O Senado argentino rejeitou, por 38 votos a 31 e já na madrugada da quinta-feira, 09, o projeto de legalização do aborto até a 14ª semana de gravidez, que havia sido aprovado na Câmara dos Deputados em junho.
Dezenas de milhares de pessoas enfrentaram a intempérie debaixo de guarda-chuvas e plásticos verdes, a cor que identifica os partidários da legalização, e ficaram até o final da votação. A presença principal foi da juventude estudantil, mas com o apoio ativo das famílias, das entidades sociais e da população não identificada partidariamente.
Segundo estimativas extraoficiais, entre 350.000 e 450.000 mulheres abortam anualmente na Argentina. Como aqui, no Brasil, elas o fazem de forma clandestina, arriscando suas vidas, especialmente as mulheres com menos recursos, que recorrem a médicos que não oferecem nenhuma segurança ou a métodos perigosos como sondas, cabides, agulhas de tricô. A decisão de manter o aborto como crime não impede que muitas mulheres decidam interromper uma gravidez indesejada ou impossível de ser sustentada.
“Os números são sabidos. Ninguém os ignora. O não ganha esta noite, mas o futuro não lhe pertence”, afirmou o senador Miguel Ángel Pichetto, do Partido Justicialista. A ex-presidente e hoje senadora, Cristina Kirchner, em um dos discursos mais esperados da noite porque até recentemente tinha se pronunciado contra, explicou que sua filha e a enorme mobilização na Argentina nos últimos anos a fizeram mudar de opinião e defender a legalização do aborto. Ao final, por 38 votos contra 31, o Senado argentino rejeitou o projeto.
Mas, após as centenas de milhares de pessoas que encheram as ruas de Buenos Aires e das principais cidades da Argentina nas últimas semanas, o presidente Maurício Macri, sem espaço para comemorar a decisão, indicou que avalia incluir a despenalização desta prática no novo Código Penal, embora a iniciativa assinalará que a decisão final de cada caso ficará em mãos de cada juiz.
Mariano Borinsky, presidente da Comissão de Reforma de Código Penal, esclareceu que no texto do projeto se levará em conta a decisão da Corte Suprema que, em 2012, precisou os alcances do aborto não punível nos casos de violação, e garante um protocolo de assistência médica para as gravidezes interrompidas por uma agressão sexual ou que exponham a vida da mulher. A isso se acrescentaria uma nova questão: evitar um perigo para a saúde mental da mulher.
O Congresso só pode voltar a tratar do assunto dentro de um ano, mas a reivindicação a favor do aborto legal, seguro e gratuito continuará nas ruas.