Nem fritar hambúrguer, o sujeito fritou
Em vídeo no qual defende sua indicação pelo pai para embaixador nos EUA, Eduardo Bolsonaro enumera suas qualidades para ocupar o cargo. A maior, revela ele, é que já foi elogiado por Donald Trump:
“Não tô querendo me gabar, mas desconheço brasileiro que tenha tido tamanha honra de receber esse elogio da pessoa mais poderosa do mundo.”
Bem, agora, nós entendemos. Na verdade, o sujeito é candidato a criado na Casa Branca.
O Bolsonaro falou em embaixador porque não sabe a diferença.
Na segunda-feira (15/07), Bolsonaro declarou que as críticas ao seu anúncio de que pretende indicar o filho, Eduardo Bolsonaro, para embaixador nos EUA, são o sinal de que a decisão é certa: “Se está sendo criticado, é sinal de que é a pessoa adequada”.
Se as críticas são justas é algo que não passa pelo bestunto desse elemento, porque a própria ideia de justiça é, para ele, uma perversão (v. HP 24/04/2019, Bolsonaro e as milícias).
Em suma, se ele nomeasse o Maníaco do Parque para assessor do Ministério da Mulher, e recebesse críticas por isso, seria a prova de que não há sujeito tão adequado para tratar dos assuntos femininos.
Não se trata de um exagero, leitor. E não apenas porque a lógica (ou falta de lógica) é essa. Mas também por outra razão.
O critério para a escolha de Eduardo Bolsonaro é, basicamente, antissocial. O que for contra a sociedade, Bolsonaro (pai) acha “adequado”.
A sociedade brasileira formou, ao longo de sua história, determinadas instituições – por exemplo, o Itamaraty e o Instituto Rio Branco, com sua diplomacia, desde os tempos do Barão do Rio Branco (e mesmo antes, nos tempos do pai do Barão, o Visconde de Rio Branco).
Não se trata, apenas, dos diplomatas de carreira – pois esta carreira foi enriquecida por brasileiros que eram notáveis em outras áreas.
Por exemplo, a embaixada do Brasil nos EUA já foi ocupada por Joaquim Nabuco, Oswaldo Aranha, Walther Moreira Salles, Ernâni do Amaral Peixoto, Mário Gibson Barbosa, Azeredo da Silveira, Rubens Ricupero, Flecha de Lima – e até os entreguistas que estiveram no cargo (Roberto Campos e Marcílio Marques Moreira, por exemplo) eram pessoas que haviam lido mais do que a bula do Melhoral.
A indicação de Eduardo Bolsonaro está sendo criticada porque sua única credencial para ser embaixador – na principal representação do Brasil no exterior – é ser filho de Bolsonaro.
Fora isso, é um despreparado e incapaz para o cargo – além de ser um capacho do que há de pior nos EUA. No momento, é um cabo eleitoral de Trump. Como embaixador, poderá ajudar bastante a afundar a campanha de seu ídolo (pois sua especialidade não é ganhar votos, e, sim, recebê-los prontos do pai).
Na terça-feira (16/07), Bolsonaro repetiu as credenciais de seu filho para ser embaixador nos EUA:
“Eduardo é meu filho… fala inglês, fala espanhol, tem uma vivência internacional muito grande. E frita hambúrguer também, tá legal?”
A última informação (?), que foi dada pelo próprio filho de Bolsonaro e repetida por este, é mentira.
Na terça-feira, descobriu-se que a lanchonete em que Eduardo Bolsonaro supostamente fritava hambúrgueres nos EUA, não serve hambúrgueres. Só frango frito (v. Lanchonete onde Eduardo Bolsonaro trabalhou não tem hambúrguer).
A outra (a de que fala inglês) é altamente duvidosa.
Quanto à “vivência internacional muito grande”, os leitores que nos desculpem, mas nem vamos comentar uma imbecilidade dessas.
Mas tudo isso são coisas pequenas – mesmo que ele falasse inglês melhor do que Rui Barbosa, fritasse hambúrgueres dignos do La Tour d’Argent, em Paris, e fosse um especialista no circuito Helena Rubinstein (Paris, Londres, Roma, Nova Iorque), nada disso o credenciaria a ser embaixador em Washington.
Porém, nem essas coisas pequenas ele tem – ou são verdadeiras.
Eduardo Bolsonaro, com muito boa vontade, é um debiloide (v. “Se Calígula pode nomear o cavalo senador, eu posso nomear um burro embaixador”, pensa Bolsonaro).
Bolsonaro anunciou que pretende nomear seu filho para a embaixada nos EUA no dia 11, dia seguinte ao que Eduardo Bolsonaro completou 35 anos, idade mínima para ser embaixador.
A embaixada em Washington foi, portanto, o presente de Bolsonaro a seu filho.
Mas a embaixada não é uma propriedade de Bolsonaro.
Bolsonaro, portanto, está presenteando o que não é seu.
Por isso, como disse o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), agora “temos o primeiro caso de nepotismo internacional da história do Brasil”.
DIFERENÇA
Para o ex-governador Ciro Gomes, “Eduardo Bolsonaro é um imbecil, com um português muito ruim, o que quer dizer que o inglês também não deve ser muito bom”.
E, realmente, o seu inglês é tão ou mais horrendo que o seu português.
Segundo a senadora Simone Tebet (MDB-MS), que não é uma oposicionista, a indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixador em Washington corre o risco de não ser aprovada pelo Senado. O pior, segundo ela, é o vexame que pode acontecer na sabatina do filho de Bolsonaro na Comissão de Relações Exteriores do Senado, obrigatória para os candidatos a embaixador: “A sabatina expõe demais o governo, pode dar uma fragilidade que o governo ainda não tem na casa. Eu tenho esse sentimento hoje [de que a indicação será derrotada no Senado], sentindo algumas pessoas que defendem o governo com unhas e dentes questionando que isso foi erro. Não tem precedentes no mundo, em países democráticos. A votação é secreta”.
O líder da Oposição no Senado e integrante da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), considerou a nomeação uma afronta e disse que entrará com uma ação no STF, caso Bolsonaro confirme sua intenção. “É um escândalo total. Tenha certeza que o governo Bolsonaro terá o primeiro caso de rejeição de embaixador. É um caso flagrante de nepotismo que não pode ser aceito”, declarou.
Outro senador integrante da comissão, Marcos do Val (Cidadania-ES) questionou: “É a família que está no comando do governo federal?”. “Não sou favorável [à indicação]. Há profissionais que dedicam sua carreira a isso. Não vejo de forma nem um pouco positiva. Os filhos [de Bolsonaro] não podem ter este protagonismo que estão tendo porque você confunde”, afirmou.
Para o senador Angelo Coronel (PSD-BA), “será uma indicação terrível”. Contudo, ele quer sabatinar Eduardo Bolsonaro para aferir sua qualificação. “A relação familiar e falar a língua do país não significa que a pessoa tenha todos os predicados para a função”, disse Coronel.
Dentro do Itamaraty, muitos diplomatas trataram a indicação como chacota e outros, surpresos, acharam inacreditável a indicação.
C.L.