Ministro escolhido por Bolsonaro para o STF negou o pedido de liminar na ação proposta pela oposição que questiona decreto do governo de SP para privatizar a Sabesp
O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), negou o pedido de liminar na ação proposta pela oposição que questiona decreto com impacto na privatização da Sabesp.
O decreto estabelece o peso decisório do Estado sobre os municípios nas Uraes (Unidades Regionais de Serviços de Abastecimento de Água Potável e Esgotamento Sanitário).
O tema é relevante, porque a eventuais compradores interessa menor pulverização das decisões. No desenho estabelecido pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), os votos somados do governo do Estado e do município de São Paulo chegam a 56% do peso da Urae 1, que reúne a região atendida pela Sabesp. Isso deixa os outros 369 municípios e a sociedade civil em minoria e de fora das decisões.
Mendonça, escolhido por Bolsonaro para integrar o STF, ignorou ou tentou ignorar as ilegalidades flagrantes no processo de privatização da Sabesp tocado pelo governador de São Paulo, o bolsonarista Tarcísio de Freitas.
Ele desconheceu parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR). A PGR se manifestou na ação do PT e PSol destacando a inconstitucionalidade do decreto do governador que permite a alteração de contratos da Sabesp com municípios sem que eles tenham papel decisivo na negociação.
Segundo a PGR, é ilegal o decreto que deu a conselhos o poder de alterar detalhes dos contratos da Sabesp com as prefeituras do Estado e renegociar contratos via URAEs, sem que cada município negocie individualmente.
Conforme o parecer da então procuradora-geral Elizeta Maria de Paiva Ramos, o peso do voto dos representantes de estados e municípios são desproporcionais.
“Tal situação tende a resultar na concentração do poder decisório no âmbito das unidades regionais de saneamento básico nas mãos de poucos entes, como exposto pelas requerentes em sua petição inicial: apesar de a URAE 1 ser composta pelo Estado de São Paulo e por 370 (trezentos e setenta) municípios, 37% (trinta e sete por cento) dos votos no Conselho Deliberativo da unidade pertencem ao Estado e 19% (dezenove por cento) ao Município de São Paulo, totalizando 56% (cinquenta e seis por cento)”, escreveu a procuradora.
JURISTAS
Segundo os juristas Gustavo Justino de Oliveira, da Faculdade de Direito da USP, e Matheus Teixeira Moreira, da Fundação Getulio Vargas (FGV), é inconstitucional o projeto de privatização da Sabesp feito pelo governo de Tarcísio.
Em artigo “Inconstitucionalidades na privatização da Sabesp: o que esperar da judicialização?”, publicado no site Consultor Jurídico, eles apontam que “a venda da Sabesp somente pode ser efetivada com a alteração do texto constitucional”, ou seja, por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição Estadual (PEC), e não por um Projeto de Lei.
Isso porque em seu Artigo 216, a Constituição de São Paulo define claramente que “o Estado assegurará condições para a correta operação, necessária ampliação e eficiente administração dos serviços de saneamento básico prestados por concessionária sob seu controle acionário”.
Enquanto o projeto do bolsonarista Tarcísio de Freitas “fará com que o Estado passe a ser minoritário entre os acionistas, perdendo o controle acionário”, apontam os juristas.
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), autor de uma ação contra a privatização da Sabesp, afirmou que Tarcísio de Freitas “cometeu aberrações jurídicas” para forçar a privatização da Sabesp.
“Privatizar a Sabesp é certeza de ter a torneira seca na primeira crise. Não podemos admitir isso! Não se trata de demonizar o capital privado, mas de admitir que existem setores sensíveis, estratégicos, nos quais o Estado precisa atuar”, argumentou o deputado.
O próprio Tarcísio de Freitas acabou confessando que a tarifa da água vai subir com a privatização.
NOVO MARCO
Ao negar o pedido dos partidos de oposição ao governador Tarcísio, Mendonça escreveu que “não se desconhece as substanciosas argumentações apresentadas tanto pela agremiação autora, quanto pela AGU e pela PGR”.
E acrescentou: “Suas sustentações se centram essencialmente na arguição de violação à autonomia municipal em razão da alegada concentração do poder decisório, no âmbito do colegiado regional, a um reduzido universo dos entes que o compõem. Não obstante, referida autonomia continua integralmente assegurada às autoridades locais competentes”.
A decisão foi tomada na ADI (Ação direta de Inconstitucionalidade) 7.470, apresentada pelos partidos de oposição — PT e PSol — Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo).
AÇÕES DA OPOSIÇÃO
Líder da Federação PT, PCdoB e PV na Alesp, deputado Paulo Fiorilo (PT) coordenou as estratégias da oposição para barrar o crime da privatização da empresa paulista de saneamento.
“Vamos acompanhar os desdobramentos da ação e continuaremos buscando no Judiciário amparo para interromper a privatização da empresa mais lucrativa do Estado”, disse Fiorilo.
O deputado Guilherme Cortez (PSol), vice-líder da oposição na Alesp, esteve neste mês em audiência com o ministro André Mendonça e estava otimista, após os pareceres da AGU e PGR.
“Lamento a decisão do ministro, que acredito que será reformada pelo plenário do Supremo. O governo Tarcísio está usando as Uraes para passar por cima da competência dos municípios de decidirem sobre seu próprio saneamento básico, para facilitar o processo de privatização da Sabesp. Vamos seguir atuando por todas as vias, políticas e jurídicas, para reverter esse retrocesso”.
PROJETO PRIVATISTA APROVADO NA ALESP
A Alesp aprovou o PL (Projeto de Lei) 1.501/23, dia 6 de dezembro. Dos 94 deputados, 62 votaram a favor do projeto e 1 foi contrário. O quórum foi de 64 deputados, considerando também a presença do presidente da Alesp, deputado André do Prado (PL).
Antes da votação, a sessão foi marcada por confusão entre deputados no plenário e também entre manifestantes e a polícia nas galerias da Alesp. Parlamentares da oposição ficaram de fora do plenário por causa do gás de pimenta usado pela polícia em meio à confusão. Alguns deputados chegaram a utilizar máscaras para estar no plenário.
A oposição, depois da violência policial, não retornou ao plenário para participar da votação. A discussão e chancela do projeto do governo foi retomada apenas com a presença dos deputados governistas e da imprensa.
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