“Não vamos interferir no mercado de jeito nenhum, não existe canetaço para resolver o problema da economia”, afirmou
Jair Bolsonaro anunciou que não é problema dele a disparada, de quase 20%, nos preços do arroz neste ano. Se o povo vai ter mais dificuldades para colocar o arroz na mesa de sua família, na opinião de Bolsonaro, não é um problema que deva preocupar o presidente da República.
“Não vamos interferir no mercado de jeito nenhum, não existe canetaço para resolver o problema da economia”, afirmou. Ou seja, o que Bolsonaro disse textualmente, em sua live, realizada na noite desta quinta-feira (10), é, simplesmente, “que se dane a população”.
E o mais grave. Ele repetiu o absurdo que disse também o vice-presidente, Hamilton Mourão, sobre o problema. De que a culpa pela alta dos preços foi do excesso de consumo do produto pela população. O povo, segundo Mourão, teria causado o problema por ter usado a ajuda emergencial para comer. Quem mandou comprar muito arroz?, indagaram.
Literalmente o que eles disseram foi que a culpa do problema da explosão de preços é do povo.
O que as duas autoridades estão fazendo na verdade é uma tremenda vista grossa para a forte especulação que está ocorrendo com o produto desde o início do ano.
Aliás, não só com o arroz, mas, inclusive, com feijão, carne, etc. Os produtores estão ganhando muito mais dinheiro exportando o arroz e outros produtos, por causa da desvalorização do real frente ao dólar. Com isso, os produtos estão em falta no mercado interno e os especuladores estão se aproveitando da situação para aumentar ainda mais os seus preços.
Qualquer governo com um mínimo de seriedade sabe que tem que haver controle sobre o abastecimento do país em situações como esta. Todos os órgãos de controle, como a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), por exemplo, vêm sendo desmontados pela dupla Bolsonaro e Guedes. Eles não querem nenhum controle sobre nada.
Em situações de falta do produtos no mercado interno, é urgente a intervenção do governo para reduzir as exportações e garantir o abastecimento da população. No geral, mas, mais ainda nesses casos, o país deve exportar apenas o excedente. Entretanto, o governo diz que não tem nada com isso.
Bolsonaro não só decidiu deixar a população abandonada à própria sorte, como defendeu os empresários do setor que estão ganhando muito mais dinheiro exportando o arroz do que garantindo o abastecimento.
“Houve mais exportação por causa do dólar também, sabemos disso aí. Os rizicultores, os plantadores de arroz, estavam com prejuízo há mais de 10 anos”, disse o presidente, justificando a alta exagerada dos preços do arroz nos últimos meses.
Ele descartou qualquer controle ou qualquer tabelamento de preços no país. “Ninguém quer tabelar nada, interferir em nada, isso não existe. A gente sabe que, uma vez interferindo, tabelando, isso desaparece da prateleira e depois a mercadoria aparece no câmbio negro muito mais cara”, acrescentou, ao citar que o Brasil já teve experiência com essa prática de tabelamento.
Como se este aumento de 20%, isto é, muito acima da inflação, que está na casa dos 2% a 3 %, já não fosse uma desgraça para o orçamento popular.
No Brasil, as únicas coisas que são tabeladas com rigor, e que não podem subir de jeito nenhum, é o salário mínimo e a aposentadoria. O Brasil tem um dos menores salários mínimos do mundo. Até o Paraguai, um pequeno país vizinho, tem um salário mínimo maior do que o brasileiro. O governo intervém sistematicamente nos salários, como acabou de fazer, reduzindo o salário mínimo para 2021. Mas quando se fala em intervir sobre preços exorbitantes é um “Deus-nos-acuda”.
Bolsonaro fez, na quinta-feira (10), uma transmissão ao vivo em suas redes sociais, afirmando que tinha dado aval para o ministro da Justiça, André Mendonça, notificar os supermercados sobre a alta no preço do arroz. Na mesma hora o Ministério da Economia deu um puxão de orelhas nele e no ministério e desautorizou qualquer cobrança aos supermercados.
Antes, Bolsonaro tinha pedido aos donos de supermercados que reduzissem suas margens de lucro “por patriotismo”. Mudou o discurso e passou a negar qualquer interferência nos preços.
Os supermercados não só não aceitaram reduzir margem nenhuma como, com o apoio dado por Guedes, tiveram espaço para defender que o povo pare de comer arroz.
“Eu não sei responder. Pode ser que seja mais rápido. Tem um lado psicológico que pode ser que afete aí, o fato de consumir mais macarrão já faça uma regulagem do preço. O que precisa, sim, é entrar mais produto. Ter mais oferta do arroz no mercado para resolver esse problema”, disse o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), João Sanzovo Neto, ao falar sobre a especulação com o produto.
Bolsonaro, que já havia pressionado os produtores brasileiros a aceitar uma redução das tarifas de importação de etanol norte-americano, numa ajuda na campanha eleitoral de Donald Trump, que está atrás nas pesquisas, viu a grande oportunidade de dar mais uma forcinha para o seu guru do norte, e reduziu também as tarifas de importação do arroz norte-americano.
Ou seja, o país exporta o arroz que produz e importa o arroz dos Estados Unidos. Todo esse malabarismo para não fazer o óbvio, que é regular o mercado consumidor brasileiro. Tudo para beneficiar Donald Trump.
Até mesmo o presidente da Câmara Setorial do Arroz do Ministério da Agricultura, Daire Paiva Coutinho Neto, criticou as decisões do presidente. Ele disse nesta quinta-feira (10) que “o governo ter zerado a tarifa de importação de arroz para países de fora do Mercosul não deve alterar muito os preços para o consumidor final.”
“A safra norte-americana está atrasada e o arroz da Ásia não vai chegar aqui mais barato do que o nosso, já que os preços externos também estão altos”, explicou.