Os trabalhadores que estão aptos a receberem o auxílio emergencial têm relatado falhas no aplicativo Caixa Tem, utilizado para acesso à Poupança Social Digital e que permite a movimentação do dinheiro depositado.
Desde sexta-feira, relatos na internet com #CaixaTemNAOFUNCIONA apontam as dificuldades de acesso ao sistema.
É mais uma dificuldade imposta a milhões de pessoas que, mesmo após 15 dias da aprovação da MP que determina o pagamento do benefício, não conseguem obter o dinheiro.
Desde o início do processo, inúmeras barreiras foram colocadas às pessoas que tentam obter o benefício de R$ 600 ou R$ 1.200 em caso de mães chefes de família. Os obstáculos vão desde as dificuldades de acesso à internet até a necessidade de CPF regularizado.
No caso do CPF, a medida é ainda mais grave pois, além de atrasar o pagamento do dinheiro, colocou milhões de pessoas expostas ao coronavírus em filas imensas nas agências da Receita Federal e Caixa Econômica por todo o país, revelando o retrato da incompetência do governo em fazer com que o dinheiro chegue nas mãos dos que mais precisam.
A dificuldade em entrar no aplicativo Caixa Tem, ou quando conseguem entrar, fazer transferências ou pagamentos, têm sido algumas das maiores reclamações dos beneficiados.
Usuários relatam que o aplicativo não abre, que dá erro, ou apresenta instabilidade impedindo que a pessoa possa usar o dinheiro.
Um beneficiário relata que seu a auxílio foi aprovado no dia 17 e que “desde então o aplicativo Caixa Tem não funciona, gera vários tipos de erros e até o momento não consegui ter acesso ao meu dinheiro… Também entro em contato por telefone mas a ligação é derrubada, ou espero e ninguém me atende”.
Para os que têm algum problema com o CPF o desespero é ainda maior, porque a absurda exigência de CPF regular para que o cidadão esteja apto a receber o benefício é só o início da maratona. No desespero de se cadastrarem, pessoas têm passado a madrugada nas agências da Receita Federal.
O relato de Dona Roseli, passadeira de roupa com uma gravidez de risco de 7 meses, que passou a madrugada de terça para quarta-feira (22) em frente a agência da Receita Federal em Madureira, no subúrbio do Rio, é comovente:
“Humilhante, muito humilhante mesmo. Dependendo dos outros para ficar com a minha filha de três anos. Uma criança que precisa de medicamento. Deixei minha filha com uma outra filha minha para vir para cá ontem meio-dia. Cheguei aqui era 18h, estou aqui até agora. Não dormi, me sentindo mal por causa da minha filha e estou aqui esperando para regularizar o CPF”.
Como mostrou a reportagem do Bom Dia Rio, da Globo, nesta manhã, ela chegou a passar mal por volta das 8h30, ao ouvir de um funcionário da Receita Federal que não seria atendida porque havia perdido a identidade. Felizmente, depois de alguns minutos, os documentos que ela tinha foram aceitos e ela saiu de lá com o CPF regularizado.
Histórias parecidas e as enormes filas que se replicam em todos os estados brasileiros são o retrato dos mais de “5,5 milhões de brasileiros com renda de até meio salário mínimo, elegíveis para receber o benefício, que não têm conta em banco ou acesso regular à internet”, como mostra pesquisa do Instituto Locomotiva.
“A crise do coronavírus tirou renda e jogou para a pobreza muita gente que tinha pouco, mas não era alvo de programas sociais. O vírus joga luz a problemas que já existiam, como a baixa renda dos informais, e acentua uma desigualdade histórica”, diz Renato Meirelles, presidente do Instituto.
CPF regular
A exigência do governo de que o cidadão esteja com CPF regularizado para receber o auxílio emergencial de R$ 600 foi mantida pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, João Otávio de Noronha.
A decisão atendeu a um recurso da Advocacia-Geral da União contra a liminar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que havia suspendido a exigência do CPF como requisito para o pagamento do auxílio.
Contrariando completamente o que a realidade vem demonstrando, haja vista as enormes filas que se formam todos os dias por todo o Brasil de pessoas tentando regularizar o CPF, o ministro do STJ defendeu que “o governo mostrou que adotou medidas necessárias para evitar a aglomeração de pessoas em postos da Receita”, e manteve a exigência.
No entendimento do TRF1, o decreto fixando as regras do benefício extrapolou seu poder regulamentar, impondo uma condição não prevista na lei que instituiu o benefício emergencial.
Em sua defesa da dispensa do CPF, o TRF1 também alegou que a necessidade de regularização do CPF seria contrária às medidas adotadas para evitar a disseminação da Covid-19, já que estimularia a aglomeração de pessoas em agências da Receita Federal.