Ministério Público pediu e tribunal atendeu a demanda, pois entendeu que os relatos de assédio sexual podem configurar ‘flagrante violação ao princípio da moralidade’, previsto na Constituição
O ex-presidente da CEF (Caixa Econômica Federal), Pedro Guimarães, está enredado. Agora é o TCU (Tribunal de Contas da União) que está no encalço dele. A Corte de Contas abriu apuração sobre as denúncias de assédio sexual e moral contra o ex-presidente da instituição.
Guimarães deixou o cargo na semana passada, após se tornarem públicas as denúncias de funcionárias do banco, que relataram ter sofrido abordagens do ex-presidente que configuram assédio — sexual e moral.
O TCU abriu a investigação em atendimento a pedido do Ministério Público de Contas, feito pelo subprocurador Lucas Rocha Furtado.
‘PRÁTICA CRIMINOSA’
Segundo a representação, “quando praticado no âmbito da Administração Pública, o assédio gera a percepção, na sociedade, de que as instituições estatais não se pautam em valores morais nem são conduzidas segundo elevados padrões de conduta”.
No processo que abre a apuração, o TCU apontou que vai apurar se “o sr. Pedro Guimarães, no exercício da presidência da Caixa Econômica Federal, cometeu assédio sexual e moral contra empregadas e empregados daquela instituição financeira pública, o que, além de caracterizar prática criminosa, configura flagrante violação ao princípio administrativo da moralidade”.
RELATOS
Funcionárias da Caixa relataram ao portal Metrópoles e, agora, à TV Globo, denúncias de assédio sexual contra o então presidente do banco, Pedro Guimarães.
Elas contaram, por exemplo, que o presidente da Caixa pedia abraços em contextos constrangedores e deixava a mão escapar para passar nas partes íntimas dos corpos delas.
As funcionárias falaram sob a condição de anonimato.
Uma delas disse:
“Eu considero um assédio. Foi em mais de uma ocasião. Ele tem por hábito chamar grupo de empregados para jantar com ele. Ele paga vinho para esses empregados. Não me senti confortável, mas, ao mesmo tempo, não me senti na condição de me negar a aceitar uma taça de vinho. E depois disso ele pediu que eu levasse até o quarto dele à noite um carregador de celular e ele estava com as vestes inadequadas, estava vestido de uma maneira muito informal de cueca samba canção. Quando cheguei pra entregar, ele deu um passo para trás me convidando para entrar no quarto. Eu me senti muito invadida, muito desrespeitada como mulher e como alguém que estava ali para fazer um trabalho. Já tinha falado que não era apropriado me chamar para ir ao quarto dele tão tarde e ainda me receber daquela forma. Me senti humilhada”.
Outra funcionária afirmou que, às vezes, o constrangimento era feito na frente de outros colegas:
“Por exemplo, pedir para abraçar, pegar no pescoço, pegar na cintura, no quadril. Isso acontecia na frente de outras pessoas. E, às vezes, essas promessas eram no pé de ouvido e na frente de outras pessoas, mas de forma com que outras pessoas não ouvissem.”
ACOBERTADOR
Após denúncias de assédio sexual que derrubaram o então presidente da Caixa, funcionária do banco disse que Celso Leonardo Barbosa, ex-vice-presidente de Negócios de Atacado, é quem acobertava atos que teriam sido cometidos pelo ex-número 1 da instituição.
Tanto Guimarães quanto Barbosa pediram demissão do cargo depois que os casos foram revelados.
Em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, exibida no domingo (3), uma das funcionárias contou que Barbosa acobertava o assédio praticado por Guimarães e que ele passava a vigiá-las para não deixar a história vazar.
“Essas mulheres que receberam o ‘carimbo’ do Pedro [Guimarães], elas ficavam subordinadas ao Celso [Leonardo Barbosa]. (…) Não é que ele [Celso] acolhia. Era uma forma de monitorar pra ver se aquela história poderia, por exemplo, vazar. O 01 assedia, e o 02 protege com intuito de monitorar”, disse a funcionária do banco ao Fantástico.
Funcionária da Caixa há 11 anos e gerente de agência há 7 anos em uma capital do país, Rosimara* (nome fictício), afirmou ao UOl que a entrada de Guimarães na chefia do banco trouxe com ela uma naturalização da cultura do assédio. “É como se o gerente que assediava ganhasse uma estrelinha no currículo”, diz a funcionária.
“Existem Pedros Guimarães em cada uma dessas agências, gerenciando de uma maneira sórdida mulheres, que são mães, filhas, esposas, amigas e excelentes profissionais”, disse.