O povo de La Paz está nas ruas comemorando o novo governo que, no domingo (8), toma posse na Assembleia Legislativa Nacional. Muitas são pessoas com vínculo partidário, outras, também em grande número, foram às ruas espontaneamente. Mas, todas elas têm histórias que contam as conquistas dos governos anteriores do Movimento Ao Socialismo (MAS) e suas expectativas e reivindicações com o novo momento que o país vive a partir de amanhã, com a posse do governo de Luis Arce Catacora e David Choquehuanca.
Nossa reportagem conversou com alguns dos que estavam na Praça dos Heróis e todos têm um ponto em comum: a defesa do governo eleito e dos direitos do povo boliviano. Uma frase dita pela indígena Amalia resume estas conversas: “com o MAS somos mais!”
Flora: “Precisamos que volte a democracia”
“Eu me chamo Flora Figueiredo, moro em Palo Blanco e vim esperar o nosso presidente eleito Arce e o vice-presidente, David. No ano passado sofremos um golpe de Estado que nos fez a direita e por essa causa estamos aqui, esperando. Quero dizer que precisamos que volte a democracia porque com esse golpe fomos maltratados, perseguidos, assassinados os camponeses, os irmãos de Chapare e de Senkata. Por isso nós queremos apoiar a nosso presidente, com todas nossas bases que estão chegando agora.”
Que você acha que mudará com governo do presidente Arce que começa amanhã ?
“Estamos esperando as mudanças porque com este governo de direita, com todas nossas riquezas que tem sido saqueadas, como nosso petróleo que tem sido saqueado, precisamos que volte a democracia e que voltem para a Bolívia nossas riquezas que foram saqueadas. Nos meios de comunicação eu protesto contra o saque das nossas riquezas. Que sejam julgados os que roubaram, isso é o que queremos! Tem até prendido gente humilde, inocente, sem motivo nenhum. Eles que paguem pelo que fizeram”.
“Sou indígena, me chamo Amália e estou aqui na Praça esperando nosso presidente eleito”
“Eu sou da província Gualberto Villaroel, me chamo Amalia, sou indígena, e eu estou aqui, na Praça, esperando o nosso presidente eleito, Luis Arce Catacora. Então esta noite vamos estar de vigília e queremos presenciar, amanhã, o ato e vamos ficar aqui esta noite. Esta direita que tanto nos fez sofrer, tanto nos fez chorar, mais que tudo aos camponeses, sempre tem nos discriminado. As direitas como eles são inquilinos da Bolívia e querem se apropriar da nossa casa. Querem nos mandar embora, nos insultaram, às mulheres de pollera [com indumentária indígena] nos humilharam, nos pisotearam. Mas voltamos com mais gana e força para falar, nos expressar, dizer que estávamos sendo perseguidos. Encarceraram muitas pessoas humildes e também mataram muitos. Trouxeram franco-atiradores de outros países, não eram nossos irmãos bolivianos, vimos isso de perto. Eu estava presente em Senkata quando mataram, estava de turno, lá estávamos.
“Eles dizem que havíamos provocado, mas era mentira, chegavam diretamente, atiravam desde os helicópteros e falavam que queríamos incendiar fábricas em Senkata, o que é mentira. Estávamos presentes muitos camponeses e queríamos resgatar nossos cadáveres. Houve golpe de Estado, nós estamos seguros, não temos nenhuma dúvida. Eles querem nos fazer calar. E ainda há muitos mortos enterrados clandestinamente. Tomara que tenha justiça para esses órfãos que ficaram, mães que ficaram sem filhos. Não vamos esquecer nunca mais! Voltamos a vencer! Estamos muito contentes, agora choro de alegria! MAS toda a vida! Sempre vamos defender a democracia! Com o MAS somos mais!”
Oscar Flore: “o povo decidiu soberanamente”
“Meu nome é Oscar Flores, pertenço à regional de El Alto do MAS. Nós estamos em estado de emergência diante dos fatos e acontecimentos por parte de agressões das mal chamadas pititas [direita inconformada]. São grupos radicais que não querem entender o triunfo do irmão Luis Arce Catacora e do irmão David Choquehuanca. Estes grupos irregulares o que fazem é amedrontar nosso povo, estão fazendo explodir dinamite porque não estão de acordo com a decisão do povo, sendo que nós como partido, como MAS-IPSP, ganhamos por mais de 55% dos votos. Não querem aceitar a sua derrota. Eles tiveram a quadra, os árbitros, e as regras para nós, mas o povo, o soberano, decidiu.
Nina Cáceres: “recuperamos nosso espaço”
“Meu nome é Ninfa Cáceres, sou vice-presidenta do distrito 11 da cidade de El Alto. Estou assumindo este papel graças ao processo de mudança. Antes a mulher era relegada dos espaços de poder, dos espaços de representação política e sindical, dos espaços públicos. Graças ao processo de mudança se estabeleceu que a mulher tem uma participação dentro dessas estruturas. Então posso dizer que, graças à este processo, hoje represento um distrito político da cidade de El Alto. Como mulher, como representante política, estamos hoje cheios de satisfação, e também como boliviana porque hoje estamos deixando um marco na história. Hoje, depois de um golpe de Estado tremendo, podemos dizer que o povo, em paz, tem estabelecido sua democracia. Foi uma eleição limpa, uma eleição democrática. Hoje não só ganhou o instrumento político MAS, hoje ganhou o povo, o povo reconheceu esses 14 anos do processo de mudança. Reconheceu os aportes à educação, os aportes à saúde, reconheceu os aportes das lei em benefício da população, não só das mulheres. Hoje podemos dizer que estamos felizes e contentes por que estamos restabelecendo o espaço de respeito e representação das mulheres.
Hoje estamos voltando a ganhar democracia, estamos voltando a ganhar espaço porque nós, como mulheres, como sociedade, já temos quem nos ouça. Antes nos restringiram, agora recuperamos nosso espaço”.
Delia Apaza Baltazar: “a união do povo ninguém quebrará”
“Estamos muito contentes todas as bolivianas, todos os bolivianos porque tivemos um trauma no ano passado, perdemos vidas em Sacaba, em Senkata, em El Alto, e essas vidas nos demandam que agora o povo governe. Já basta dos grupos que têm querido se apropriar da Bolívia a título de autoridade, por conta de uma presidenta mulher, utilizando a imagem da mulher, para ser objeto de manuseio nas decisões que deve tomar o governo.
Agora sabemos como defender nossa democracia, e por isso estamos começando a formar quadros, os jovens. Temos que renovar nossos ideais com mais força para que possamos construir nossa Pátria Grande que é o sonho de Bolívar. A união de nosso povo ninguém vai quebrar agora, estamos mais fortes que nunca. As mulheres, os homens, jovens, adultos, todos estamos unidos agora, conscientes de que os neoliberais só tinham querido nos usar de objetos, só para trabalhar para eles, aplaudir eles. Chega. Não vamos permitir que nenhum país fique de olho no nosso lítio, não vamos permitir que queiram nos roubar nossos recursos naturais. Jallalla [que viva] o Estado Plurinacional”