Desafiando a chuva, mais de 100 mil pessoas exigiram neste domingo em Buenos Aires a aparição com vida de Santiago Maldonado, cujo paradeiro se desconhece desde que, no dia 1º de agosto, foi preso pela Gendarmería Nacional (Força de Segurança da Argentina de natureza militar, que cuida das fronteiras) durante uma repressão desmedida contra a comunidade dos índios mapuche de Cushamen, na província de Chubut.
“Agora, agora, é indispensável, aparição com vida e castigo aos culpados”, entoou a multidão na Praça de Maio. A dois meses da desaparição de Santiago, desde cedo, sob uma garoa persistente, as saídas das estações de metrô “eram formigueiros dos quais não parava de sair gente”, antes inclusive de que chegaram as grandes colunas das organizações sindicais, políticas, estudantis e sociais, informou o jornal Página 12. A praça mais conhecida e tradicional da capital argentina estava cheia de bandeiras vermelhas, azuis, das entidades, todas dando passagem às insígnias multicoloridas dos povos indígenas.
O jovem de 28 anos desapareceu depois que dezenas de agentes da polícia militar entraram na ocupação dos índios mapuche “Pu Lof em Resistência”, na Patagônia argentina.
Segundo testemunhas, os guardas dispararam balas de chumbo e borracha e queimaram os pertences das famílias da comunidade que se manifestavam para tentar tirá-los de lá. Maldonado estava ali desde o dia anterior, acompanhando os indígenas e foi visto pela última vez quando tentava escapar dos tiros.
O terreno da Pu Lof , em terras administradas pelo latifundiário Luciano Benetton, da empresa têxtil Benetton, está ocupado por famílias mapuche que lutam pela recuperação de seu território ancestral e por políticas em prol dos direitos indígenas desde março de 2015. A multinacional italiana tem 900.000 hectares na Patagônia argentina, território que vem comprando a preço vil desde o governo de Carlos Menem.
Acompanhados pelas Avós e as Mães da Praça de Maio, os familiares do jovem lideraram a manifestação exigindo a renúncia da ministra de Segurança, Patrícia Bullrich. “Quero perguntar ao presidente Maurício Macri onde está Santiago Maldonado”, disse o seu irmão, Sergio Maldonado, único orador do ato, aplaudido, antes de se abraçar com sua mãe. Com a mesma consigna, houve mobilizações em dezenas de cidades do país e do mundo.
Foi lido um comunicado da comunidade “Pu Lof em Resistência”: “Saudamos a família Maldonado. Santiago, obrigado por não duvidar em nos dar uma mão. Pegaram-te, mas não conseguiram capturar a tua essência que hoje se reflete em milhares de pessoas que pedem tua aparição com vida”, diz o texto escrito pelos mapuches. “Aqueles que orquestraram a operação de 1º de agosto são o verdadeiro inimigo interno”, assinalaram. Exibiram no ato muitos vídeos de bandas que compuseram temas para reivindicar por Santiago Maldonado e houve uma leitura de poemas, todos dedicados ao considerado primeiro desaparecido em ‘democracia’. Um deles lembrava outros crimes políticos na Patagônia: operários fuzilados no inicio do século passado, os guerrilheiros que fugiram do cárcere de Rawson, depois de serem barbaramente torturados.
O governo tenta emplacar a impunidade para os responsáveis, tanto policiais, como o Ministério de Segurança, com uma série de mentiras que os grandes meios de comunicação repetem, como por exemplo que Santiago não estava no local da manifestação mapuche. Essas falsas noticias estão sendo desmascaradas graças à investigação de alguns jornalistas, da família e de organismos defensores de direitos humanos.
SUSANA SANTOS