Declaração de vale-tudo do dono da Meta (que maneja Facebook, Instagram e Whatsapp) se deu após festa de beija-mão na mansão de Trump
O biliardário capo do grupo Meta (Facebook, Instagram e Whatsapp), Mark Zuckerberg, anunciou que abandonaria nos EUA o sistema de checagem externa de dados das postagens para substituí-lo por notas dos usuários (a exemplo da plataforma X), medida tomada após beija-mão a Donald Trump em visita à mansão de Mar-a-Lago e doação de US$ 1 milhão para a cerimônia de posse de 20 de janeiro. E que implica no liberou geral para o discurso negacionista e de ódio da extrema-direita.
Anteriormente Zuckerberg era mais ligado aos democratas, inclusive tendo excluído Trump de suas plataformas após a invasão do Capitólio de 6 de janeiro de 2021, mas agora fumou o cachimbo da paz com o republicano e sua távola de biliardários.
Além disso, a Meta está enfrentando um julgamento antitruste federal nesta primavera e tem atuado para obter, do governo dos EUA, o uso de sua ‘Inteligência Artificial”.
A suposta “moderação pelos usuários”, por trás de sua pseudodemocratização da “vontade da maioria”, acaba deixando a, por exemplo, adeptos do apartheid, desde que eventualmente majoritários na rede (maioria que pode ser obtida artificialmente com dinheiro, via turbinamento, algoritmos e robótica), a decisão de liberar ou não a apologia do racismo contido neste apartheid. E a legitimação de discriminações não cria “mais espaço para o debate”, como finge a Big Tech, e sim um ambiente hostil e perigoso para quem é discriminado – e um paraíso para o discriminador.
AQUI TEM LEI
Não apenas o Brasil, mas também a Austrália e países europeus arguiram se a nova diretiva se aplicará fora dos EUA. Como disse o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, aqui tem lei e a Corte não vai permitir que Big Techs sejam instrumentalizadas para amplificar discursos de ódio.
“Aqui no Brasil, a nossa Justiça Eleitoral e o nosso STF, ambos já demonstraram que aqui é uma terra que tem lei. As redes sociais não são terra sem lei. No Brasil, [as redes sociais] só continuarão a operar se respeitarem a legislação brasileira. Independentemente de bravatas de dirigentes irresponsáveis das big techs”, disse o ministro, conforme reportado pelo G1.
“Pelo mundo não podemos falar, mas, no Brasil, eu tenho absoluta certeza e convicção que o Supremo Tribunal Federal não vai permitir que as big techs, as redes sociais continuem sendo instrumentalizadas dolosa ou culposamente ou, ainda, somente visando o lucro, para discursos de ódio, nazismo, fascismo, racismo, misoginia, homofobia e discursos antidemocráticos”, ressaltou Moraes.
O governo da Austrália, país que está na vanguarda da regulamentação dos gigantes da tecnologia, expressou na quinta-feira (9) sua preocupação com a decisão do grupo Meta.
“A desinformação é muito perigosa e vimos que ela realmente explodiu nos últimos anos”, disse o chefe do Departamento do Tesouro da Austrália, Jim Chalmers, à ABC. “É um desenvolvimento muito prejudicial à nossa democracia”, disse ele, descrevendo a decisão da Meta como “muito perturbadora”.
No final do ano passado, a Austrália aprovou uma nova legislação para proibir o acesso de crianças menores de 16 anos às plataformas de redes sociais, ameaçando multas de até 32,5 milhões de dólares (200 milhões de reais) para as empresas que não cumprirem a legislação.
“DOENTES MENTAIS”
A Meta também está flexibilizando as regras sobre conteúdo considerado ofensivo, e, por exemplo, passou a considerar apropriado chamar autistas de “retardados” e homossexuais de “doentes mentais”, segundo as denúncias.
Ou seja, o que a nova diretiva da Meta faz é criar um ambiente digital que tolera e inclusive incentiva a disseminação de desinformação e discursos de ódio. E que privilegia os cliques, o sensacionalismo e os lucros à verdade e às leis.
O Real Facebook Oversight Board (RFOB), um grupo criado para combater as falhas percebidas do próprio conselho de supervisão da Meta, criticou a medida, segundo o portal norte-americano Common Dreams: “‘censura’ é uma crise fabricada, favorecimento político para sinalizar que as plataformas da Meta estão abertas para negócios à propaganda de extrema direita”.
“A mudança do Twitter da verificação de fatos transformou a plataforma em uma fossa; Zuck está se juntando a eles em uma corrida para o fundo do poço”, sublinhou o grupo.
“A Meta foi à Fox News para anunciar que está encerrando seu programa de verificação de fatos de terceiros. Zuck não está apenas beijando o anel, ele está babando por toda parte”, escreveu o repórter de mídia Oliver Darcy.
Por sua vez, Kara Swisher, jornalista de tecnologia, escreveu que “inundações tóxicas de mentiras em plataformas de mídia social como o Facebook destruíram a confiança, não os verificadores de fatos. Deixe-me reiterar: Mark Zuckerberg nunca se importou com isso e nunca se importará”.
AUMENTO DRAMÁTICO DO CONTEÚDO TÓXICO
No Reino Unido, o grupo de monitoramento sobre a extrema-direita Hope Not Hate disse que esperava ver “um aumento dramático de conteúdo tóxico” nas plataformas Meta, com as mudanças provavelmente tornando mais fácil para grupos de extrema-direita coordenar atividades locais do tipo que alimentou os distúrbios de agosto na Inglaterra.
“Vimos repetidamente [que o conteúdo online incendiário] está tendo um efeito realmente violento em nossas ruas”, disse o grupo, sobre os pogroms que se seguiram à divulgação mentirosa de que um “imigrante de fé islâmica” teria assassinado crianças a facadas.
Segundo o jornal The Guardian, ao anunciar as mudanças Zuckerberg disse que “trabalharia com o presidente Trump” para combater os governos que buscam “censurar mais”, apontando para a América Latina, China e Europa, onde o Reino Unido e a União Europeia introduziram legislação de segurança online.
Cinicamente, ele asseverou que a Meta estava determinada a restaurar a “liberdade de expressão”, embora admitindo que ainda havia “muitas coisas ilegais” a serem removidas de suas plataformas, como exploração infantil, conteúdo relacionado a drogas, fraudes e difamações.