Como noticiamos, Bolsonaro, depois que a conversa de Paulo Guedes – aquele que iria governar o país se ele fosse eleito, segundo o próprio candidato – sobre aumento de impostos, liquidação da Previdência, e outras desgraças mais, foi divulgada, proibiu que o sujeito abrisse a boca (v. Guru de Bolsonaro cria crise ao propor fim da Previdência e subir Imposto de Renda).
Fez o mesmo com seu candidato a vice, Mourão, aquele patriota e humanista (como patriota, é a favor da entrega do país, sem limites, à casta imperialista dos EUA; como humanista, tem por herói – como o próprio Bolsonaro – um torturador e assassino que desonrou a farda que vestia).
Os dois obedeceram.
No sábado, quando escrevemos esta matéria, fazia três dias que Mourão não abria a boca.
Quanto a Guedes, desmarcou a reunião fechada que teria no Credit Suisse na quinta-feira; desmarcou sua conversa na XP Investimentos na sexta-feira; e desmarcou a apresentação de seu “plano econômico” na Câmara Americana Brasil-Estados Unidos (Amcham), também na sexta.
Quem não conseguiu ficar de boca fechada foi Bolsonaro.
No sábado, apareceu uma entrevista sua, em defesa de Guedes e de seu delirante arrocho fiscal. Nela, Bolsonaro esclareceu que “o Paulo [Guedes] segue firme”.
Bolsonaro declarara que não entendia nada de economia e que os assuntos econômicos eram com Paulo Guedes (v. sua entrevista ao “O Globo”, 23/07/2018).
Agora, declarou que “ele [Guedes] apenas está estudando alternativas. Tudo terá de passar pelo meu crivo”.
Os leitores vão nos desculpar a expressão, que não chega a ser chula, mas não é muito elegante (também, com esses personagens…): há uma diferença entre Bolsonaro e Guedes. Um é uma besta que confessa que não sabe nada sobre a principal questão de qualquer governo; o outro é uma besta que acha que sabe tudo sobre economia. Sendo que a primeira besta acha que a segunda entende mesmo alguma coisa de alguma coisa…
Disse Bolsonaro que a crise em sua campanha é por uma distorção do que disse Guedes na GPS Investimentos: “Se ele usa a palavra IVA [Imposto sobre o Valor Agregado] e não CPMF, não tem confusão nenhuma. Parece uma boa ideia, vamos estudar. A alíquota única do IR para quem ganha mais é uma boa ideia”.
Certamente, não é uma questão de “nome” ou “palavra”. É uma questão de conteúdo. Guedes pode ter usado a sigla CPMF (o que somente mostra a sua estupidez, considerando a plateia na GPS Investimentos), mas o que propôs é algo completamente diferente – e também nada tem a ver com qualquer Imposto sobre o Valor Agregado (IVA).
O que Guedes propôs foi privatizar completamente a Previdência, ao modo de Pinochet, passando para um regime que os tontos, papagueando o Banco Mundial, chamam de “capitalização”.
Como esse regime é insustentável econômica e financeiramente, Guedes propôs que dinheiro público fosse aplicado para sustentar as arapucas privadas que explorariam a Previdência.
Para obter dinheiro com esse objetivo, Guedes, então, propôs um imposto que incidiria sobre movimentações financeiras – mas, ao invés de ir para a Saúde pública, como a antiga CPMF, o dinheiro iria para os exploradores privados dos aposentados e trabalhadores da ativa.
Isso tem tanto a ver com a antiga CPMF (ou com qualquer IVA) quanto Bolsonaro tem a ver com o Duque de Caxias: nada.
Quanto à “alíquota única” de Imposto de Renda (Bolsonaro falou em “para quem ganha mais”, porém, não foi isso o que Guedes disse – e, mesmo que fosse, o sentido seria o mesmo) ela só pode servir para uma coisa: cobrar menos imposto dos mais ricos e mais imposto dos mais pobres.
É interessante a justificativa de Bolsonaro para as declarações de Guedes: “Olha, ele não tem experiência política. O cara dá uma palestra de uma hora, fala uma coisa por segundos e a imprensa cai de porrada nele”.
Pelo jeito, ele acha que política se faz mentindo para o eleitorado. Aliás, é claro que ele acha isso.
Entrevistado, Paulo Guedes declarou que “Bolsonaro me convenceu que eu não entendo de política”.
Nem de política, nem de economia. Guedes entende de dar fraudes e amealhar dinheiro para si próprio às custas da coletividade (v. “Posto Ipiranga” arrombou fundo dos funcionários do BNDES).
DESGRAÇAS
A relação de Bolsonaro e Guedes é, já tem algum tempo, motivo de piadas, inclusive entre supostos apoiadores. Por exemplo:
“Enquanto o namoro de Jair Bolsonaro e o seu ministro da Fazenda, Paulo Guedes, – ou da Economia como ele gosta de dizer – já dura um tempo, o deles com o mercado pode estar engatando um ménage à trois”. (MoneyTimes, 29/08/2018).
Realmente, Bolsonaro, em seu programa, propôs a exumação do Ministério da Economia – ou seja, propôs plagiar Collor. A diferença é que Collor colocou Zélia Cardoso de Mello como ministra. Bolsonaro quer colocar esse Guedes.
Passaremos por cima do pitoresco apontado pelo autor da matéria acima (convenhamos que “engatando um ménage à trois” não é coisa de um jornal familiar, como é o nosso).
O também neoliberal Pérsio Arida – presidente do Banco Central (BC) no governo Fernando Henrique e chefe do programa econômico de Alckmin – declarou que esse Guedes é um “mitômano”, ou seja, um mentiroso patológico.
Arida conhece bem seu colega de indignidade neoliberal – e o fato de chamá-lo de “mitômano”, em uma turma na qual a mentira é considerada uma virtude, tem algum significado.
Realmente, o sujeito parece um alucinado permanente – e cercado de outros alucinados.
Por exemplo, na sua equipe há um especialista em impostos, um certo Adolfo Sachsida, que defende um sistema tributário em que todos – não importa a renda, se é a do Setúbal, dono do Itaú Unibanco, ou a do João da Silva, que ganha salário mínimo – descontem uma mesma quantia fixa.
[Para os leitores que, compreensivelmente, não acreditarem, aqui vai um trecho de autoria de Sachsida, defendendo esse “imposto único”: “Qual seria esse imposto único? (…) me refiro a taxação lump sum. Um imposto lump sum é aquele onde cada indivíduo paga exatamente a mesma quantia, seja rico ou pobre, homem ou mulher, todo indivíduo paga exatamente a mesma quantia. Claro que você pode argumentar ser injusto o rico pagar a mesma quantidade de imposto que o pobre. Contudo, devo lembrá-lo que a tributação não deve ser usada para distribuição de renda” (cf. Adolfo Sachsida, Em Defesa do Imposto Único).]
É assim a “equipe econômica” de Bolsonaro. Formada por doidos – mas não do tipo que rasga dinheiro, sobretudo quando são dólares.
Já abordamos, em outro artigo, o programa de Bolsonaro (v. Guru de Bolsonaro cria crise ao propor fim da Previdência e subir Imposto de Renda).
Aqui, tomemos apenas um aspecto: “Os cortes de despesas e a redução das renúncias fiscais constituem peças fundamentais ao ajuste das contas públicas. O déficit público primário precisa ser eliminado já no primeiro ano e convertido em superávit no segundo ano” (v. Jair Bolsonaro, Proposta de Governo).
O déficit primário estimado para 2018 é R$ 159 bilhões (cf. STN. Resultado Primário do Governo Central – Julho/2018).
Guedes/Bolsonaro estão, portanto, propondo um “ajuste” – uma transferência de recursos para o setor financeiro – de quase R$ 160 bilhões, em um ano, depois do que Dilma/Levy e Meirelles/Temer fizeram desde 2015, com o resultado de colocar a economia do país em parafuso.
Como eles propõem fazer isso?
Privatizando todas as estatais – inclusive, como disse o próprio Bolsonaro, a Petrobrás “se for preciso” – e drenando todos os dividendos que o Estado recebe para os rentistas.
Essa parte se refere aos juros (a utilidade do “superávit primário” é reservar dinheiro para locupletar bancos e outros rentistas com os juros da dívida pública).
Porém, há mais, no programa de Bolsonaro:
“Estimamos reduzir em 20% o volume da dívida por meio de privatizações, concessões, venda de propriedades imobiliárias da União e devolução de recursos em instituições financeiras oficiais”.
A dívida pública federal está em R$ 3,75 trilhões (cf. STN, Relatório Mensal – Dívida Pública Federal – julho/2018).
Portanto, Guedes/Bolsonaro estão propondo passar aos bancos, fundos estrangeiros, e outros detentores de títulos da dívida, R$ 750 bilhões (20% do total), como amortização, além dos juros.
Como?
“Por meio de privatizações, concessões, venda de propriedades imobiliárias da União e devolução de recursos em instituições financeiras oficiais”.
Alguns – inclusive neoliberais – apontaram que nada disso tem pé nem cabeça, pois é impossível.
Preferimos, aqui, colocar o foco em outro aspecto: que métodos políticos Bolsonaro e caterva acham necessários para implantar (ou tentar) essa destruição por atacado de um país já exausto de tanta destruição?
Exceto se o povo – dos trabalhadores aos empresários nacionais – concordar em, inerte, morrer tão calado quanto o Mourão depois do esculacho de Bolsonaro, pela democracia é que não é.
CARLOS LOPES
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Bom dia, a todos acho que devemos ficar espertos com certos candidatos que se dizem ser os Salvadores da pátria.O guru de Bolsonaro esta mostrando para que lado estará governando e claro que para os ricos. Paulo Guedes disse em entrevista pretende acabar com a previdência e subir o imposto de renda eu infelizmente eu não tenho candidato na política o que mais tem é lobo em pele de cordeiro. Este Bolsonaro pode enganar a muitos, mas a mim não engana.