Pela 11º vez consecutiva, boletim Focus eleva previsão de alta da inflação para manter os juros nas alturas
Para sustentar os juros nas alturas, as instituições financeiras voltaram a elevar, pela 11ª vez consecutiva, as projeções de inflação para 2023, passando de 5,89% para 5,90%, de acordo com dados divulgados nesta segunda-feira (27) no Relatório Focus do Banco Central (BC).
Na mediana das projeções da taxa básica de juros (Selic), o ponto-médio ficou em 12,75% para o fim deste ano. Ou seja, metade das instituições ouvidas pelo BC indicaram que querem uma Selic ainda maior. Desde agosto de 2022, a Selic encontra-se em 13,75% ao ano.
O BC consulta toda semana cerca de 120 instituições financeiras sobre suas projeções futuras para o desempenho do PIB, inflação, câmbio, meta para taxa Selic, entre outros. Com a pressão sobre o Banco Central para baixar os juros, que no ano passado custou aos cofres públicos R$ 700 bilhões – transferência da riqueza do povo via pagamento de juros a bancos, rentistas e demais especuladores da dívida pública – a claquete do “mercado” usa a inflação como pretexto para manter os brasileiros pagando a maior taxa de juros reais do mundo, acima dos 8% ao ano.
Como destacou o economista André Lara Resende, em entrevista à Band News. “Uma subida da taxa de juro desaquece a economia, não tem muito efeito sobre a inflação, especialmente sobre uma inflação como a que nós temos hoje. A inflação não é sempre o mesmo fenômeno. A inflação não é sempre um excesso de demanda. Às vezes é. Não é sempre. Na de hoje, claramente, não é. Essa inflação de hoje foi provocada por choques negativos de oferta, essencialmente, a desorganização produtiva que ocorreu no mundo todo com a pandemia e, na saída da pandemia, com a guerra da Ucrânia, que desorganizou e teve aumento de preço de energia: derivados de petróleo, de fertilizantes, e, portanto, de alimentos. E isso, portando, um choque negativo, e isso não se resolve com contração de demanda”.
Com a Selic em 13,75% ao ano, a taxa de juros do rotativo do cartão de crédito chegou a 411,5% ao ano em janeiro de 2023, maior patamar desde agosto de 2017. No final do ano passado, a taxa de juros média dessa modalidade era de 407,7% ao ano. Os dados foram divulgados pelo Banco Central nesta segunda-feira (27).
Já os juros do cartão de crédito parcelado em janeiro chegaram a uma taxa de 182,1% ao ano, sendo o maior patamar desde outubro do ano passado. Considerando o juro total do cartão de crédito, que consiste nessas duas modalidades de crédito, a taxa passou de 92,9% de dezembro para 94,9% em janeiro.
No cheque especial, a taxa passou de 132,1% ao ano para 132,0% ao ano de dezembro para janeiro. No crédito pessoal, a taxa passou de 40,9% para 41,7% ao ano. De acordo com o BC, a taxa média de juros no crédito livre (que não considera o crédito habitacional, agrícola e do BNDES) saiu dos elevados 41,7% ao ano em dezembro para 43,5% em janeiro. No primeiro mês do ano passado, a taxa média de juros no crédito livre estava em 35,3%.
Com os juros nestes níveis de agiotagem, cerca de 65,19 milhões de brasileiros não conseguiram pagar suas dívidas em janeiro. De acordo com a pesquisa da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), em janeiro, o número de pessoas com dívidas em atraso cresceu 0,56% em relação a dezembro de 2022, fazendo com que os inadimplentes atingissem a marca dos mais de 65 milhões no país. Ou seja, 7,74% maior do que o mesmo período de 2022.
De acordo com o BC, o endividamento junto ao sistema financeiro somou 49,6% da renda acumulada nos doze meses até novembro do ano passado. A taxa de inadimplência média registrada pelos bancos nas operações de crédito subiu de 3% em dezembro de 2022 para 3,2% em janeiro deste ano – a maior desde abril de 2020.
O Indicador de Custo de Crédito (ICC) do BC, que reflete a taxa de juros média efetivamente paga pelos consumidores e empresas nas operações de crédito contratadas no passado e ainda em andamento, subiu 0,4 ponto porcentual em janeiro ante dezembro, aos 21,9% ao ano.
As atividades da indústria e comércio também sentiram fortemente o peso dos juros altos em 2022 e neste ano devem se agravar ainda mais com os juros sendo mantidos elevados. No caso do comércio varejista, as vendas encerraram o ano de 2022 no vermelho, com queda de 2,6% em dezembro frente a novembro.
No acumulado do ano, as vendas do comércio varejista restrito fecharam em 1,0% na comparação com 2021 – sendo o menor resultado desde 2016 (-6,2%) e ficando inclusive abaixo do desempenho de 2020 (+1,2%), ano do auge da pandemia. Por sua vez, as vendas do comércio varejista ampliado, que incluem veículos, autopeças e material de construção, encolheram 0,6% no mesmo período.
Neste ano, o setor do varejo está sob ameaça de entrar em colapso diante do expressivo contingente de empresas que se encontram em dificuldades financeiras e não estão encontrando crédito ou, quando encontram, é muito caro. O custo do crédito disponível está muito alto, o que inibe a busca.
Segundo dados do BC, o saldo do crédito bancário em mercado alcançou R$ 5,3 trilhões em janeiro, redução de 0,3% no mês. Já o volume de crédito para as empresas diminuiu 2,4% ao totalizar R$ 2,1 trilhões em janeiro, enquanto para as famílias houve crescimento de 1,1%, atingindo R$ 3,2 trilhões.
Do lado da indústria brasileira, janeiro iniciou novamente em queda seguindo o ritmo dos anos anteriores. A atividade industrial recuou em janeiro, com queda da produção e do emprego, segundo dados da pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI). No ano passado, a produção da indústria brasileira encerrou o ano de 2022 com queda de 0,7%, em relação ao ano anterior. Assim, o setor encontra-se 2,2% abaixo do patamar pré-pandemia da Covid-19 (fevereiro de 2020) e 18,5% abaixo do nível recorde da série, de maio de 2011.