O recente assassinato de Maria del Pilar Hurtado Montaño, liderança social de Tierralta, no departamento de Córdoba, em frente a um dos seus quatro filhos, comoveu a Colômbia, trazendo à tona a gravidade da onda de violência em que, mesmo após a assinatura dos Acordos de Paz, se vê mergulhado o país.
Os gritos da criança de nove anos em frente ao cadáver da mãe, de 36 anos, morta a tiros por desconhecidos em uma motocicleta, na sexta-feira (21), abafaram as comemorações do presidente Iván Duque de que os assassinatos diminuíram. O aterrador vídeo que circula nas redes sociais mostra o pranto de um órfão que, diante da impunidade oficial, terá a mãe reduzida a ser mais uma nas frias estatísticas governamentais.
Reivindicando terras comunitárias, Pilar Hurtado vinha sendo vítima de ameaças em panfletos que circularam dias atrás pela zona, assinado pelo grupo paramilitar Autodefesas Gaitanistas da Colômbia, como se autoproclama o Clã do Golfo, a maior quadrilha dedicada ao narcotráfico no país. A região é conhecida pelo crescimento do cultivo de coca e pela mineração ilegal.
Diante do assassinato, o ex-chefe das negociações do Acordo de Paz do governo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Humberto de la Calle, pediu a Duque para que tome medidas concretas, uma vez que “segue a carnificina”. “Senhor presidente, com respeito, não digo que a carnificina de lideranças sociais tenha começado com você, seria injusto. Porém está claro que há um agravamento indiscutível. Veja bem em quais ingredientes a sua política têm contribuído. Se seguimos assim, vem aí uma hecatombe humanitária”, declarou.
O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz) informou que entre os dias primeiro de janeiro de 2016 e 20 de maio de 2019 (2 anos, 4 meses e 19 dias), 837 líderes sociais, defensores de Direitos Humanos e ex-combatentes das FARC foram assassinados em toda a Colômbia.
“O principal fator de ameaça e insegurança continua sendo a existência, organização e fortalecimento de estruturas e condutas que se opõem à implementação dos acordos de paz, recorrendo à violência armada e à estigmatização”, afirmou a entidade.
Das 702 mortes de lideranças e defensores, a grande maioria – 282 – ocorreu no ano passado, sendo que os camponeses foram o grupo social mais afetado, seguido dos indígenas.
Durante os nove meses de Iván Duque (agosto 2018 – maio 2019) na Presidência, os homicídios contra líderes e defensores somaram 193.
Dos 135 ex-guerrilheiros da extinta Farc que perderam a vida, Cauca segue sendo o departamento com mais casos nos últimos dois anos e meio, período em que 35 familiares de ex-combatentes também foram assassinados.
“O objetivo de tantos assassinatos é desmembrar o tecido social, debilitar os sujeitos sociais e suas organizações e romper qualquer possibilidade de atuação coletiva e de paz”, ressaltou o Indepaz.