A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, pautou para o próximo dia 3 de maio o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5766, que contesta pontos da “reforma trabalhista” que restringem o alcance da gratuidade dos serviços jurídicos obtidos por trabalhadores de baixa renda.
A ação foi movida pela Procuradoria-Geral da República, mas diversas entidades representativas dos trabalhadores, assim como a Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), obtiveram ingresso no processo como amicus curiae (pessoa, entidade ou órgão, com profundo interesse em uma questão jurídica, na qual se envolve como um terceiro por considerar ter profunda conexão com o caso), fortalecendo a denúncia.
Para a PGR, os pontos atacados pela ação tratam de “restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos, na Justiça do Trabalho”.
A ADI requer a declaração de inconstitucionalidade do artigo 790-B da CLT (caput e parágrafo 4º), que responsabiliza a parte sucumbente (vencida) pelo pagamento de honorários periciais, ainda que beneficiária da justiça gratuita. Também é impugnado o artigo 791-A, que considera devidos honorários advocatícios de sucumbência por beneficiário de Justiça gratuita, sempre que tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa.
O que acontece é que, antes da instituição da reforma trabalhista, um trabalhador de baixa renda, sem condições de processar um empregador que tivesse descumpridor a lei, poderia entrar com pedido de gratuidade do processo e, em sendo comprovada a insuficiência de recursos, todos os custos do processo seriam pagos pelo Estado, independente do resultado da ação.
A reforma modificou este entendimento, estabelecendo que caso o trabalhador perca e existam despesas periciais, elas ficam a cargo dele ainda que desfrute da gratuidade do serviço. Quanto ao segundo artigo atacado, o novo texto define que se o trabalhador beneficiário de Justiça gratuita ganhar uma ação, mas perder outra (mesmo que em processo diferente), deverá pagar as sucumbência da ação perdida com o que receber da vitoriosa.
Para a Anamatra, este dispositivo vai na contra-mão da Constituição porque “a legislação instituída na vigência da CF de 1988 é claramente no sentido da universalização do acesso ao Poder Judiciário, especialmente para os menos favorecidos”.
Segundo o presidente da entidade, Guilherme Feliciano, a participação da entidade na ação tem como objetivo reforçar “uma das inconstitucionalidades mais evidentes da Lei 13.467/17, na medida em que transforma uma previsão constitucional clara e de expressão literal, como é a garantia da assistência judiciária gratuita e integral, em um arremedo de assistência, em que o hipossuficiente econômico deve suportar os custos das perícias e dos próprios honorário advocatícios com os créditos alimentares a que eventualmente faça jus”.
Na ocasião em que foi protocolada a ADI 5766, era Rodrigo Janot o procurador-geral da República, e argumentou que a medida viola garantias constitucionais como amplo acesso à jurisdição e assistência judiciária integral aos necessitados.
“Na contramão dos movimentos democráticos que consolidaram essas garantias de amplo e igualitário acesso à Justiça, as normas impugnadas inviabilizam ao trabalhador economicamente desfavorecido assumir os riscos naturais de demanda trabalhista e impõe-lhe pagamento de custas e despesas processuais de sucumbência com uso de créditos trabalhistas auferidos no processo, de natureza alimentar, em prejuízo do sustento próprio e do de sua família”, afirmou o então procurador-geral.
Na matéria em que aceitou o pedido das entidades para que entrassem como amicus curiae, o relator da ação, ministro Luís Roberto Barroso, considerou que “a ANAMATRA pode contribuir com informações sobre o impacto da reforma sobre esta Justiça e, nessa medida, possibilitar uma decisão mais informada por parte da Corte”, enquanto que as centrais “demonstram possuir representatividade mais ampla, quanto aos interesses dos trabalhadores”.