O vídeo, lançado pelo PT na terça-feira, nos 100 dias de prisão de Lula, com uma sua mensagem “inédita”, gravada antes de ser conduzido à cadeia, tem a característica de ser igual a todas a mensagens e discursos de Lula, desde que se descobriu que ele era um ladrão do dinheiro e da propriedade pública.
Em nenhum momento ele entra no mérito das acusações, em nenhum momento mostra ou menciona uma só acusação ou prova que seja mentira. No entanto, diz: “Eu queria que eles julgassem o mérito do processo, o mérito da acusação contra mim, que lessem a defesa das acusações e encontrassem um crime que eu cometi. E aí eles poderiam me prender tranquilamente, e eu acataria com todo o respeito a decisão”. E, depois: “O dia que me provarem um meio crime que eu cometi nesse país, eu irei cumprir todas as decisões sem nenhuma preocupação”.
O processo no qual ele foi condenado, não é sobre um meio crime. É sobre um presidente da República que recebia propinas de uma empreiteira – nesse caso, sob a forma de um triplex em uma praia badalada, um triplex reformado e adaptado para ele e sua família, inclusive com aparelhamento e mobília da cozinha e outras dependências, comprados pela empreiteira.
Lula e o PT, cada vez mais, estão reduzidos à sua própria mentira.
O que tornou mais grave o seu caso, é, exatamente, que se tratava de um presidente da República. Outros petistas – Palocci e José Dirceu, por exemplo – amealharam patrimônio à custa de propinas, à custa de roubar. Merecem, portanto, a condenação que receberam.
Mas Lula era presidente da República. Milhões de pessoas confiaram nele. Milhões, naturalmente, o consideraram um exemplo. Para, depois, descobrir que confiaram e votaram em alguém que se tornou um ladrão do dinheiro do país, um parasita do dinheiro das próprias pessoas que votaram nele.
O mérito (isto é, as provas de seus crimes) – ainda existem outros cinco processos – foi exaustivamente examinado no processo da propina do triplex (v. Uma pequena compilação das provas contra Lula (só no caso do triplex)).
A denúncia do Ministério Público, no dia 14 de setembro de 2016, tem 149 páginas descrevendo as provas. Depois de todos os interrogatórios, perícias, mensagens apreendidas e cotejamento de provas, quase um ano depois, a 12 de julho de 2017, a sentença do juiz Sérgio Moro, uma das mais minuciosas da história judicial brasileira, em 260 páginas, examinou o caso, ponto por ponto.
Depois disso, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), extensos votos de três desembargadores reexaminaram cada ponto – somente o voto do relator, Gebran Neto, tem 544 páginas.
Todos – e não mencionamos o inquérito da Polícia Federal e o parecer do procurador Maurício Gerum ao TRF-4 – não puderam concluir outra coisa, senão que Lula era um ladrão do dinheiro público, com a agravante de ser um presidente da República.
Diante dos ataques de Lula aos juízes, disse o desembargador Gebran Neto:
“Enfim, pessoas de várias classes sociais foram objeto de imputações. Não há nestes autos, porém, aqueles menos favorecidos. Não estamos tratando de pobres, miseráveis ou dos descamisados, que usualmente são os destinatários das ações penais no Brasil. (…) como demonstrado nos autos, o que atinge a democracia não é o processo penal e nem o julgamento daqueles que tiveram ou pretendem ter atuação política. É o uso de recursos ilícitos que a atinge, como ferramenta de subversão do processo democrático e de fragilização da participação igualitária no pleito eleitoral, pois contaminado por candidatos e agremiações financiados pelo dinheiro da corrupção”.
O processo de Lula, pela propina do triplex, durou 16 meses, com ampla cobertura da imprensa e direito à defesa. Lula não contestou uma única prova, exceto uma tentativa de invalidar o depoimento do presidente da OAS, Léo Pinheiro, que aparece, em fotos, com o próprio Lula, dentro do triplex, examinando as obras.
Mas diz Lula que “a única coisa que eu quero é que seja analisado o mérito do meu processo”. Disse ele que, se provarem que cometeu algum crime “ eu acataria com todo o respeito a decisão”.
Além de roubar dinheiro público, Lula tornou-se um mentiroso patológico. O “mérito” foi analisado amplamente e nem por isso ele acatou a decisão com respeito. Prefere continuar negando a existência daquilo que existe, como se o povo fosse composto por imbecis.
Aliás, por falar em “respeito”, depois da conspiração em que o PT usou um seu ativista, nomeado desembargador do TRF-4 por Dilma, que estava de plantão durante um fim de semana, para tentar soltar Lula, se existe algo de que eles não podem falar, é de respeito à Justiça. No entanto, diz Lula, no vídeo, “essa gente não pode ser pega todo dia com o show de pirotecnia, feita com prisões, com solta e prende e solta”.
Quem promoveu um “solta e prende e solta e prende” foi o PT – e, claro, com o apoio de Lula. Mas, é verdade, quando gravou o vídeo, ele não poderia adivinhar que seria divulgado logo após a infausta conspiração do plantão.
Lula & sequazes não fazem outra coisa na vida, senão usar politicamente os processos da Lava Jato. O que provocou, recentemente, quando da visita de Renan Calheiros (que tem apenas 18 inquéritos abertos sobre ele no STF), a réplica do procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa da Operação Lava Jato:
“Renan Calheiros não sabe o que diz quando afirma que Lula é preso político. É preciso repudiar essas tentativas de usar os processos da Lava Jato politicamente. Renan Calheiros ou desconhece o processo e as provas, ou conhece e prefere a versão que lhe garante o suporte dos eleitores de Lula no Nordeste. Tenho certeza que os eleitores são mais inteligentes que pensam alguns políticos”.
No entanto, diz Lula, no vídeo divulgado pelo PT, que “não posso aceitar uma decisão política, porque um processo não pode ter conotação política”.
Essa tentativa de transformar uma condenação por crimes comuns – corrupção passiva e lavagem de dinheiro roubado – em condenação política é apenas mentira (como sabe o leitor, seria uma obviedade dizer que o objetivo da mentira é esconder a verdade – mas assim é): receber propina para facilitar o assalto de uma empreiteira, a OAS, contra a Petrobrás, não é crime político.
A intimidade de Lula com o presidente da OAS, com o mandachuva da Odebrecht – e outros velhacos endinheirados, ou meros picaretas, estilo Eike Batista – é algo sem paralelo, para um presidente, na história republicana.
Todo o caso foi bem resumido pelo relator do processo no TRF-4, desembargador federal João Pedro Gebran Neto:
“No caso em exame, trata-se de ex-presidente da República que recebeu valores em decorrência da função que exercia e do esquema de corrupção que se instaurou durante o exercício do mandato, com o qual se tornara tolerante e beneficiário. É de lembrar que a eleição de um mandatário, em particular o Presidente da República, traz consigo a esperança de uma população em um melhor projeto de vida. Críticas merecem, portanto, todos aqueles que praticam atos destinados a trair os ideais republicanos, sem descuidar, por óbvio, que a corrupção aqui tratada está inserida em um contexto muito mais amplo e, assim, de efeitos perversos e difusos.
“A culpabilidade, de fato, é elevada.
“Infelizmente, e reafirme-se, infelizmente, está sendo condenado um ex-presidente da República, mas que praticou crime e pactuou, direta ou indiretamente, com a concretização de tantos outros”.
CARLOS LOPES