A produção industrial, chave na economia alemã, teve queda de 3,4% em março na comparação com fevereiro. O consumo das famílias caiu 1,2% na comparação trimestral e os gastos públicos caíram 4,9%, nos três primeiros meses do ano
A economia alemã entrou em recessão, após o Produto Interno Bruto (PIB) da maior economia da Europa ter registrado queda de 0,3% entre janeiro e março na comparação com os três meses anteriores. No quarto trimestre de 2022, a Alemanha já havia registrado contração de 0,5%, de acordo com os dados corrigidos por variações sazonais e divulgados pelo instituto Destatis.
Com esses resultados, a Alemanha entrou em recessão técnica, que é definida quando há queda da atividade econômica durante dois trimestres consecutivos.
Esta é a primeira vez que isso acontece no país desde o início da pandemia de coronavírus, que provocou a queda do PIB no primeiro e segundo trimestres de 2020.
Indicadores econômicos do mês de março mostram que a produção industrial, chave na economia alemã, teve queda de 3,4% na comparação com fevereiro.
Os pedidos industriais também registraram forte queda em março, com recuo de 10,7% na comparação com o mês anterior, resultado sem precedentes desde o pior momento da pandemia. As exportações, essenciais para este setor, caíram 5,2%.
Os aliados comerciais do país importaram menos produtos fabricados na Alemanha devido às “turbulências geopolíticas, a inflação elevada e a perda de poder aquisitivo”, afirmou o instituto econômico DIHK.
A indústria alemã, que durante muito tempo foi abastecida pelo gás russo, foi muito afetada no ano passado depois que Berlim apoiou as sanções de Washington contra a Rússia e impossibilitou a continuação do fornecimento do gás por parte de Moscou. A submissão do governo alemão aos ditames dos EUA acarretou forte alta do preço do gás e da energia. Sob o pretexto de punir a Rússia por sua Operação Especial na Ucrânia, os alemães – e os demais países europeus – passaram a comprar gás muito mais caro, fornecido agora pelos EUA.
“A sabotagem ao gasoduto Nord Stream fez parte de uma guerra econômica travada pelos EUA contra a Alemanha em particular e a Europa em geral, forçando o país a substituir o uso do gás russo pelo gás norte-americano mais caro e prejudicial”, afirmou Andrej Hunko, do partido Die Linke, membro do Comitê de Política Internacional do parlamento federal alemão, o Bundestag.
SAIU O GÁS RUSSO E ENTROU O GNL DOS EUA MAIS CARO
“A Alemanha foi privada da possibilidade de escolher qual gás é melhor, mais barato e qual é melhor do ponto de vista ambiental”, declarou ao Jornal Global Times, no final de março passado.
Andrej Hunko lembrou que a Alemanha costumava obter gás natural mais barato da Rússia por meio dos dois gasodutos Nord Stream, mas devido à sabotagem, essa opção não está mais disponível. Por outro lado, sublinhou o político, “agora recebemos gás dos Estados Unidos, GNL, que é muito mais caro e pior do ponto de vista ambiental”.
QUEDA DO CONSUMO E DOS GASTOS PÚBLICOS
E tudo isso em um cenário de desaceleração do consumo interno, devido à inflação, que permanece muito elevada para os padrões alemães, acima de 7%.
“Sob o peso de uma enorme inflação, o consumidor alemão caiu de joelhos, arrastando com ele toda a economia”, assinalou Andreas Scheuerle, analista do DekaBank. O consumo das famílias caiu 1,2% na comparação trimestral, após ajustes de preços, sazonalidade e calendário. Os gastos públicos também diminuíram significativamente, 4,9%, nos três primeiros meses do ano.
“O aumento maciço nos preços da energia cobrou seu preço no semestre de inverno”, disse o economista-chefe do Commerzbank, Joerg Kraemer.
“O clima ameno de inverno, uma recuperação inicial na atividade industrial, ajudada pela reabertura do comércio com a China [pós-pandemia] e uma diminuição dos atritos na cadeia de suprimentos não foram suficientes para tirar a economia da zona de perigo de recessão”, comentou o chefe de macroeconomia global do ING, Carsten Brzeski. “O otimismo do início do ano parece ter dado lugar a um maior senso de realidade”, acrescentou.
Segundo a Reuters, a queda do poder de compra, a redução dos pedidos industriais, o aperto agressivo da política monetária e a expectativa de desaceleração da economia americana são fatores que apontam para uma atividade econômica fraca na Alemanha.
“A economia enfrentou uma fragilidade no inverno (hemisfério norte). Mas continuamos esperando uma melhora considerável ao longo do ano”, afirmou o ministério da Economia.
Mas nem todos são tão otimistas. O FMI previu em abril que a atividade econômica alemã registrará contração de 0,1% este ano, antes de uma recuperação de 1,1% em 2024.
“Foram necessárias algumas revisões estatísticas, mas, no final das contas, a economia alemã realmente se comportou neste inverno da forma que já temíamos desde o verão passado”, disse o economista do banco ING Carsten Brzeski em nota aos clientes.