
O diretor do filme “Sem Chão”, Hamdan Ballal, só foi solto no início da manhã de hoje, após repercussão mundial contra seu linchamento por colonos judeus, seguido de sequestro e tortura por militares israelenses
Hamdan Ballal, diretor do filme “Sem Chão”, premiado com o Oscar de melhor documentário, relatou que foi agredido por soldados e colonos judeus na porta de sua casa depois de ter feito duas tomadas para documentar um ataque de colonos a sua aldeia, Susya.
Em declarações à rede Al Jazeera, assim que foi liberado na manhã desta terça-feira (25), contou que foi esmurrado no rosto, “caí e fui chutado”. Acrescentou que foi espancado na barriga, costas e cabeça e que achou “que a intenção deles era de me matar”.
Segundo Hamdan, ele estava registrando um ataque a uma casa vizinha, onde também se encontrava a ativista israelense pró-palestinos, Anna Lipman, quando sentiu que “os colonos chegavam em maior número e se dirigiam para sua casa”.
O cineasta correu e entrou em casa, fechando portas e janelas para proteger sua família.
“Quando saí para pedir aos agressores que parassem, comecei a ser agredido”, disse ele.
Nasser Nawaja, um pesquisador da organização com sede em Jerusalém, B’Tselem, especializada em registrar a violência contra palestinos na Cisjordânia, que estava no local e também filmou parte das ocorrências, relatou: “eu estive com o Ballal antes dele ser preso. No último mês têm havido ataques a sua aldeia quase todos os dias. Os colonos também nos pressionam para que saiamos de Susya”.

O ataque dos colonos começou na segunda-feira por volta das 7:30 da manhã, acrescentou Nasser. “Nós ligamos para a polícia que, ao chegar, disseram: ‘os colonos têm autorização para trazer animais para pastar aqui’, ao que respondi: ‘São nossas terras, são nossas casas’”.
Logo no início da agressão “eles atacaram casas de famílias locais e atiraram na direção de seu rebanho. Houve um outro ataque ao final da tarde da segunda-feira, testemunhou Anna Lipman, “quando nós viemos em socorro a Ballal”.
“Hamdan estava apenas de pé na entrada de sua casa e os colonos vieram em sua direção”, acrescentou Nasser.
“Eles destruíram tanques de água, e atiraram pedras em janelas”.

Logo depois Hamdan chegou a ser levado para uma ambulância e estava sendo tratado quando soldados o tiraram de dentro dela.
“Eu filmei”, conta Nasser, “eles o algemaram e vendaram seus olhos. O colocaram em um veículo militar e o sequestraram para local desconhecido”.
“Depois do ataque, Hamdan foi algemado e teve os olhos vendados durante toda a noite em uma base militar, enquanto dois soldados o espancavam, depois de atirá-lo ao solo”, disse a advogada Lea Tsemel, que falou com ele somente às 4:40 da manhã desta terça-feira, depois de procurar pelo seu paradeiro por 12 horas.
A advogada destacou que o cineasta ficou por toda “a noite do lado de fora da base em uma época do ano na qual a temperatura é enregelante”.
Segundo Tsemel, ele foi levado da base militar para a estação de polícia de Kiriat Arba (um bairro de colonos judeus localizado dentro da cidade árabe de Hebron, provocando muitos atritos com os moradores locais).
O diretor israelense do mesmo filme, Yuval Abraham, acompanhou as buscas por Hamdan junto com Lea Tsemel e foi divulgando as informações sobre a barbárie com seu colega em sua conta no X. Ele disse que “alguns dos colonos usavam máscaras no estilo da Ku Klux Klan”.
Uma outra testemunha que pediu para ficar anônima disse ao New York Times que “soldados viram a agressão sem que nenhum deles interviesse. Quando ele foi retirado, vimos sangue espalhado pelo chão onde ele foi agredido”.
Também foi declarado por pessoas presentes à cena que Ballal, no momento em que foi retirado da ambulância, tinha escoriações e sangue na roupa.
“Eram cerca de 20 os colonos que atacaram a aldeia de Hamdan Ballal”, disse seu colega palestino na direção do filme, Basel Adra. “Os soldados que chegavam apontavam suas armas na direção dos palestinos e não dos colonos atacantes”, disse Adra.
O conhecido ator Mark Ruffalo se pronunciou de imediato, dizendo que “o sequestro de Hamdan Ballal não foi um acidente”.

“Ninguém pode, independente da opinião geral sobre o conflito, deixar de entender que este é um ataque à nossa amada arte na forma de cinegrafia”.
“Hamdan Ballal é um preso político e este é um caso internacional de violação de direitos humanos”, ainda antes do cineasta ser liberado.
“Muitos de nós não nos surpreendemos com este comportamento por parte destes colonos sem lei e do exército de Israel neste ponto da situação. Matar jornalistas, sequestrar cineastas não é acidente, mas um projeto pela erradicação de um povo e sua cultura. Liberdade para Ballal!”, finalizou Rufalo.
O deputado e ex-dirigente do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, escreveu: “O filme ‘Sem Chão’ expõe a horripilante violência contra os palestinos na Cisjordânia que segue sob um prolongado apartheid. O codiretor do filme foi espancado em sua casa antes de ser detido pelas forças israelenses. Não se pode silenciar a respeito”.