Paulo Kliass afirmou ao HP que o problema está na “lógica da austeridade fiscal” e critica recuos na MP nº 1.303/2025
A MP 1.303/2025, que trata da tributação de aplicações financeiras e ativos virtuais, foi aprovada na noite de terça-feira (7) na comissão mista do Congresso com 13 votos favoráveis e 12 contrários.
A proposta recebeu uma série de mudanças do relator, deputado Carlos Zarattini (PT‑SP), incluindo a retirada do aumento da alíquota sobre apostas esportivas (bets) e a manutenção da isenção para títulos como LCI e LCA. O líder do governo justificou as concessões, que reduzem a arrecadação em R$ 3 bilhões, para, segundo ele, “garantir a aprovação da MP”.
O economista Paulo Kliass comentou, nesta quarta, em entrevista ao HP, a votação da MP na noite anterior e criticou o recuo do governo em relação à maior taxação das casas de apostas online (bets). “Isso é um câncer, um vício que está atravessando a sociedade brasileira de alto a baixo”, denunciou. “O governo cedeu em pontos importantes e enfraqueceu o potencial arrecadatório da proposta, que previa inicialmente aumentar a alíquota das bets de 12% para 18%”, acrescentou.
“Se há uma atividade tão perniciosa como essa, vamos taxar, pelo menos”, defendeu Kliass. “Ou faz um monopólio estatal controlado ou proíbe”, acrescentou o economista. “Não tem sentido, as pessoas se endividando, famílias sendo destruídas”, apontou ele, argumentando que “se o governo permite a atividade, deveria ao menos garantir uma taxação justa”.
O especialista destacou ainda o recuo em relação à tributação sobre o agronegócio, prevista na Medida Provisória. “O governo também recuou numa medida que pretendia impor minimamente alguma taxação que atingiria o agronegócio, as chamadas letras de crédito agrárias”, apontou Paulo Kliass. O agronegócio é um setor que paga muito pouco imposto no Brasil. Se o governo insiste na austeridade fiscal, que esta seja atingida taxando-se quem não paga impostos e não cortando no social.
Para ele, o problema central é a submissão da política econômica à lógica da austeridade fiscal. “O governo fica criando armadilhas para si mesmo, como se ele jogasse uma casca de banana e quisesse atravessar a rua para escorregar nela”, ironizou. Ele considera que a busca pelo superávit primário é uma “imposição desnecessária” e defende que o país deveria priorizar gastos sociais em vez de seguir o teto de gastos e o arcabouço fiscal.
Kliass alertou ainda para outro ponto da medida provisória, que, segundo ele, pode reduzir os recursos destinados à educação. “Introduziram o programa Pé-de-Meia no cálculo dos mínimos funcionais da educação. Isso inclui os recursos do programa no cálculo dos mínimos funcionais. Na prática, você reduz a possibilidade de atingir os mínimos de despesa orçamentária com educação para o ano que vem em mais de 10%”, pontuou.
Considerada pelo governo como decisiva para o equilíbrio das contas públicas de 2026, a MP perde a validade nesta quarta-feira (8) caso não seja votada pelo Congresso. A aprovação na comissão ocorreu após intensas negociações, incluindo reunião com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na Presidência do Senado. Como foi alterado na comissão, o texto seguiu como Projeto de Lei de Conversão para análise nos Plenários da Câmara dos Deputados e do Senado.
A avaliação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é que a arrecadação com a MP deve ultrapassar R$ 17 bilhões em 2026. No entanto, segundo ele, será necessário refazer as estimativas após as alterações feitas no texto. O valor é inferior aos R$ 20,8 bilhões previstos originalmente para 2026. A projeção inicial era de arrecadar R$ 35 bilhões até 2027 e R$ 50 bilhões até 2028.