Ele enrola, mas não esclarece. Mesmo que houvesse alguma dúvida sobre se “moeda corrente” é “dinheiro vivo”, fica a pergunta: de onde saiu tanto dinheiro? Sem falar nos outros 56 imóveis pagos de outras formas. É muito dinheiro para quem recebia só salário
Jair Bolsonaro está alegando em seus programas de TV que os 51 imóveis, de um total de 107, comprados por ele, seus filhos, suas ex-mulheres e outros parentes com dinheiro vivo, desde que ele entrou para a política na década de 90 até 2022, não foram em dinheiro vivo. A reportagem do site UOL, em um levantamento em cartórios que durou sete meses e analisou 270 documentos, garante que as compras foram “in cash”, ou seja, em dinheiro vivo.
DINHEIRO VIVO
Segundo os documentos obtidos, as aquisições foram feitas em nome de Bolsonaro, de sua mãe, dos três filhos, cinco irmãos e de suas duas ex-mulheres. Os contratos assinados, conforme as escrituras, indicam pagamento “em moeda corrente nacional”, expressão formal usada para classificar compras feitas em dinheiro vivo. A versão de Bolsonaro é de que a descrição feita nas escrituras de pagamento em “moeda corrente” não significa que tenha sido em dinheiro vivo.
A análise detalhada dos documentos dos cartórios contesta a afirmação de Bolsonaro. O estudo revela a existência de várias formas de pagamento. Há compras feitas mediante cheque ou transferência bancária, num total de 30 operações. Há compras em dinheiro vivo (in cash), designadas como sendo feita “em moeda corrente”, e há também documentos em que não se pode determinar qual foi a forma de pagamento. Isto ocorreu, por exemplo, em 26 transações analisadas.
Mesmo que tivesse algum fundamento essa “explicação” de Bolsonaro, já seria difícil explicar como sua família, de posses modestas até ele entrar para a política, teria adquirido 107 imóveis neste período. Não há rendimento legal que explique esse volume de transações. Só os 51 imóveis que teriam sido pagos em dinheiro vivo somam um valor atualizado de R$ 25,6 milhões. Neles, há, desde casas, até mansões de luxo, passando por apartamentos, lotes e lojas.
LAVAGEM
A prática de pagar em dinheiro não é ilegal, mas se constitui numa das maneiras mais utilizadas para lavagem de dinheiro de origem ilícita, crime que consiste em colocar no mercado legal recursos obtidos de forma ilícita. Especialistas afirmam que a compra com dinheiro vivo pode ser um sinal indireto de lavagem de dinheiro.
É o caso, por exemplo, de Flávio Bolsonaro. Ele é acusado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro de ter desviado ilegalmente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro R$ 6 milhões, através do esquema conhecido como rachadinha onde são contratados funcionários fantasmas que devolvem parte dos salários para o parlamentar. E, segundo o MP-RJ, uma das formas de lavagem desse dinheiro desviado foi feita através de compra e venda fraudulentas de imóveis, além da utilização de sua loja de chocolates que existia num Shopping da Barra da Tijuca.
O próprio Bolsonaro também contratou funcionários fantasmas em seus gabinetes quando era deputado. É o caso, por exemplo, de Nathalia Melo Queiroz, filha de Fabrício Queiroz, o faz tudo da família e operador do esquema de rachadinha de Flávio Bolsonaro (v. Filha de Queiroz era fantasma de Jair Bolsonaro em Brasília)
As transações imobiliárias suspeitas se dividem em três núcleos. No primeiro, estão Bolsonaro e suas ex-mulheres Rogéria Nantes e Ana Cristina. Esta última, que mora com Jair Renan Bolsonaro, o “zero quatro”, acaba de confessar que comprou uma mansão no Lago Sul de Brasília avaliada em R$ 3 milhões, tendo uma renda de R$ 8 mil.
O trio pagou com dinheiro em espécie a compra de oito imóveis, entre casas, apartamentos e lotes. As aquisições foram efetuadas em Brasília (DF) e no Rio de Janeiro ao valor de R$ 973,1 mil (R$ 3,2 milhões em valores corrigidos).
TOTAL 107 IMÓVEIS
O segundo núcleo tem como figuras centrais três filhos do presidente: Carlos, Eduardo e Flávio Bolsonaro. Eles compraram, juntos, 19 apartamentos e salas comerciais no Rio de Janeiro durante o período investigado pela reportagem. Segundo os registros que constam nos cartórios, as transações somam montante de R$ 8,5 milhões (R$ 15,7 milhões corrigidos).
No terceiro núcleo, os compradores são a mãe do presidente, dona Olinda – falecida em janeiro deste ano–, e seus irmãos Renato, Denise e Vânia Bolsonaro.
Um outro fato que reforça a veracidade da reportagem é que, na sexta-feira (2), um ex-funcionário do casal Jair Bolsonaro e Ana Cristina Valle (quando eles eram casados), Marcelo Nogueira, afirmou, em entrevista ao UOL, que a advogada Ana Cristina Siqueira Valle, segunda ex-mulher de Bolsonaro, confidenciou a ele [Marcelo] que a primeira mansão onde o casal viveu, na Barra da Tijuca (RJ), entre 2002 e 2007, foi paga com “dinheiro por fora”.
EX-FUNCIONÁRIO CONFESSOU
Marcelo relatou que começou a trabalhar para Cristina e Bolsonaro na campanha de Flávio Bolsonaro para deputado estadual, em 2002, e depois foi convidado a permanecer trabalhando na nova mansão que o casal havia comprado. O imóvel, que fica na rua Maurice Assuf, na zona oeste do Rio, foi comprado em 22 de novembro de 2002.
Ele contou que, ao limpar o escritório e organizar alguns papéis, viu a escritura da casa, por ocasião da mudança, e comentou com Cristina que se surpreendeu com o valor, dadas as características do imóvel. Marcelo afirma então que Cristina disse a ele: “É que sempre tem um por fora, né?”. “Quando ela comprou aquela casa da Barra, na época, por R$ 500 mil, na documentação. Só que foi mais. Que foi dado em dinheiro vivo, por trás”, contou o ex-funcionário.
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