A estatal federal Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) encerrou contratos no valor de mais de R$ 200 milhões com a empresa Engefort. A empreiteira, que é a campeã nas licitações de pavimentação na gestão de Jair Bolsonaro, segundo denúncias do jornal “Folha de S.Paulo”, tem sido beneficiada pelo governo, que utiliza um modelo de pregão eletrônico, onde as regras das licitações são afrouxadas, para realizar obras com dinheiro de emendas parlamentares sem fiscalização, conhecidas como orçamento secreto.
O jornal aponta que a construtora, que já obteve contratos que superam R$ 1 bilhão, domina as concorrências dessa área na Codesvaf e, em diferentes licitações, participou sozinha ou na companhia de uma empresa de fachada registrada em nome do irmão de seus sócios.
A Codevasf é uma estatal federal usada por Bolsonaro como moeda de troca por apoio político. Turbinada por bilhões de reais em emendas parlamentares no atual governo, a Codevasf mudou sua vocação histórica de promover projetos de irrigação no semiárido para se transformar em entregadora de obras de pavimentação e máquinas até em regiões metropolitanas.
Pelo modelo de obras de pavimentação adotado na Codevasf, a aquisição dos serviços acontece por meio de uma forma simplificada de licitação (pregão eletrônico). Ele leva aos chamados contratos guarda-chuvas, que têm validade para toda a extensão de estados e regiões. O contrato guarda-chuva, no jargão técnico, é denominado Sistema de Registro de Preços (SRP) ou ata de registro de preços. A partir do preço fixo nele estabelecido, são feitos contratos mais específicos para cada obra, com a definição dos locais exatos de execução das pavimentações.
A reportagem da Folha analisou a documentação de 99 licitações de pavimentação realizadas pela estatal em 2021. Desse total, a Engefort, sediada no interior do Maranhão, em Imperatriz (713 km de São Luís), venceu 53 concorrências. Ela identificou que a Engefort ganhou licitações com valores expressamente maiores (mais que o dobro) que os de concorrências em estados vizinhos vencidas por outras empresas. Foram localizadas discrepâncias de 87% no Tocantins, 71% na Bahia e 31% em Minas Gerais.
Os contratos guarda-chuvas decorrentes das licitações vencidas pela Engefort somavam R$ 1,03 bilhão até o início da publicação das reportagens pela Folha, em abril. Frente às denúncias, quatro contratos da empreiteira, no total de R$ 230,6 milhões, foram anulados desde maio. Entre eles, o maior contrato que havia sido obtido em 2021, no valor de R$ 62 milhões, referente a serviços de pavimentação no Amapá – pregão que se originou do contrato que teve a participação apenas da Engefort e de sua empresa de fachada, a Construtora Del.
Outro grande contrato da Engefort encerrado foi no valor de R$ 58,5 milhões. Nesse pregão, para pavimentação com blocos de concreto no Pará, a Engefort participou somente com a empreiteira Construita, que deu o melhor lance, mas foi desclassificada sob a alegação de não ter apresentado atestados técnicos suficientes para a obra.
Segundo a reportagem, ainda, esse contrato foi repassado para a segunda colocada na licitação de 2021, a empreiteira Liga Engenharia – empresa cujo um dos sócios é Pedro Garcez de Souza, cunhado de um sobrinho do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), ex-lider do governo Bolsonaro no Senado.
No primeiro biênio da gestão Bolsonaro (2019/2020), quando era líder do governo, Bezerra Coelho foi responsável pela destinação de R$ 330 milhões à regional da Codevasf em Pernambuco, grande parte por meio de emendas parlamentares.
A Codevasf ainda anulou um contrato da Engefort no valor de R$ 48,6 milhões para pavimentação com blocos de concreto na região da 2ª Superintendência da Codevasf, sediada em Bom Jesus da Lapa (BA).
A Codevasf criada em 1974, antes dedicada à Bacia do Rio São Francisco, incorporou áreas das regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste.
Em 2020, através da Lei 14.053, Bolsonaro autorizou a Codevasf a atuar nas bacias hidrográficas dos rios Araguari (AP), Araguari (MG), Jequitinhonha, Mucuri e Pardo (MG), bem como nas demais bacias hidrográficas e litorâneas dos estados do Amapá, Bahia, Ceará, Goiás, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Rio Grande do Norte.