“Foram demonstradas aqui diversas comprovações técnicas que apontam para a existência de um eventual impostor (…) com feições similares às do acusado”, diz perito
A Arquidiocese de São Paulo arquivou a investigação contra o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo da Rua, apontando falta de “materialidade da denúncia”. O vídeo, disseminado por bolsonaristas, foi produzido por inteligência artificial para tentar incriminar Lancellotti por pedofilia, afirmou o perito que avaliou a gravação.
“A Arquidiocese de São Paulo, não chegando à convicção suficiente sobre a materialidade da denúncia e considerando as conclusões do MPSP [Ministério Público de São Paulo], bem como da Justiça Paulista, também decidiu pelo arquivamento e informou à Santa Sé”, disse em nota.
O vídeo em que, supostamente, um homem aparece se masturbando em uma chamada de vídeo com um adolescente foi divulgado pela primeira vez e chegou até o Ministério Público de São Paulo (MPSP) em 2020. Já na época, o MPSP não viu materialidade para que o caso fosse levado à frente.
Quatro anos depois, o vídeo fraudulento voltou a ser divulgado nas redes sociais ao mesmo tempo em que o vereador Rubinho Nunes (MDB), fundador do Movimento Brasil Livre (MBL), encabeça uma campanha pela instalação de uma CPI contra o padre Júlio Lancellotti.
A Revista Oeste, adepta da banda mais podre do bolsonarismo, aquela que tinha Olavo de Carvalho como líder, divulgou uma “perícia” encomendada por Rubinho Nunes, concluindo que o vídeo era verdadeiro.
A perícia foi produzida pelo bolsonarista Reginaldo Tirotti, que chegou a pedir um golpe contra Lula, e tem erros de metodologia graves, segundo o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), Mário Gazziro. Gazziro avalia que o vídeo é uma fraude.
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Rapidamente, os bolsonaristas, como Carla Zambelli (PL-SP), passaram a divulgar o resultado da “perícia” para tentar incriminar Júlio Lancellotti. Jair Bolsonaro publicou em seu instagram uma montagem em que Lula aparece olhando para uma televisão em que passam imagens dele junto ao clérigo.
PERÍCIA DESMONTA FARSA
Mário Gazziro afirmou, em perícia produzida para a Revista Fórum, jornal Estadão e Poder360, que “diversas comprovações técnicas apontam a existência de um eventual impostor”.
“O material provavelmente foi produzido em casa ou estúdio de gravação, no qual tentou mimetizar ao máximo às características dos ambientes do Padre Lancellotti (amplamente divulgadas nas redes sociais dele), porém não conseguiram itens como um sofá similar, quadro, santa de madeira correta, etc”, explicou o especialista.
Além disso, Gazziro destaca que a “perícia” da Revista Oeste optou por ignorar diversos pontos relevantes para um estudo como esse. Os bolsonaristas sequer usaram fotos de 2019 ou 2020 para comparar o padre Júlio Lancellotti ao homem que aparece no vídeo.
“Os ditos peritos (…) ignoraram completamente o tamanho e o restante do formato geral das orelhas, as quais são muito discrepantes”, assinalou o professor da UFABC, que também comentou sobre a ausência de costeletas, presentes em fotos de Lancellotti em 2019, no homem do vídeo.
Em relação aos objetos presentes na gravação, Gazziro sublinhou que a escultura de madeira difere daquela que o padre Júlio Lancellotti tem na sala de sua casa. Na falsificada, o braço está dobrado em 90º, enquanto na do padre está em 130º.
Há, ainda, diferenças nas estátuas do Menino Jesus de Praga que aparecem no vídeo e na que o padre tem em sua casa.
Ao mesmo tempo, na perícia de Reginaldo Tirotti “não se faz menção ao desaparecimento do sofá [da sala do clérigo] no vídeo”.
O professor Gazziro também utilizou tecnologias forenses para comparar o rosto dos dois homens. O programa indicou que, nas fotos de 2019, Lancellotti tinha 67 anos. Já para o homem do vídeo, a tecnologia indicou 63.
“Notar que mesmo dentro da margem de erro, não seria possível o indivíduo do vídeo ter a mesma idade que o Padre, algo que foi avaliado pelo software americano, mas que também é visível nas análises, pela ausência de rugas de expressão e manchas de pele”, complementou o estudioso.
“Mais uma vez as evidências apresentadas aqui indicam que o Padre Júlio Renato Lancellotti não pode ser atribuído como protagonista do vídeo em questão em face apenas dos relatos técnicos dos pareceres que assim o pediram, pois todos eles incorreram em falhas grosseiras ao tentarem imbuir essa comprovação, ignorando completamente elementos periciais importantíssimos”, afirmou.
“Foram demonstradas aqui diversas comprovações técnicas que apontam para a existência de um eventual impostor (…) com feições similares às do acusado, sob certas condições e ângulos ideais, e pertencente a uma eventual quadrilha de criminosos, a qual lucra com a criação e revenda de material falso audiovisual e de cunho sexual”,
é inadmissivel o silêncio do resto total da igreja católica em defesa do Padre Júlio.
Você está achando que a Igreja Católica está silenciosa? Nós, nem tanto. Ela apenas age como Igreja, não é?
Confesso que não os entendi. Muitos setores da igreja católica são de direita mas acreditava que seriam capazes de mostrar solidariedade com o padre Júlio
Se é um problema de entendimento, será fácil resolver: o que nós achamos é que a Igreja, mesmo esses setores a que você se refere, estão solidários com o padre Júlio Lancellotti. Apenas, agem como Igreja, ou seja, não negam sua própria natureza. Será que agora está claro?