Durante reunião da Executiva Nacional do PSDB, em Brasília, na terça-feira (9/10), o presidente do partido e ex-candidato à Presidência da República, Geraldo Alckmin, confrontou o ex-prefeito de São Paulo, João Doria, pela traição à sua candidatura.
Em áudio divulgado à imprensa por um dos presentes, Alckmin, falando para Doria, diz: “Traidor, eu não sou”. Outro participante da reunião acrescenta: “Nem falso”.
Durante a discussão, Alckmin chamou João Doria de “temerista”, em alusão ao seu apoio ao governo de Michel Temer.
A frase “traidor eu não sou”, referia-se à conduta de Doria, de apoiar Bolsonaro no primeiro turno, abandonando o candidato do partido – e presidente nacional do PSDB – a quem Doria deve toda a sua carreira na política (v. “Bolsodória” é a marca da punhalada nas costas).
A intervenção de Alckmin foi no momento em que Doria pedia mais dinheiro para disputar o 2º turno das eleições contra o atual governador de São Paulo, Márcio França (PSB).
Disse Doria que foi informado pelo tesoureiro do PSDB, deputado Silvio Torres (SP), de que não havia previsão de novas liberações de recursos para os candidatos no segundo turno. “Eu me espantei quando vi que isso não estava previsto”, disse Doria.
Na gravação, Doria diz que não era hora de avaliar os erros e acertos do primeiro turno:
“Terminada a eleição, aí sim [cabe] fazermos, de forma dedicada, uma avaliação completa sobre erros, acertos, sobre equívocos, pontos onde o PSDB não cumpriu seu papel. De uma forma mais incisiva, reconheço, mas não podemos fugir dessa avaliação. Teremos de fazer novamente.”
Nesse momento, Alckmin interrompe:
“O ‘temerista’ não era eu não, era você”.
Doria tenta replicar e Alckmin repete: “Você, você”.
Doria responde, por fim, que estava diante de dois ex-ministros de Temer (José Serra e Bruno Araújo) e que o senador Aloysio Nunes continuava no governo. “Vamos ter discernimento em relação a isso, calma e equilíbrio”, fala Doria.
É nesse instante que Alckmin diz:
“Traidor eu não sou.”
E outra pessoa completou:
“Nem falso.”
O que aconteceu em seguida, registrado pelo áudio, é coisa de sociopata – ou seja, de mau caráter.
Doria responde:
“Não vou entrar nesse mérito em respeito a você, mas volto a dizer que nós precisamos ter uma posição definida pelo partido para o segundo turno com os seis candidatos que aqui estão e que precisam do apoio para vencer as eleições. Geraldo, compreendo evidentemente sua situação e o ideal era que você pudesse ter vencido as eleições, não há dúvida, mas agora temos de preservar e salvar o PSDB nos seis Estados.”
Isso, somente para frisar, veio de alguém que traiu Geraldo Alckmin na campanha eleitoral. O mesmo Alckmin que colocou-o como candidato a prefeito de São Paulo, contra Fernando Henrique, José Serra, Alberto Goldman e outros dirigentes do PSDB.
Pior do que isso foi a entrevista de Doria, após a reunião:
“Geraldo teve um momento de dissabor pessoal, da minha parte tem o meu perdão.”
Perguntado se estava “articulando” a substituição de Alckmin, na presidência do PSDB, por ele mesmo, Doria não respondeu.
Essa parte da reunião da Executiva Nacional do PSDB veio a público com um áudio publicado pelo jornal “O Estado de São Paulo” (v. o áudio abaixo).
DINHEIRO
O tesoureiro do PSDB, Silvio Torres, negou a afirmação de Doria. “Desde o início todos sabiam a previsão financeira”, disse. “Dos R$ 43 milhões previstos para Alckmin, ele gastou R$ 25 milhões. A campanha dele foi a mais barata de todas até agora. O resto foi distribuído para outros candidatos”, disse.
Doria, disse Torres, recebeu R$ 8 milhões: “Cada um dos candidatos poderia ter guardado seu recurso para o segundo turno e eles também dispõem de recursos próprios. Talvez Doria esteja se vendo com dificuldades para fazer o segundo turno”.
No entanto, ao deixar a reunião, Doria disse a jornalistas que discutiu com Alckmin porque a legenda não se programou financeiramente para o segundo turno nas disputas estaduais – e foi desrespeitoso ao se referir a Alckmin.
Embora irritado, Alckmin se recusou a comentar o episódio: “Aprendi com Mário Covas que política não se faz pela imprensa. Se outros fazem, eu não o farei”.
Doria, no momento, conspira para tirar Alckmin e outros dirigentes tucanos do comando nacional do PSDB. O ex-governador, porém, afirmou a correligionários que não abrirá mão do posto.
Antes de Alckmin lançá-lo para prefeito de São Paulo, Doria jamais se candidatara a nada – e, aliás, era um nada, que ganhava dinheiro com a bajulação de grã-finos em horários alugados na TV e convescotes em Comandatuba, na Bahia.
Após vencer devido a Alckmin, e à rejeição ao PT, a disputa pela Prefeitura da capital paulista, Doria passou a articular uma candidatura própria à Presidência da República.
Alckmin se impôs, saiu candidato ao Planalto e Doria deixou a Prefeitura para disputar o governo. Ao longo da campanha, porém, com a candidatura de Alckmin passando por dificuldades, o ex-prefeito passou a apoiar Bolsonaro (PSL), inclusive com seções do PSDB paulista, compradas por ele, abandonando o candidato do partido.
No domingo (7), logo após a votação do primeiro turno, Doria declarou apoio ao candidato do PSL, sem qualquer discussão no PSDB ou com outros dirigentes partidários.
GOLDMAN: “DORIA É UM SUJEITO COM AMBIÇÕES SEM LIMITES”
Além de mais essa punhalada, Doria, que controla o diretório municipal do PSDB em São Paulo, orquestrou a expulsão de Alberto Goldman, ex-governador de São Paulo, do secretário estadual de Governo, Saulo de Castro, e mais 15 filiados, por não apoiarem João Doria para o governo de São Paulo.
A direção nacional do PSDB emitiu nota sobre a “expulsão” desautorizando o diretório municipal. “A decisão é arbitrária e inócua”, diz a nota do PSDB nacional.
Alberto Goldman declarou sobre sua suposta “expulsão”: “será que ele tem o AI-5 na mão e eu não sabia? Tem gente que está pensando que está na ditadura e que ele é o ditador”. E completou: “Não tem nenhum panaca nesse partido que tenha condição moral de pedir a minha expulsão”.
Goldman é ex-presidente nacional do PSDB e membro da direção nacional do partido. Ele, aliás, jamais escondeu sua opinião sobre João Doria: “Doria é um sujeito com ambições sem limites e conduta reprovável. Um cidadão sem escrúpulo. Quem conhece João Doria não vota nele. Para o Doria não importa se é amigo, não é amigo. Importa o interesse dele”.
SERRA: “PADRÃO DORIA DE TRUCULÊNCIA”
José Serra, também criticou tentativa de Doria contra Goldman e os outros tucanos. A tentativa, disse Serra, segue “o padrão Doria de truculência. As medidas são descabidas até porque não houve nem direito de defesa. A direção nacional do PSDB não vai deixar isso acontecer”.