Um dos assassinos condenados 50 anos após o crime, brigadeiro reservista Hernan Chacón, se suicidou com um tiro logo após a chegada dos policiais a sua residência para efetuar sua detenção
Duas semanas antes do 50º aniversário da criminosa derrubada do presidente Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973, o Supremo Tribunal do Chile condenou nesta segunda-feira (28) sete militares reformados a até 25 anos de prisão pelo sequestro e assassinato do cantor e compositor Víctor Jara, uma das vozes mais reconhecidas da música popular na América Latina, dias após o golpe de Estado de Augusto Pinochet.
No mesmo caso, os juízes também os condenaram pelo assassinato e sequestro do ex-diretor penitenciário Littré Quiroga, que foi detido com o artista no Estádio Chile, que hoje leva o nome de Víctor Jara, e chegou a encerrar 5 mil detentos.
Os ex-oficiais do Exército Raúl Jofré, Edwin Dimter, Nelson Haase, Ernesto Bethke, Juan Jara e Hernán Chacón deverão pagar 15 anos pelo assassinato de Jara e Quiroga, além de 10 anos por ambos os sequestros, segundo a decisão.
Incompreensivelmente para a maioria da sociedade chilena, os condenados seguiam em liberdade o processo que corre há anos. Outro dos acusados como autor material, Pedro Barrientos, precisa ser extraditado dos Estados Unidos.
O brigadeiro reservista Hernán Chacón cometeu suicídio minutos depois da chegada da polícia a sua residência para efetuar a ordem de prisão. Segundo o relato da polícia, o militar pediu que o deixassem subir a seus aposentos para pegar remédios. Chegando ao dormitório ele se matou com um tiro.
Filiado ao Partido Comunista, Jara foi preso, torturado e assassinado com 44 tiros após ser preso na Universidade Técnica do Estado, onde trabalhava como professor. Ele tinha 40 anos. Littré Quiroga era diretor nacional de prisões e também membro do Partido Comunista. Ele recebeu 23 balas.
TORTURAS BÁRBARAS
Autor de canções como “Eu lembro de você Amanda”, “O direito de viver em paz” ou “Manifesto”, Víctor Jara é considerado um símbolo da Nova Canção Chilena, movimento musical e social da década de 1960 ao início da década de 1970. Seu assassinato foi um dos mais traiçoeiros cometidos pela ditadura (1973-1990), que deixou 3.200 vítimas, entre mortos e desaparecidos. Jara foi cruelmente agredido pelos militares por ser uma figura pública na época. “Foi-lhe aplicada tortura física, sendo os golpes mais severos os que recebeu na região do rosto e nas mãos”, segundo a investigação do juiz Miguel Vázquez.
As agressões “tiveram como principal motivo” a sua atividade artística, cultural e política, “intimamente ligada ao governo recentemente derrubado” do socialista Salvador Allende, acrescenta a sentença. Após três dias de tortura, quando foi ordenada a transferência dos detidos do Estádio do Chile para o Estádio Nacional, Jara e Quiroga foram separados dos outros presos e levados aos vestiários, onde foram mortos.
Em uma impressionante demonstração da barbárie fascista, os corpos de ambos foram jogados na via pública, junto com outros cadáveres. Eles foram identificados pelos moradores e levados ao Instituto Médico Legal, onde o corpo de Jara foi entregue à família, que o enterrou secretamente.
Em dezembro de 2009, 36 anos após sua morte, a justiça chilena ordenou a exumação dos restos mortais do artista, o que permitiu que fosse sepultado em uma cerimônia oficial da qual participou a então presidente do Chile, Michelle Bachelet.
ESTADOS UNIDOS PARTICIPARAM DO GOLPE
Documentos só agora revelados pelo governo dos Estados Unidos atestam que, além de estimular e financiar o sangrento golpe contra o presidente Salvador Allende, com a participação da CIA, o então presidente Nixon acompanhou de perto o desenrolar do golpe contra o líder popular chileno em 1973.
Dois trechos de relatórios divulgados nos últimos dias, vinculados ao golpe de Estado promovido pelos EUA contra a democracia e a soberania chilena, confirmam que a Casa Branca sabia de antemão os planos para a derrubada de Allende, quando o Palácio de La Moneda foi bombardeado. O material reforça a afirmação do conjunto de documentos já desclassificados com o título de “A opção extrema: derrubar Allende”, que inclui memorandos dos funcionários envolvidos, incluindo o então diretor da CIA, Richard Helms.