
Uma semana de tristeza para a arte brasileira. Primeiro, a perda da cantora Gal Costa e, no mesmo dia, do compositor, cantor, ator e apresentador de TV, Rolando Boldrin, dois dos maiores expoentes da nossa cultura popular.
Cada qual ao seu estilo – Gal, dando voz a uma cultura mais urbana e, Boldrin, um legítimo representante do Brasil rural –, suas partidas são perdas inigualáveis.
Boldrin tinha múltiplos talentos, mas era, antes de tudo, o artista que incorporou em todas as suas formas de expressão o Brasil profundo, o homem caipira, o interiorano, o sertanejo que, por viver e criar longe dos centros do país, muitas vezes fica circunscrito àquele lugar, sem que sua riqueza cultural genuína chegue até a maioria de nós.
Pois foi a isso que Rolando Boldrin se dedicou nos seus mais de 60 anos de carreira: ser, ele próprio, o autor e intérprete de falas e canções violeiras, que dizem de meninos “fracos e mirrados” que “mastigam o mundo e ruminam” a “vida marvada”.
Mas não apenas isso, mas também ser, para milhões de expectadores, o talentosíssimo “contador de causos”, resgatando de forma brilhante essa forte expressão da nossa tradição oral e da nossa cultura popular e, ainda, aquele que incansavelmente divulgou a arte, os gêneros musicais, a poesia, o artesanato e o modo de vida desses brasileiros das mais longínquas regiões do país.
Tocador de viola desde os 12 anos e, como ator, um dos pioneiros da teledramaturgia, atuou em mais de 30 novelas e participou de cinco filmes. Nos discos, entre música, poemas e causos, gravou mais de 20.
Mas foi como apresentador de TV, ao estrear na década de 80, que seus múltiplos talentos se expandiram.
Com programas próprios, idealizados por ele e inspirados na amiga e parceira de arte, Inezita Barroso – que brilhou durante décadas com o programa Viola, Minha Viola na TV Cultura, de música sertaneja de raiz -, Boldrin fazia o que mais gostava e encantava o país.
Desde Som Brasil, na TV Globo, passando por Empório Brasileiro (Bandeirantes), Empório Brasil (SBT), Estação Brasil (Gazeta) e Sr. Brasil, na TV Cultura, que apresentou até este ano, resgatou a mais autêntica música regional, cantou, tocou, recitou e trouxe convidados para momentos de poesia, entrevistou, conversou, dançou, e “alumiou” com seus causos e carisma a tela de nossas TVs, assim como já deve estar fazendo, agora que se foi: “alumiado”, fazendo clarão no céu com os nossos aplausos e aplausos.
ANA LUCIA