Aumenta a pressão para CPI ouvir o trio Lemann, Telles e Sicupira, principais acionistas da companhia
O Ceo da Americanas, Leonardo Coelho Pereira, reconheceu na terça-feira (13) que o rombo, que chega a R$ 43 bilhões nas finanças da companhia, que veio ao conhecimento público em janeiro passado, foi resultado de práticas fraudulentas. Através de artifícios contábeis, dívidas foram encobertas, lucros irreais foram forjados. A declaração foi feita na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com a finalidade de apurar a fraude, na terça-feira (13). A Americanas encontra-se em Recuperação Judicial (RJ) que impediu a falência da empresa.
Os maiores beneficiários dessas manobras escusas foram os acionistas que aumentaram seus dividendos e diretores que aumentaram seus bônus.
Os principais acionistas, conhecidos entre os homens mais ricos do país, são Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, proprietários também da Ambev, que detêm 31% das ações da Americanas e estiveram no controle da empresa por quase 40 anos.
A última diretoria era composta por Miguel Gutierrez, que exerceu a presidência da empresa nos últimos 20 anos, Anna Saicali, Timotheo Barros e Marcio Cruz Meirelles. Todos estatutários e nessa condição podem responder com bens próprios para cobrir o buraco nas contas da companhia.
Sérgio Rial, que substituiu Gutierres e ficou dez dias nessa condição, tornou-se réu no processo sobre o caso Americanas na Comissão de Valores Imobiliários (CMV).
O reconhecimento da fraude vai repercutir na Recuperação Judicial. Comprovada a fraude, os sócios da empresa serão obrigados a aportar recursos próprios para cobrir o rombo. Antecipando-se à comprovação inevitável da fraude, desde há algum tempo Americanas e credores, especialmente bancos, vêm negociando um possível acordo.
Não há conhecimento sobre como seriam destinados os recursos a serem aportados pelos sócios. Se forem sugados para pagar dívidas com banco, que estão na casa dos R$ 17 bilhões, ao invés do refinanciamento desse montante, os cogitados R$ 12 bilhões de aporte não serviriam para mais nada e a empresa iria à falência em seguida.
Nessa baderna onde não há inocentes entre a Americanas, bancos e auditorias, Pereira trouxe indícios e denúncias bastante relevantes, mas com o viés evidente de colocar a fraude nas costas dos diretores estatutários, resvalando nas auditorias e bancos, mas eximindo o Conselho de Administração e sócios da companhia.
A comprovação da fraude, pelo enfoque dado, foi feita através da revelação de mensagens trocadas por e-mails, apresentadas por Pereira. Numa delas se refere a conclusão de uma negociação entre os auditores da KPMG e a diretoria da Americanas na qual a intenção era amenizar os termos da carta da auditoria sobre os resultados da companhia.
Demonstra então, que o relatório, que originalmente continha a expressão “deficiências significativas” foi depois entregue com o termo “recomendações que merecem a atenção da administração”. Pereira explicou que a troca foi decisiva: Na primeira versão, o Conselho de Administração precisaria ser comunicado; na segunda não, necessariamente, haveria essa exigência.
Em outra troca de e-mails, desta vez entre a PwC e a diretoria da Americanas, Pereira diz que o texto pode indicar que a auditoria tenha sugerido redigir questões ligadas a operações de risco sacado. Na imagem do e-mails apresentados na Comissão, é possível ver a sugestão de uma funcionária da auditoria para mudanças na redação da empresa, de forma que as operações não ficassem tão claras.
O relatório, neste caso, inicia dizendo: “Confirmamos que não temos, junto aos bancos com os quais temos relação, operações contratadas de antecipação de fornecedores nas quais é oferecido risco de crédito da companhia, operações denominadas ‘forfeit’, ‘confirming’, ‘risco sacado’ ou ‘securitização de contas a pagar’”.
Por conta da recomendação, a versão ficou: “Informamos que não temos conhecimento de que as operações de cessão de crédito realizadas a pedido de fornecedores informadas por certos bancos com os quais a companhia opera possuem qualquer anuência da companhia ou envolva a assunção de risco de crédito por parte da companhia”.
Em outro momento, Pereira mostra documento do ex-diretor Timotheo Barros querendo saber de um colega de diretoria: “Como estamos com bancos para retirar das cartas a informação das operações com fornecedores, vida/morte para nós?”.
Mudanças no texto dos bancos em suas cartas de circularização, a pedido da empresa, para suavizar registros das operações de crédito que eram reportadas de forma errada pela companhia em seu balanço também aparecem em e-mail trocados.
São apresentadas versões de cartas do Itaú e do Santander. Diretor comemorava o fato de que o Itaú aceitou a nova redação da carta, em que a expressão “sacado” tinha sido substituída por “emitido”.
A questão era sensível para a diretoria da Americanas. A omissão de R$ 18,4 bilhões em passivos com operações de risco sacado foi a principal fraude cometida no balanço, que podem somar R$ 45,9 bilhões, segundo comunicado divulgado ao mercado na manhã do dia treze, pela própria empresa.
Em desdobramentos da apresentação de Pereira, a CPI prepara a quebra dos sigilos bancários, fiscais e telemáticos dos ex-diretores da empresa envolvidos na fraude dos balanços da companhia. Os requerimentos serão votados na próxima terça (20).
Os parlamentares também devem ouvir o BC (Banco Central) e a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), com a finalidade de juntar elementos para ouvir ex-diretores e as auditorias que avalizaram os balanços, assim como os maiores acionistas da empresa Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, já no início de julho.