A derrubada desta semana em Wall Street, com o índice Dow Jones tendo a maior queda em um só dia da história e, considerando sexta-feira passada, recuando mais de 1800 pontos em dois dias e apagando todos os ganhos do ano, trazem de volta aquilo que o New York Times cunhou, já faz tempo, de “bolha de tudo”: os EUA pós-crash de 2008 e pós-bailout, com juros reais negativos e quantitative easing, garantidos pelo Federal Reserve, empurrando os especuladores a apostarem dia e noite.
Outros índices também foram ao chão na segunda-feira (5), com o S&P 500 encolhendo 4,1%; a Nasdaq (tecnologia) desabando 3,7% e as bolsas europeias e asiáticas acompanhando a queda livre. Segundo a Bloomberg, o capital fictício da plutocracia global perdeu US$ 114 bilhões de dólares em um só dia.
Assim, não é de espantar que, a cada balançada de Wall Street, haja pânico de que a hora da casa cair chegou. Afinal, os índices de especulação há já uma década seguem desenfreados rumo à órbita de Plutão – que já nem é planeta. Dos derivativos, hipotecas, papeis junk, recompra de ações via empréstimos para vitaminar distribuição de dividendos, passando pelo fracking e venda subprime de automóveis, o que não falta é especulação.
Na terça-feira, após subidas e descidas, a Bolsa de Nova Iorque acabou fechando em alta de 2,6% [sobre o patamar no subsolo da véspera], mas o resultado das bolsas europeias e asiáticas ainda foi negativo.
Conforme a agência Reuters, os especuladores ainda estão fazendo o balanço do que aconteceu na fatídica segunda-feira (5). Já o presidente Trump deve estar se perguntando se não deveria ter mantido fechada sua boca – ou seu Tweeter – por nas últimas semanas ter se gabado da alta em Wall Street como conquista da sua “política econômica”.“Esmagando um recorde após o outro”, gabou-se.
Uma coisa que chamou a atenção foi a velocidade da derrubada, descrita como “uma avalanche de vendas” – e de sua reversão. Em 11 minutos, o Dow desabou 900 pontos. Ao final do dia, a perda havia sido detida em – 4,6%. Como se sabe, ao invés dos corretores, as operações hoje em dia são feitas por potentes computadores, com apostas em milésimos de segundo, utilizando algoritmos.
Para o ex-subsecretário do Tesouro do governo Reagan, Paul Craig Roberts, o que deteve a queda foi o que ele chama de “Plunge Protection Team” (Equipe de Proteção de Derrubada [da Bolsa], que é um “grupo de trabalho do Fed”: o BC americano enviou “uma ordem de compra no mercado de futuros da S&P para o piso de negociação. Os fundos de hedge, vendo a oferta, fizeram frente, entrando e comprando os futuros. Isso empurrou o mercado de volta, encerrou a correção e impediu o pânico financeiro”.
Como Roberts lembra – e tem como saber, por ter integrado o governo Reagan, a “equipe” foi criada em 1987, como forma de evitar, nas suas palavras, que um desastre na Bolsa custasse a eleição presidencial de Bush Pai.
A explicação preferida da grande mídia para a derrubada foi que o aumento do salário médio registrado pelo relatório do Bureau de Estatística do Trabalho em janeiro (+2,9 ano sobre ano), o que impulsionou um aumento do juro sobre títulos de 10 anos do Tesouro para 2,85% – próximo aos fatídicos 3%. O que implicaria na ameaça de acelerar o ritmo da alta de juros marcada para este ano por causa da suposta tendência à alta da inflação, ainda mais quando Janet Yellen acaba de deixar o comando do Fed e tomou posse um financista nomeado por Trump, Jerome Powell, cujo apito que toca não está inteiramente claro.
Nem todos concordam com tal análise. “Investidores” ouvidos pelo site Sputnik afirmaram que um grupo de especuladores resolveu jogar a descoberto contra “o mercado” e, como se dizia antigamente, lavaram a égua. Há quem diga que foi um grupo de apostadores querendo “realizar os lucros” após a alta espetacular de janeiro.
O que poderia corresponder – tanto do lado dos especuladores, quanto do “grupo de trabalho” do Fed – à turbulência refletida no aumento do índice de volatilidade (VIX) de 117%, o maior aumento percentual em um só dia. No ano passado, o VIX registrou sua menor taxa anual média.
Nos EUA, historicamente, o estouro das bolhas vem quando, após manter as taxas de juros deprimidas, para favorecer os especuladores, o Fed é obrigado a aumentar o nível dos juros para patamares normais e aí a vaca vai para o brejo.
Uma das razões para isso, além da especulação pura e simples, que pode desinflar a qualquer momento, é que 12% das empresas dos EUA e 9% das empresas europeias dependem do dinheiro ultrabarato para sobreviver, ou seja, seus ganhos não cobrem sequer seus pagamentos de juros, e o patamar de 3% seria mortal para tais zumbis. Há ainda o enorme endividamento contraído por grandes corporações para elevar artificialmente seu valor de mercado.
Mas há os otimistas inveterados. Em sua posse, na véspera do susto em Wall Street, Powell asseverou que queria “informar que o nosso sistema financeiro é agora muito mais forte e resiliente do que era antes da crise financeira que começou há uma década. Nós pretendemos manter isso dessa maneira”. Será que ele acha que pode aplicar indefinidamente a receita de “Helicóptero Bernanke” e “Greenspan put” para adiar as crises?
A.P.