“O Presidente cria uma encenação, uma coreografia para mostrar que tem o controle das Forças Armadas e pode fazer o que quiser com o País. É um absurdo inaceitável. Não é um teatro sem consequências, mas um ataque frontal à democracia que precisa ser repudiado”. Outros senadores e líderes partidários também criticaram
A reunião desta terça-feira (10) na CPI da Covid-19 no Senado teve conotação diferente. O presidente do colegiado, senador Omar Aziz (PSD-AM), por meio de nota fez importante defesa da democracia e do Estado Democrático de Direito.
A reunião desta terça-feira toma o depoimento do coronel da reserva Helcio Bruno de Almeida, presidente do Instituto Força Brasil. O militar é apontado como elo entre representantes da empresa Davati Medical Supply, que negociava venda de vacinas, e o Ministério da Saúde.
A iniciativa se deu em razão de desfile de blindados das Forças Armadas pela Esplanada dos Ministérios, numa clara tentativa de o presidente da República querer intimidar e emparedar o Congresso Nacional e o STF (Supremo Tribunal Federal).
“Bolsonaro imagina, com isso, estar mostrando força, mas, na verdade, está evidenciando toda a fraqueza de um Presidente acuado pelas investigações de corrupção, inclusive desta CPI, e pela incompetência administrativa, que provoca mortes, fome e desemprego em meio a uma pandemia sem controle”, disse Aziz.
Ao encerrar a fala de abertura dos trabalhos da CPI desta terça-feira, Aziz enfatizou: “Agressões à Constituição não são legítimas. Defender golpe não é aceitável. E defender o fim da democracia precisa ser punido com o rigor da lei. Nós, os democratas, estamos aqui a postos para defender a democracia e o nosso País com os instrumentos que a Constituição nos confere”.
Eis a íntegra do pronunciamento de Aziz:
Enquanto abrimos esta importante sessão da CPI, o Brasil passa por um momento grave. Aqui do nosso lado, no Eixo Monumental [Esplanada dos Ministérios], o Presidente Jair Bolsonaro comanda um lamentável desfile de blindados das Forças Armadas em uma clara tentativa de intimidar Parlamentares e opositores.
Bolsonaro imagina, com isso, estar mostrando força, mas, na verdade, está evidenciando toda a fraqueza de um Presidente acuado pelas investigações de corrupção, inclusive desta CPI, e pela incompetência administrativa, que provoca mortes, fome e desemprego em meio a uma pandemia sem controle.
O Presidente cria uma encenação, uma coreografia para mostrar que tem o controle das Forças Armadas e pode fazer o que quiser com o País. É um absurdo inaceitável. Não é um teatro sem consequências, mas um ataque frontal à democracia que precisa ser repudiado.
O papel das Forças Armadas é defender a democracia, não a ameaçar. Desfiles como este serviriam para mostrar força para conter inimigos externos que ameaçassem a nossa soberania, o que não é o caso neste momento. As Forças Armadas jamais podem ser usadas para intimidar a sua população, seus adversários, atacar a oposição legitimamente constituída. Não há nenhuma previsão constitucional para isso.
O Brasil vive o maior período democrático de sua história desde 1985.
Temos eleições livres, instituições fortes e independentes dos Poderes. Bolsonaro não tem o direito de usar a máquina pública para ameaçar a própria democracia que o elegeu. Em apenas dois anos e meio de mandato, Bolsonaro colocou o País nessa situação vexatória; degradou as instituições e rebaixou as Forças Armadas, formadas, em sua grande maioria, por homens sérios e honrados, como pude presenciar de perto no meu Amazonas.
Todo homem público, além de cumprir suas funções constitucionais, deveria ter medo do ridículo, mas Bolsonaro não liga para nenhum desses limites, como fica claro nessa cena patética de hoje, que mostra apenas uma ameaça de um fraco que sabe que perdeu.
Não haverá voto impresso, não haverá nenhum tipo de golpe conta a nossa democracia. As instituições, Congresso à frente, não deixarão que isso aconteça. A democracia tem instrumentos para defender a própria democracia contra arroubos golpistas. Agressões à Constituição não são legítimas. Defender golpe não é aceitável. E defender o fim da democracia precisa ser punido com o rigor da lei. Nós, os democratas, estamos aqui a postos para defender a democracia e o nosso País com os instrumentos que a Constituição nos confere.
Senador Omar Aziz
Presidente CPI Pandemia
REAÇÕES
Outros líderes políticos se pronunciaram contra Bolsonaro por usar as Forças Armadas no seu interesse particular.
O presidente do Cidadania, Roberto Freire, afirmou que “Bolsonaro pretende carnavalizar as Forças Armadas, promovendo uma micareta verde-oliva na Esplanada enquanto o Congresso analisa o voto impresso”. “O ‘tanquetasso’ entrará de vez para o anedotário nacional eserá alvo de esquetes e piadas. Bolsonaro usa nossas FFAA sem respeitá-las”, completou.
Nove partidos divulgaram uma nota conjunta na manhã desta terça-feira (10) onde afirmam que Bolsonaro tentou “constranger” o Congresso Nacional com o desfile militar realizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília.
A nota é assinada por PSB, PCdoB, PDT, PT, Rede, Psol, Pstu, Solidariedade e Unidade Popular.
“Em meio às sucessivas declarações golpistas de Bolsonaro, e da votação do projeto do “voto impresso” nesta mesma terça-feira, com previsão de derrota, o desfile é uma clara tentativa de constrangimento ao Congresso Nacional”, diz a nota.
“Neste momento em que o Brasil acumula a trágica marca de quase 600 mil mortes, não tem sentido expor pessoas, inclusive os militares, promover aglomeração e gastar recursos públicos com tal atividade”, continua.
O senador Otto Alencar (PSD-BA) considerou que não é a primeira vez que Bolsonaro afronta os poderes. Para o senador, Bolsonaro tenta “intimidar o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal, os outros poderes e não tem conseguido. Em uma afronta que eu digo clara à Constituição Federal no seu artigo 5º e também a legislação que garante a democracia dos poderes”.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) disse que as “demonstrações” de Bolsonaro “não irão nos intimidar e não irão nos calar”.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) condenou a ação de Bolsonaro. “Quero dizer que fico com a democracia, fico com o artigo da Constituição que diz todo poder emana do povo”, completou.
A ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) afirmou que “Bolsonaro não vai nos intimidar!” “Hoje, enquanto ele colocava seus tanques na rua, nossos deputados lutavam em defesa da democracia brasileira”.
O líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), disse que o desfile dos tanques não irá esconder a “pequenez de um presidente cada dia mais fraco”. Para Molon, “Bolsonaro continuará derretendo!”. “Não aceitamos as desculpas de que o desfile no mesmo dia da votação foi uma coincidência. Essa foi a forma de constranger a Câmara para aproar o voto impresso e a melhor resposta será a reprovação da proposta com amplo placar”, afirmou Molon.
ORDEM DO PLANALTO
A jornalista Eliane Cantanhêde, em sua coluna no jornal Estadão desta terça-feira (10), revelou os bastidores do desfile de tanques e caminhões, ocorrido na Esplanada dos Ministérios no mesmo dia em que a Câmara vota, e deve derrotar, a PEC do voto impresso, defendida por Jair Bolsonaro. Apesar de terem sido chamados pelo Planalto, o desfile não contou com a presença de presidentes de outros poderes.
“A ordem para a Marinha desviar seus tanques e lançadores de mísseis para um desfile no centro da capital da República, esta terça-feira, 10, horas antes da votação do voto impresso, partiu do Palácio do Planalto e do Ministério da Defesa – e, ao contrário da versão oficial, foi dada na sexta-feira passada. Foi uma ordem política, com relação de causa e efeito com a iminência da derrota do presidente Jair Bolsonaro no plenário da Câmara”, disse Cantanhêde.