – a ideologia wahabista que tem “mais de dois séculos” – não desapareceria de uma só vez, destacou o presidente sírio.
O pensamento islâmico radical e Al Baghdadi eram “meramente ferramentas dos EUA” o tempo todo, afirmou Assad, acrescentando que essas ferramentas poderiam ser facilmente reutilizadas em outros lugares.
“Eu acredito que tudo sobre essa operação é um truque. Baghdadi será recriado com um nome diferente, um indivíduo diferente ou o ISIS na sua totalidade poderá ser reproduzido conforme necessário sob um nome diferente, mas com o mesmo pensamento e o mesmo objetivo. A direção de todo o cenário é a mesma, os americanos”.
CACHORRO CONDECORADO
Até agora, a Casa Branca realmente só mostrou uma montagem fake de Trump condecorando um cachorro policial que teria encurralado Al Baghdadi, uma cena de terra arrasada em algum lugar e vistas noturnas desde drones, tudo enfeitado com a narrativa do presidente bilionário de que o chefe da gangue terrorista teria fugido por um túnel até se autoexplodir.
“Ele morreu como um cachorro, como um covarde!”, descreveu Trump, esmerando-se em detalhes como o de que o terrorista “choramingava e gritava” – embora ninguém saiba como é que ele ficou sabendo. História comprida à qual se adicionou depois que o corpo – destroçado ? – do terrorista teria sido lançado ao mar.
A execução de Al Baghdadi miraculosamente coincidiu com uma semana de cão para Trump, com o nó do impeachment apertando seu pescoço.
Também parecia um plágio da operação pré-eleitoral de Obama de 2012, com os chefes do Pentágono e da inteligência, na Sala de Crise, encenando dirigir a operação. Com a diferença de que o pessoal de Obama disfarçava melhor que estava posando para a foto. Nem bem o Estado Islâmico supostamente nomeou um sucessor, de bate pronto o regime Trump já anunciou tê-lo eliminado em outro ataque.
Uma semana depois do “feito” da “eliminação de Al Baghdadi”, Trump ao aparecer em público tomou duas vaias monumentais, em uma final do beisebol e no UFC no Madison Square Garden – mais aquele coro que se espalha como um rastilho pelo país: “Lock him up” (“Prendam-no”).