CEITEC, conhecida como estatal do “chip de boi”, é a única fábrica de semicondutores da América Latina
O governo Bolsonaro deu início à privatização da estatal de semicondutores CEITEC – Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada, através do Decreto nº 10.578, publicado no dia 15 de dezembro. A estatal brasileira, localizada em Porto Alegre (RS), é a única empresa na América Latina que atua na fabricação de chips e semicondutores, utilizados na fabricação de componentes eletrônicos.
Vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, a empresa foi criada com objetivo estratégico de garantir o domínio tecnológico completo da fabricação de semicondutores no país. Seus chips podem ser usados em identificação de pessoas, veículos, animais, medicamentos e documentos.
A estatal está entre outras 20 fábricas no mundo que tem capacidade de produzir o semicondutor nitreto de gálio (GaN) usada nas aplicações para a quinta geração de telefonia celular e no carregamento de carros elétricos. Recentemente, a CEITEC vinha realizando estudos a fim de viabilizar sua planta para a produção de dispositivos e circuitos integrados usando o GaN, que vem se destacando em fábricas de semicondutores em todo o mundo, com ênfase para aplicações militares, Telecom (5G e 6G) e dispositivos de potência.
Em 2010, a CEITEC ganhou projeção nacional e ficou conhecida como a estatal do “chip do boi”. Em 2019, ultrapassou os 110 milhões de chips produzidos para diversificadas áreas de atividades. Nos últimos dois anos, houve um aumento de 154% na produção da empresa.
É da CEITEC o projeto do microchip que deveria ser usado no Passaporte Brasileiro emitido pela Polícia Federal e produzido pela Casa da Moeda do Brasil – mais uma estatal estratégica na lista das privatizações. A Casa da Moeda compra os chips do exterior, mesmo tendo a oferta da CEITEC à disposição.
“São poucas empresas no mundo que fazem e hoje, a Casa da Moeda usa o chip importado. Não tem realmente nenhuma explicação que se possa pensar para não usar o chip da CEITEC”, afirma Júlio Leão, engenheiro de Inovação e Patentes da CEITEC e representante dos funcionários junto à empresa.
A decisão de extinção da estatal foi formalizada este ano pelo Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), sob a alegação de que, apesar de aportes de R$ 800 milhões, a estatal ainda depende de injeções anuais de pelo menos R$ 50 milhões para cobrir a diferença entre receitas e despesas. As receitas da CEITC com a venda dos seus produtos em 2019 foi de R$ 7,8 milhões.
A associação que reúne os funcionários da estatal (ACCEITEC), que detém um quadro de profissionais especializado com mestrado, doutorado ou pós-doutorado e disputados por empresas internacionais do setor, contesta o argumento do governo. “Dissolver a CEITEC é retirar o Brasil de um seleto grupo de países que produzem semicondutores, é limitar importantes políticas públicas nacionais e findar com a possibilidade do país se tornar autossuficiente em tecnologia”.
É mais uma sabotagem de Bolsonaro à tecnologia nacional. Enquanto governos como os dos Estados Unidos e da China investem bilhões de dólares em fábricas de chip, o governo alega que a fábrica não dá lucro e deve ser extinta.
Em 1962, o governo americano era responsável pela compra de 100% de todos os chips semicondutores produzidos nos EUA. Semicondutores são o cérebro da eletrônica moderna permitindo avanços em dispositivos médicos, assistência médica, comunicações, computação, defesa, transporte, energia limpa e tecnologias do futuro, como inteligência artificial, computação quântica e redes sem fio avançadas.
Especialistas estimam que os EUA vão investir US$ 37 bilhões e a China US$ 1,4 trilhão em novas fábricas de chip.
A ACCEITEC (Associação dos Colaboradores de CEITEC) considera, ainda, que a decisão é um atropelo. A entidade aponta que não há aval do Tribunal de Contas da União (TCU) nem foi aguardado o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) da ADI 6241 que questiona a normatização de venda de estatais no país.