O desvio de dinheiro público propiciou a Lira um rendimento mensal de R$ 500 mil quando era deputado em Alagoas. O candidato de Bolsonaro à mesa da Câmara escondeu esse dinheiro do fisco por anos mas acabou obrigado a pagar R$ 1,9 milhão em impostos devidos
O candidato de Bolsonaro na disputa pelo comando da Câmara Federal, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), foi autuado pela Receita Federal por ocultar patrimônio amealhado por um esquema criminoso de “rachadinha” (desvio de dinheiro público através do salário de funcionários) quando era deputado estadual em Alagoas.
A autuação do Fisco ocorreu em 2009. Lira foi cobrado pela Receita Federal em R$ 1,9 milhão, por ter deixado de pagar impostos sobre os recursos obtidos ilegalmente. O Conselho Administrativo de Recursos (Carf) confirmou a multa cinco anos depois. Nas declarações entre 2004 e 2007, Lira omitiu os rendimentos, por meio do recebimento de depósitos bancários de origem não identificada.
O deputado não pagou imposto sobre verbas de gabinete que, na visão da Receita, tinham natureza remuneratória – e recebeu recursos acima do que a lei e as normas da Assembleia permitiam à época. A Receita avaliou que o deputado teve um “acréscimo patrimonial” e teria de recolher Imposto de Renda sobre esse montante.
O modus operandi do esquema de Lira é muito conhecido da família Bolsonaro. Não é por acaso que o deputado virou o candidato de Bolsonaro para a presidência da Câmara.
O esquema da “rachadinha” que Arthur Lira montou em Alagoas é similar ao que foi montado por Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
O desvio de dinheiro público propiciou a Lira um rendimento mensal de R$ 500 mil, quando era deputado em Alagoas, segundo denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República. Autuado pelo Fisco, Lira recorreu ao Carf, mas teve o recurso negado por unanimidade.
Na investigação que levou à autuação do deputado, a Receita denunciou que Lira aumentou seu patrimônio ao utilizar verbas de gabinete (verbas destinadas a salários de funcionários e pagamento de serviços legislativos) para quitar dívidas pessoais. “Constatou-se que parte dos recursos recebidos a título de verba de gabinete foi utilizada para quitação de empréstimos pessoais”, destacou o Fisco. “Tal aplicação dos recursos é contrária às destinações previstas na Resolução n° 392/95 e configura acréscimo patrimonial”.
A decisão de Lira de aderir ao Programa Especial de Regularização Tributária (PERT), em 2017, é uma confissão de culpa. Atualmente, ele faz o pagamento parcelado do débito. A assessoria do deputado confirmou a adesão ao programa, para regularizar sua situação na Receita. “O contribuinte Arthur César Pereira de Lira aderiu ao PERT e está rigorosamente em dia com o pagamento das respectivas prestações”, disse a assessoria. A Receita, por sua vez, informou que, por força do sigilo fiscal estabelecido pelo Código Tributário Nacional (CTN), não comenta a situação de contribuintes específicos.
Porém, Arthur Lira tentou mudar o PERT, programa de regularização tributária, em benefício próprio.
O PERT foi criado por Medida Provisória (MP), em 2017, no governo de Michel Temer, para facilitar as empresas a pagarem seus débitos, alavancando a arrecadação federal.
Na sessão de votação da MP, em 3 outubro de 2017, quando já havia aderido ao parcelamento, Lira apresentou emenda para dar 100% de descontos em encargos legais devidos – como, por exemplo, honorários advocatícios. O abatimento não existia no texto original.
A Receita apontou que Lira não conseguiu comprovar a origem de recursos referentes à sua movimentação bancária e à destinação dos recursos recebidos como verba de gabinete. O procedimento tramitou de maneira independente das investigações nas esferas cível e criminal que o deputado enfrenta.
Na esfera cível, Arthur Lira foi condenado em 2016, em 2ª instância, por improbidade administrativa, numa ação decorrente da Operação Taturana. A investigação apurava desvio de dinheiro da Assembleia Legislativa de Alagoas.
Quatro anos antes, ele havia sido condenado, em primeira instância, a devolver R$ 182 mil e pagar uma multa de mesmo valor. Por ser condenado em 2ª instância, Lira não poderia ter concorrido à eleição de 2018, mas uma liminar do então vice-presidente do TJ-AL, Celyrio Adamastor, suspendeu a sentença.
Na esfera criminal, Lira foi denunciado pela Procuradoria Geral da República em 2018, pelos crimes de peculato e lavagem de dinheiro, também no âmbito da Operação Taturana.
A ação, que estava no STF, foi enviada para a Justiça estadual. Em 3 de dezembro último, com Lira já candidato de Bolsonaro a presidente da Câmara, o juiz Carlos Henrique Pita Duarte, da 3ª Vara Criminal de Maceió, invalidou as provas e absolveu Lira sumariamente, sem analisar o mérito da denúncia.
O Ministério Público recorreu. A ex-Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, autora da denúncia de Lira ao STF, afirmou à época que o arquivamento da ação era uma afronta às decisões de tribunais superiores.
QUE PAÍS É ESSE???