Agraciados por uma liminar de Gilmar Mendes – o soltador de corruptos do STF -, mais quatro fraudadores de fundos de pensão, que haviam sido presos na Operação Rizoma, da Polícia Federal, já estão nas ruas. De acordo com a Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), Marcelo Borges Sereno, ex-assessor do ex-ministro José Dirceu, Adeilson Ribeiro Telles, Carlos Alberto Valadares Pereira (Gandola) e Ricardo Siqueira Rodrigues deixaram a cadeia no fim da tarde do sábado (19).
Marcelo Sereno era ex-secretário nacional de Comunicação do PT e assessor especial da Casa Civil no governo Lula. Tinha a função de fazer a conexão entre a quadrilha petista e a quadrilha de Sérgio Cabral. Como se diz popularmente, ele e seus amigos soltos estão prontos para outra.
Gilmar usou como pretexto para soltar mais essa leva de corruptos o argumento de que os fatos que embasaram as prisões preventivas ocorreram muito tempo antes das decretações das prisões. Ou seja, para ajudar os corruptos, ele inventou a aberração jurídica de que, mesmo graves, os crimes cometidos por eles não merecem prisão porque são antigos. “As acusações são de crimes graves, mas estão distantes da decretação da prisão”, disse Gilmar. “Os supostos crimes são graves, não apenas em abstrato, mas em concreto, tendo em vista as circunstâncias de sua execução. Muito embora graves, estes fatos são consideravelmente distantes no tempo da decretação da prisão”, acrescentou o ministro.
PROPINA
Segundo Mendes, em relação a Marcelo Sereno, os crimes se referem aos anos de 2013 e 2014; sobre Adeilson Ribeiro Telles, suspeito de fraudes no fundo Postalis, as falcatruas são do período de 2014 a 2016; em relação a Carlos Alberto Valadares Pereira, acusado de irregularidades no fundo Serpros, a 2014 e 2015; e sobre Ricardo Siqueira, também investigado por fraudar o Serpros, ao período de 2014 a 2017. O que Gilmar Mendes quer, com esses relatos, é livrar os corruptos porque, segundo ele, eles só roubaram em 2013 ou 2014. Como se as vítimas – isto é, os servidores das estatais lesados -, pudessem esquecer o prejuízo que eles causaram em seus fundos de pensão. Como bem observou o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal – Rio de Janeiro, em seu despacho ao decretar a prisão preventiva dos fraudadores: “os desvios de numerário dos fundos de pensão geram um déficit nas contas do fundo, o que obriga aos trabalhadores a realizarem contribuições extraordinárias para cobrir o rombo”.
A Operação Rizoma vinha investigando as atividades de Arthur Machado, testa-de-ferro da “Nova Bolsa” – uma fachada, no Brasil, da NYSE Euronext, grupo de bolsas dos EUA e Europa – e dono da Americas Trading Group (ATG). Arthur Machado passava propinas a diretores de fundos de pensão de estatais, para que colocassem dinheiro em suas empresas. Marcelo Sereno era intermediário entre Machado e os diretores dos fundos, nomeados pelo PT. Desde 2004, nota o MPF, Sereno operava no ramo dos fundos de pensão e de suas relações com antros de especulação financeira. O dinheiro das propinas, por sua vez, era obtido com outros golpes, sobretudo no mercado de câmbio.
A estimativa é de que o esquema investigado pela Operação Rizoma gerou cerca de R$ 20 milhões em propina. As investigações apontam que os valores eram desviados dos fundos de pensão Postalis (dos Correios) e Serpros (do Serviço de Processamento de Dados do governo federal). Os fundos mandavam dinheiro para empresas no exterior para pagar a prestação de serviços inexistentes. O dinheiro era espalhado por contas de doleiros e voltava ao Brasil para suposto pagamento de propina. Dois doleiros do ex-governador Sérgio Cabral operavam o esquema e ajudavam a trazer dinheiro em espécie de volta ao país.
Os fundos de pensão existem para complementar a aposentadoria de trabalhadores de algumas estatais. O que Machado e Sereno faziam era roubar dinheiro dos fundos, através de “investimentos” em antros de picaretagem. Assim, o dinheiro não voltava ao fundo dos trabalhadores – e era dividido entre os membros das duas quadrilhas.
FUNDOS
Os fundos Postalis e Serpros, sob ordens de Marcelo Sereno, colocaram, ao todo, meio bilhão de reais em “empresas” de Arthur Machado. Esse dinheiro foi remetido para os EUA, sob a forma de pagamento de mercadorias que nunca foram compradas. Dos EUA, esse dinheiro era enviado, por doleiros, para a China, com o objetivo de ocultar sua verdadeira origem. Da China, o dinheiro era remetido outra vez para o Brasil, onde era, então, dividido entre Machado, Sereno e o resto da quadrilha – incluídas as propinas para os indivíduos que o PT colocara na diretoria dos fundos.
Sobre a Operação Rizoma, o juiz Marcelo Bretas – declarou em seu despacho: “O caso ora em tela, afeta em especial os trabalhadores, uma vez que envolve o desvio de verbas dos fundos de pensão POSTALIS e SERPROS. Atualmente, muitas pessoas buscam investir em um fundo complementar de aposentadoria a fim de garantir uma velhice digna, com uma aposentadoria satisfatória”.
“ Cumpre destacar que a previdência social é uma garantia prevista na Constituição da Republica de 1988, que busca confirmar os direitos sociais previstos no artigo 6º do mesmo diploma, bem como o próprio direito à vida no seu sentido mais amplo. Nessa toada, o investimento em fundos complementares revela-se uma possibilidade do cidadão assegurar o seu direito a uma vida digna. Assim, se está diante de uma situação, que se comprovada, influencia negativamente na vida de milhares de trabalhadores que contribuíram para a previdência complementar”.
Mendes já havia beneficiado nestas duas semanas o lobista Milton Lyra – também preso pela Rizoma -, operador de propina do PMDB, Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, operador de propina do PSDB, o braço direito de Paulo Preto, o ex-diretor da Dersa, Geraldo Casas Vilela. Lyra foi preso por participação no mesmo esquema dos fundos de pensão. Mendes substituiu a prisão preventiva do lobista apenas pela proibição de entrar em contato com outros investigados e de deixar o país sem autorização da Justiça, como se não fosse possível operar contas no exterior a partir do Brasil, para quem tem um computador.
Na sua decisão, Gilmar Mendes admitiu que os crimes de Lyra “são graves”, mas decidiu soltá-lo alegando o mesmo pretexto: que “muito embora graves, esses fatos são consideravelmente distantes no tempo da decretação da prisão. Teriam acontecido entre 2011 e 2016“. Por esse profundo raciocínio jurídico, seria possível alegar que todos os que forem presos após a data de seus crimes não podem ser presos…
A procuradora-geral, Raquel Dodge, alertou que “caso seja posto em liberdade, Milton poderia realizar ampla movimentação do patrimônio ilícito, especialmente dos recursos que até o momento permanecem ocultos. É importante observar, ainda, que as investigações estão em andamento, sendo que os elementos colhidos apontam alta probabilidade de os atos de lavagem ainda estarem em curso”.
“Portanto, tendo em vista que a liberdade de MILTON LYRA traz um risco atual e iminente à garantia da ordem pública, da ordem econômica, da conveniência da instrução criminal e da aplicação da lei penal, faz necessária a manutenção da prisão preventiva do paciente”, concluiu Dodge, em sua manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF).
SÉRGIO CRUZ