Levando em conta uma taxa de inflação (CPI) de 2,2%, o juro real na União Europeia está em 1,3%
Confirmando o cenário mundial de cortes nas taxas de juros, o Banco Central Europeu (BCE) reduziu sua taxa de juro para 3,5% na quinta-feira, podando 0,25 ponto percentual, o segundo corte seguido desde junho. Levando em conta uma taxa de inflação (CPI) de 2,2%, o juro real na União Europeia está em 1,3%.
Espera-se que na próxima semana o Federal Reserve irá fazer o mesmo na reunião do comitê de política monetária, nos dias 17 e 18, com a discussão sendo se o corte será de 0,5 ponto percentual ou de 0,25, e dando fim ao extenso ciclo de alta de juro desencadeado em março de 2022, no pós-pandemia.
Antes do BCE, já haviam baixado os juros o Banco da Inglaterra e o Banco da Suíça. Em 1º de agosto, o BoE havia cortado 0,25 pp, para 5%, o que levou o juro real a 2,39%. Em junho, pela segunda vez o SBN cortou o juro em 0,25 pp, para 1,25%.
A decisão do BCE visa estimular a economia europeia, que vem tendo um baixo crescimento sob os efeitos do aumento do custo de energia decorrentes das sanções contra a Rússia e abandono do gás russo barato, com o BCE tendo rebaixado sua previsão de crescimento para a zona do euro para 0,8% para este ano – praticamente estagnação – e 1,3% no próximo ano e 1,5% no seguinte, se der bom tempo.
O ‘ENFERMO’ DA EUROPA
O corte de juros ocorre no momento em que a Alemanha, principal economia da zona do euro, cuja economia se contraiu no ano passado, vive um quadro de ameaça de desindustrialização e declínio econômico.
Evidenciado no recente anúncio, pela gigante Volkswagen, de fechamento de fábricas no país e demissões, enquanto a indústria de uso intensivo de energia está nas cordas por causa das sanções contra a Rússia e perda do gás russo barato, e a crise também alcança a Basf, a Siemens e a ThyssenKrupp. A produção industrial alemã em julho ficou quase 10% abaixo do nível em que estava no início de 2023 e a tendência de queda já dura seis anos.
Para alguns analistas, os cortes deveriam inclusive ter sido maiores. “A taxa de inflação homóloga na Alemanha de 1,9% em agosto e o crescente fraco desempenho da economia germânica, sobretudo da sua importante indústria automobilística, um motor das exportações alemãs, pediam cortes mais enérgicos por parte do BCE”, disse à CNN Portugal, uma corretora lusitana.
Preocupação que se estende a países do sul da zona do euro, onde se teme que os riscos de recessão estejam aumentando e que as taxas altas do BCE restrinjam o crescimento mais do que o necessário.
Além do que o motor da alta da inflação que se viu no período, e que serviu de pretexto para o ciclo da alta de juros, era a alta do preço da energia, decorrente da decisão, tomada por Washington e acatada por Bruxelas, do abandono do gás russo barato em prol do mais caro gás de fracking norte-americano e demais sanções contra a Rússia, sob a crise na Ucrânia.
Também para estimular os empréstimos entre os bancos e movimentar a economia, o BCE fez um corte maior na taxa de juro das principais operações de refinanciamento ou taxa “refi” (que determina o preço que os bancos pagam quando pedem dinheiro emprestado ao Banco Central Europeu), de 60 pontos base, para 3,65%.
A decisão fora tomada em março, quando o BCE determinou que a diferença entre essas duas taxas, que era de 50 pontos-base há anos, deveria baixar para 15 pontos-base. A taxa de empréstimos também foi reduzida em 60 pontos base, de 4,50% para 3,90%.
FIM DA ESCALADA NOS EUA
No conclave anual global dos bancos centrais em Jackson Hole em agosto, seu presidente, Jerome Powell, sinalizou que daria término em setembro à escalada de juros depois de dois anos, dez altas e juro recorde na faixa 5,25%-5,5%.
Sinalização para a qual influenciaram sintomas como a turbulência em Wall Street, a pior em quatro anos, com o desmanche do carry trade yen/dólar; a sinalização sob a regra de Sham, que diz que, quando ocorre um aumento em 0,5% ou mais da taxa de desemprego trimestral em relação à baixa de 12 meses, uma recessão se aproxima (o que se deu no segundo trimestre); bem como a revisão para baixo na criação de empregos em 818 mil vagas desde março.
Enquanto nos círculos acadêmicos e nos antros da especulação a grande pauta era sobre se haveria um “pouso suave”, isto é, sem recessão, ou um tombo na economia. Segundo Powell, a inflação caíra significativamente, o mercado de trabalho não estava mais “superaquecido”, as restrições de oferta haviam sido “normalizadas” e o Fed fizera “um bom progresso”.
Quanto à inflação, embora de acordo com os dados oficiais haja caído, em relação aos itens básicos que compõem a maior parte das despesas das famílias, continua a ser um problema sensível. A ponto de ter se tornado um dos embates no debate Kamala-Trump, com o biliardário culpando-a e a Biden pela inflação, enquanto ela prometia estabelecer mecanismos de controle sobre a alta dos preços.
A propósito, em julho Trump advertiu em público o Fed a não mexer nas taxas de juros, isto é, não cortar, supostamente para não favorecer os democratas com um estímulo econômico.