
Depois da saída de Ricardo Salles do cargo de ministro do Meio Ambiente, na quarta-feira (23), o delegado da Polícia Federal Alexandre Saraiva usou seu Twitter para comemorar a demissão da função no governo Bolsonaro.
“Eu avisei que não ia passar boiada”, disse o delegado responsável pela denúncia contra Ricardo Salles.
Saraiva foi exonerado da superintendência pelo governo Bolsonaro após enviar uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal (STF), no mês de abril, contra Salles e o senador Telmário Mota (Pros-RR ). Na denúncia, o delegado acusou Salles e seus aliados de obstruírem a maior investigação ambiental da Polícia Federal em favor de quadrilhas de madeireiros.
Na notícia-crime – instrumento usado para alertar uma autoridade policial ou o Ministério Público da ocorrência de um ilícito -, o delegado apontou que Salles o senador Telmário Mota de Oliveira (Pros-RR) “de forma consciente e voluntária, e em unidade de desígnios, dificultam a ação fiscalizadora do Poder Público no trato de questões ambientais, assim como patrocinam interesses privados (de madeireiros) e ilegítimos perante a administração pública, valendo-se de suas qualidades de funcionários públicos”.
Minutos antes de fazer esta publicação comemorando a saída de Salles do ministério, Saraiva ainda ironizou: “Eu continuo delegado da Polícia Federal”, escreveu, acrescentando um emoji com uma cara sorridente com óculos de sol.
Quem ri por último
A deputada Carla Zambelli (PSL-SP), ferrenha apoiadora de Bolsonaro, se incomodou com a publicação do delegado e respondeu: “Vamos ver quem ri por último. Onde Salles estará em 2 anos e onde você estará. Até onde eu sei, partidarismo dentro da Polícia Federal é no mínimo antiético”.
Saraiva não se intimidou e respondeu à bolsonarista: “Se quiser me convocar para uma nova sessão na Câmara dos Deputados estou a disposição. Adorei a última vez. A senhora e seus colegas tornaram o meu dia muito feliz”.
Ele ainda questionou Zambelli. “E o que a senhora acha de defender madeireiro ilegal (ladrões) dentro do MMA?”.
Investigação e denúncias
Alvo de inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF), Salles é investigado na operação da Polícia Federal que apura o possível favorecimento a empresários do setor de madeireiras. De acordo com as primeiras análises, as regras eram alteradas para facilitar a regularização de cargas apreendidas fora do Brasil.
No último dia 7, o delegado Saraiva participou do programa Roda Viva, na TV Cultura e ao ser questionado pelo repórter do jornal “O Globo” Leandro Prazeres sobre ter sido a primeira vez em que um ministro de estado pressionou o trabalho do delegado a favor de madeireiros, Saraiva afirma que sim.
“Sim [foi a primeira vez que um ministro me pressionou em favor de madeireiros]. E isso, eu posso dizer com tranquilidade porque foi gerado um vídeo por ele mesmo em que ele confessava o que estava fazendo. Então, a atuação dele é claríssima e inédita. Isso aí, fora de dúvida. Isso [a pressão de ministro] nunca aconteceu [comigo]”, disse o delegado.
Saraiva afirmou que as provas contra Salles são “contundentes”. “As provas da Handroanthus são toras. Aquilo tem uma logística muito específica para ser movimentada e muito custosa. Aquilo não some da noite para o dia. Depois as caixas contando os documentos que foi ele mesmo [Ricardo Salles] que entregou. Tudo o que tinha que se provar, está provado. Os laudos estão prontos. São laudos contundentes. Está tudo ali”
O delegado apontou que Salles integra uma “organização criminosa orquestrada por madeireiros alvos da Operação Handroanthus com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza”
Questionado sobre a entrevista concedida por Ricardo Salles ao “Estadão” em que o ministro duvidou da apreensão de madeira recorde feita pela PF no Amazonas e afirmou que as toras confiscadas eram regulares. Saraiva reafirmou que o material tem origem ilegal. “Isso não é verdade. Não está tudo certinho. Está tudo errado e muito errado”, afirmou.
O delegado também colocou sob suspeita a decisão judicial que liberou parte do material apreendido. “São decisões, essas especificamente, muito estranhas. Por exemplo, deste mesmo juiz que, de férias, determinou a devolução de maquinário, sob pena de multa de R$ 200 mil para mim e para os agentes que estavam no local”, afirmou. “São decisões que não são parâmetro.”
Saraiva criticou a Lei Complementar 140, que transferiu da União para os Estados a atribuição para autorizar planos de manejo florestal e corte raso. “Foi muito ruim, mas essa mesma lei complementar concede ao Ibama a possibilidade de fiscalizar subsidiariamente. E isso o Ibama não vinha fazendo”, disse.
Para Saraiva, as mudanças introduzidas por Salles nas regras para aplicação de multas contra crimes ambientais são “péssimas”. “É uma coisa completamente desarrazoada. Não tem lógica”, disse. “Me parece que existe sim uma intenção clara [de Ricardo Salles] em tornar a fiscalização menos eficaz. É inegável”, avaliou.