Deputado foi condenado a 8 anos e nove meses de prisão por ameaçar de morte ministros do STF, pregar a violência e atacar a democracia
Jair Bolsonaro anunciou na tarde desta quinta-feira (21), em transmissão ao vivo por uma rede social, perdão da pena ao deputado Daniel Silveira, condenado na véspera a oito anos e nove meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por 10 votos a 1, por ameaças contra a vida de ministros do STF e atentados contra a democracia.
Além dos oito anos e nove meses de prisão em regime fechado por estímulo a atos antidemocráticos e ataques a ministros do Supremo Tribunal Federal e a instituições, os ministros do STF também determinaram a perda do mandato e dos direitos políticos e multa de cerca de R$ 200 mil.
A medida de Bolsonaro de dar um indulto individual a um criminoso condenado na véspera, por 10 votos a 1, no Plenário do Supremo, está sendo considerada um desrespeito e uma afronta à Justiça e um incentivo à criminalidade por parte do Planalto. Por meio de decreto, Bolsonaro afirmou que o ato seria publicado no “Diário Oficial da União”, o que se efetivou logo após o anúncio, em edição extra da publicação.
Em sua transmissão, Bolsonaro nomeou e medida como uma “graça constitucional” a Daniel Lúcio da Silveira. Segundo Bolsonaro, “a graça será concedida independentemente do trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. O “trânsito em julgado” é a etapa do processo em que não há mais possibilidade de recurso e a decisão judicial torna-se definitiva. Com isso, a sentença tem de ser executada.
O que o mandatário fez foi desautorizar a Corte máxima do país que condenou praticamente por unanimidade um desqualificado que extrapolou todos os limites da liberdade de expressão e que confundiu imunidade parlamentar com proteção contra todos os crimes, inclusive açular pessoas a invadirem o STF, “cortar a cabeça de Alexandre de Moraes e colocá-la numa lata de lixo”.
Com essa medida, Bolsonaro está assinando embaixo de todas as ameaças criminosas e ataques que o deputado condenado fez contra os ministros do Supremo e contra a democracia.
As alegações do Planalto para tomar a medida foram:
“a prerrogativa presidencial para concessão de indulto individual é medida fundamental à manutenção do Estado Democrático de Direito e inspirado em valores compartilhados por uma sociedade fraterna, justa e responsável”;
“a liberdade de expressão é pilar essencial da sociedade em todas as suas manifestações”;
“a concessão de indulto individual é medida constitucional, discricionária, excepcional destinada à manutenção do mecanismo tradicional de freios e contrapesos, na tripartição de poderes”;
“a concessão de indulto individual decorre de juízo íntegro baseado necessariamente nas hipóteses legais, políticas e moralmente cabíveis”;
“ao presidente da República foi confiada democraticamente a missão de zelar pelo interesse público”;
“a sociedade encontra-se em legítima comoção diante da condenação de parlamentar resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição que somente fez uso de sua liberdade de expressão, decreto, um decreto que vai ser punido”.
A verdadeira comoção da sociedade não é com a prisão do deputado, como Bolsonaro se refere em sua justificativa, o que se vê na realidade com a decisão do presidente de afrontar o STF dessa maneira, mandando soltar um elemento que esta ameaçando de morte os ministros do STF e estimulando a invasão do tribunal, é que o acupante do Planalto não está tendo limites em seu desrespeito às normas constitucionais.
ENTENDA A CONDENAÇÃO DE DANIEL SILVEIRA
Silveira virou réu em abril do ano passado no âmbito do inquérito sobre atos antidemocráticos. Em fevereiro de 2021, foi preso por ter publicado vídeo no qual defendeu o AI-5, instrumento de repressão mais duro da ditadura militar (1964-1985), e pregado a destituição de ministros do STF, ambos os atos inconstitucionais.
Ao longo do processo, o deputado teve decretadas outra prisão e medidas restritivas por descumprir ordens como a de uso de tornozeleira eletrônica e de não se comunicar com outros investigados. O deputado chegou a atacar o Supremo em novos eventos.
Em março, Alexandre de Moraes determinou que ele voltasse a ser monitorado eletronicamente e proibiu que ele participasse de eventos públicos. Silveira chegou a ficar dois dias sem sair da Câmara para evitar a medida. Só depois que Moraes determinou pagamento de multa diária de R$ 15 mil e bloqueio das contas do parlamentar, ele foi à Polícia Federal para instalar o equipamento.
Noutra frente, na Câmara, o Conselho de Ética aprovou a suspensão do mandato de Silveira por seis meses, por apologia ao AI-5. O parecer ainda não foi encaminhado pelo presidente da Casa, Arthur Lira, ao plenário, que precisa analisar a decisão do conselho.
Íntegra
Leia abaixo a íntegra do decreto de Bolsonaro:
DECRETO DE 21 DE ABRIL DE 2022
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso XII, da Constituição, tendo em vista o disposto no art. 734 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, e
Considerando que a prerrogativa presidencial para a concessão de indulto individual é medida fundamental à manutenção do Estado Democrático de Direito, inspirado em valores compartilhados por uma sociedade fraterna, justa e responsável;
Considerando que a liberdade de expressão é pilar essencial da sociedade em todas as suas manifestações;
Considerando que a concessão de indulto individual é medida constitucional discricionária excepcional destinada à manutenção do mecanismo tradicional de freios e contrapesos na tripartição de poderes;
Considerando que a concessão de indulto individual decorre de juízo íntegro baseado necessariamente nas hipóteses legais, políticas e moralmente cabíveis;
Considerando que ao Presidente da República foi confiada democraticamente a missão de zelar pelo interesse público; e
Considerando que a sociedade encontra-se em legítima comoção, em vista da condenação de parlamentar resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição, que somente fez uso de sua liberdade de expressão;
DECRETA :
Art. 1º Fica concedida graça constitucional a Daniel Lucio da Silveira, Deputado Federal, condenado pelo Supremo Tribunal Federal, em 20 de abril de 2022, no âmbito da Ação Penal nº 1.044, à pena de oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos:
I – no inciso IV do caput do art. 23, combinado com o art. 18 da Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983; e
II – no art. 344 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.
Art. 2º A graça de que trata este Decreto é incondicionada e será concedida independentemente do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Art. 3º A graça inclui as penas privativas de liberdade, a multa, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, e as penas restritivas de direitos.
Brasília, 21 de abril de 2022; 201º da Independência e 134º da República.
JAIR MESSIAS BOLSONARO