Governos federal, estadual e municipal anunciam rompimento com a Enel após apagão em SP

Coletiva de Imprensa com Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, Ricardo Nunes e Tarcísio de Freitas - Foto: Paulo Guereta/Governo de SP

Ministério de Minas e Energia, governo paulista e prefeitura pressionam a Aneel pela abertura do processo de cassação da concessionária, responsável por sucessivos blecautes

Após um novo apagão que deixou mais de 2,2 milhões de imóveis sem energia na capital e na Grande São Paulo, os governos federal, estadual e municipal decidiram iniciar o processo de rompimento do contrato com a Enel, concessionária privada que acumula sucessivas falhas na prestação do serviço, multas milionárias e histórico de judicialização, aprofundando a crise energética em São Paulo. A decisão foi tomada após reunião realizada nesta terça-feira (16).

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que a Enel perdeu as condições de permanecer à frente da concessão. Ele ressaltou que a visita ao governo paulista foi uma determinação direta do presidente Lula (PT). “Estamos completamente unidos — governos federal, estadual e do município — para que a gente inicie um processo rigoroso, regulatório. Esperamos que a Aneel possa dar resposta o mais rápido possível ao povo de São Paulo, implementando e iniciando o processo de caducidade que vai resultar, com certeza, na melhoria da qualidade do serviço de distribuição, que o mais sensível do setor elétrico”, afirmou.

Ao comentar o encontro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), afirmou que o caminho escolhido é o mais severo previsto na legislação. “Não há outra alternativa senão a medida mais grave que existe, que é a decretação de caducidade. Nós estamos mandando elementos para o Ministério de Minas e Energia. Vamos mandar isso também para a agência reguladora”, declarou.

A chamada caducidade, considerada uma medida extrema, ocorre quando fica comprovado que a concessionária descumpre obrigações contratuais e não tem condições de manter a prestação adequada do serviço à população. Segundo o governador, há alinhamento político entre os diferentes níveis de governo para pressionar pela abertura do processo. “Vamos instar a agência, a gente está falando de uma união importante, que é do governo federal, estadual e prefeitura de São Paulo, na mesma página, para que o processo de caducidade seja instaurado”, completou.

Enquanto o processo de rompimento do contrato avança, a Enel acumula sanções administrativas. O Procon Paulistano, órgão da Prefeitura de São Paulo, aplicou uma multa de R$ 14,2 milhões à concessionária “por falhas graves e estruturais na prestação do serviço, especialmente as ocorridas entre os dias 8 e 10 de dezembro”.

O apagão que desencadeou a reação dos governos ocorreu após um vendaval histórico que provocou quedas de árvores, cancelamentos de voos e desligamento de semáforos em diversas regiões da capital e da Grande São Paulo. No pico da crise, registrado na quarta-feira (10), mais de 2,2 milhões de clientes ficaram sem energia. De acordo com boletim divulgado pela Enel às 18h54 desta terça-feira (16), ainda havia 79 mil imóveis sem luz na região metropolitana.

Segundo o Procon, a concessionária já havia sido alertada anteriormente sobre problemas recorrentes. “A empresa já havia sido notificada anteriormente sobre as falhas detectadas, mas não adequou sua conduta para atender à exigência de manutenção do serviço de forma contínua, adequada, eficiente e segura”, apontou o órgão.

O Procon acrescentou que “a autuação é resultado da análise de reclamações registradas por consumidores e da apuração técnica realizada pelo órgão de defesa do consumidor, que constatou o descumprimento de normas previstas no Código de Defesa do Consumidor”. Entre as irregularidades identificadas estão falhas no atendimento, interrupções prolongadas no fornecimento e ausência de informações claras aos usuários. Para o órgão, a Enel “deixou de assegurar a continuidade e a eficiência do serviço essencial, além de não atender plenamente às demandas dos consumidores afetados, o que caracteriza infração à legislação vigente”.

HISTÓRICO DE PRECARIZAÇÃO

Desde 2020, a Enel SP acumulou R$ 374 milhões em multas aplicadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) por falhas na prestação do serviço na Grande São Paulo. Desse total, mais de 92% ainda não foram pagos. A concessionária judicializou ou deixou de quitar mais de R$ 345,4 milhões, segundo levantamento da própria agência reguladora.

Esse montante ainda não inclui o apagão mais recente, que voltou a deixar mais de 2,2 milhões de endereços sem energia. A Aneel já solicitou explicações formais à empresa.

A Enel é responsável pela distribuição de energia elétrica na capital paulista e na Grande São Paulo. A Aneel é o órgão federal encarregado de regular e fiscalizar o setor elétrico. No estado de São Paulo, essa fiscalização é exercida pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), que atua em cooperação com a agência nacional.

A concessionária também foi alvo de decisão judicial. Na noite de sexta-feira (12), a Justiça de São Paulo determinou o restabelecimento imediato do fornecimento de energia, sob pena de multa de R$ 200 mil por hora de descumprimento. A Enel foi notificada no sábado (13), às 15h, e tinha 12 horas para cumprir a decisão. No entanto, a energia só foi considerada normalizada na noite de domingo (14).

Desde 2020, a Aneel aplicou cinco multas à Enel SP. Duas foram pagas, somando cerca de R$ 29 milhões. Outras três permanecem pendentes, totalizando R$ 345,4 milhões. A multa mais recente, de R$ 83,7 milhões, foi aplicada em outubro do ano passado e ainda está em fase de recurso administrativo. A infração mais pesada ocorreu em 2023, quando a Aneel multou a concessionária em R$ 165,8 milhões, valor que foi contestado judicialmente.

Em todo o país, considerando os três estados onde a Enel atua — São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará —, as multas aplicadas pela Aneel já somam R$ 626,2 milhões.

Nova cobrança após o apagão

No início da nova crise energética, a Aneel enviou um ofício à Enel na quarta-feira (10), exigindo esclarecimentos sobre a recomposição do serviço. Naquele dia, mais de 2 milhões de imóveis estavam sem energia por volta das 15h, o equivalente a 31,81% da área de concessão da empresa. A agência determinou que a concessionária apresente um relatório detalhado em até cinco dias.

O volume de interrupções é semelhante ao registrado em eventos extremos anteriores, como os temporais de novembro de 2023 e outubro de 2024, que deixaram 2,1 milhões e 2,4 milhões de clientes sem luz, respectivamente.

A Aneel solicitou informações técnicas detalhadas, incluindo descrição do ciclone com laudos meteorológicos, linha do tempo do plano de contingência, curva de recomposição do serviço, comprovação da mobilização de equipes e demonstração de que a estrutura operacional da empresa é compatível com a complexidade da área atendida. Em nota, a Enel informou que responderá ao ofício no prazo estabelecido.

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