Brasil virou o paraíso da agiotagem com o maior juro real do mundo
Com juros nas alturas turbinando o endividamento das família, dificultando o acesso ao crédito pelo setor produtivo e derrubando os indicadores econômicos, os três maiores bancos privados do país – Itaú Unibanco, Bradesco e o espanhol Santander – registraram no ano de 2022, juntos, um lucro de R$ 64,4 bilhões em lucro.
O Itaú Unibanco fechou o ano passado com lucro líquido de R$ 30,8 bilhões, um crescimento de 14,5% em relação ao ano anterior, e o Bradesco teve um lucro líquido de R$ 20,7 bilhões, uma redução de 21,1% em relação a 2021.
No Brasil, que ostenta as maiores taxas de juros do mundo, o banco Santander responde por mais de um quarto da receita do grupo. Seu lucro líquido em 2022 foi de R$ 12,9 bilhões. Ao divulgar o balanço do ano passado, o banco espanhol informou que o recorde alcançado de 9,6 bilhões de euros foi graças ao aumento das taxas de juros.
Com essa alta taxa da lucro, ainda reclamam que o resultado dos três bancos privados juntos representa uma queda de 7,31% no lucro em relação ao ano anterior (2021). O fato é que os bancos seguem esfolando o setor produtivo e a população brasileira que está endividada e é obrigada a pagar taxas que vão de 50% nos empréstimos a mais de 400% de juros no cartão de crédito ao ano, segundo o Banco Central.
Só o Bradesco, no quarto trimestre de 2022 lucrou R$ 1,6 bilhão, sem contar os R$ 4,9 bilhões que emprestou para a Americanas e que foram provisionados. Com isso, o banco reserva o dinheiro e reduz artificialmente o lucro, deixando de pagar impostos. Isso é o que se chama “provisão para eventuais perdas no crédito”.
Na esteira da taxa Selic, que colocou o Brasil como campeão mundial de juros reais (descontada da inflação), os bancos cobram as maiores taxas de juros e tarifas dos consumidores, numa verdadeira drenagem de recursos da população aos cofres de seus acionistas.
Enquanto os bancos mantiveram seus lucros extraordinários, alavancados pela disparada da taxa básica de juros (Selic), que passou de 2% em março de 2021 para 13,75% em agosto do ano passado, a produção industrial brasileira e as vendas do comércio varejista encerraram 2022 estagnadas.
ARROCHO NAS FAMÍIAS E NAS EMPRESAS
Com as famílias brasileiras, no desemprego ou se virando no trabalho precário, com renda arrochada e a carestia no preços dos alimentos, bateram recordes o endividamento e inadimplência, assim como nas pequenas e médias empresas. Segundo a Serasa, em dezembro de 2022, 69,43 milhões de brasileiros estavam com contas em atraso e mais de 6 milhões de empresas na mesma situação.
De acordo com a Confederação Nacional do Comércio (CNC), 77,9% das famílias brasileiras finalizaram o ano passado endividadas, isso significa 78 em cada 100 famílias, sendo que a maioria das dívidas são com o sistema financeiro, com destaque para o cartão de crédito que impõe juros de mais de 400% ao ano.
Segundo o Banco Central, o comprometimento da renda familiar com dívidas em atraso com instituições financeiras ficou em 28,2% em 2022.
“O rápido aumento dos juros entre 2020 e 2022 coincidiu com aumento de 14,3 pontos na proporção total de endividados no país”, constataram os pesquisadores da CNC. A entidade do comércio apontou ainda que em 2022 a proporção média de famílias com dívidas em atraso foi estimada em 28,9% do total de lares no país e a proporção de famílias sem condições de pagar dívidas já atrasadas também cresceu, alcançando 10,7% do total de consumidores brasileiros.
INDÚSTRIA E COMÉRCIO PATINAM
Com a cobrança de juros extorsivos no crédito e o comprometimento do orçamento das famílias com dívidas, as vendas do comércio varejista encerraram o ano passado estagnada (1,0%).
“A taxa média de juros ao consumidor avançou de 45% para 55,8% ao ano – a maior taxa em quase cinco anos. Esse movimento, associado ao comprometimento médio da renda com dívidas em nível recorde inviabilizou a aceleração do consumo a prazo, como tipicamente ocorre com os bens de consumo duráveis”, avaliou a CNC sobre o resultado das vendas em 2022 divulgadas pelo IBGE. O comércio varejista ampliado, que inclui veículos, autopeças e material de construção, encolheu 0,6% no ano passado.
O gerente de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Fábio Guerra, destacou que “a taxa básica de juros no patamar atual foi um dos fatores determinantes para a desaceleração da atividade econômica no segundo semestre de 2022 e seguirá sendo um limitador significativo para o crescimento da atividade em 2023, quando as previsões para o PIB indicam alta de apenas 0,8%, segundo o Boletim Focus do BC”.
Com zero de crescimento em dezembro (0,0%, segundo o IBGE), a produção da indústria brasileira encerrou o ano de 2022 com queda de -0,7%, em relação ao ano anterior. Frente a este resultado, a indústria brasileira encontra-se 2,2% abaixo do patamar pré-pandemia da Covid-19 (fevereiro de 2020) e 18,5% abaixo do nível recorde da série, de maio de 2011.
Com tudo isso, os juros elevados impostos pelo Banco Central, se por um lado não teve efeito nenhum sobre a inflação, que recuou após a redução do ICMS sobre os combustíveis, o aumento da taxa Selic promoveu uma enorme transferência de recursos públicos, da renda da sociedade, para os bancos, através do pagamento de juros. Só em 2022, foram transferidos dos cofres públicos, da saúde, da educação, da segurança pública, dos investimentos, R$ 586,4 bilhões para os bancos.