O ex-governador Ciro Gomes, candidato do PDT à Presidência, afirmou, em entrevista ao jornal Valor Econômico, na quinta-feira, que Jair Bolsonaro é “uma cédula de 3 reais”. “Ele é qualquer coisa e é nada”, disse Ciro. “Ele não entende o país. E sua equipe vai na mesma linha, acha que a solução é vender o Palácio”, acrescentou o ex-governador, referindo-se aos planos de privatização já anunciados.
Ciro subestima na entrevista a ameaça que representa o projeto de Bolsonaro para a democracia brasileira, mas, ao mesmo tempo, diz que na economia a expectativa “é de medíocre para ruim”. “Você tem 63 milhões de pessoas inadimplentes no SPC [Serviço de Proteção ao Crédito] e isso é um problema macroeconômico, nenhuma chance de o mercado, individualmente, resolver”, denunciou.
Perguntado o que acha da pessoa do Bolsonaro, Ciro disse que “ele domina um assunto que lhe deu sete mandatos: quinquênio, aposentadoria, progressão, viúva de militar… Do petismo para cá, ele começa a ser mandado para reagir à agenda ‘revanchista’ – ponha muitas aspas nisso, porque a palavra é deles – do PT. Por exemplo, Comissão da Verdade”, apontou o presidenciável do PDT.
Para ele, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, “parou de ler nos anos 1980 e definitivamente não leu nada depois de 2008”, ano em que foi deflagrada a crise econômico-financeira mundial. E justamente a economia, a seu ver, “será a grande definidora do sucesso ou não do governo, em uma lua de mel que praticamente não existirá”.
Ciro acha que Bolsonaro terá cerca de seis meses para apresentar resultados. “Como estamos vivendo um fim de ciclo, mas ele tem um universo que intuitivamente domina: esse universo ‘criptoconservador’ de costumes. Ele pode se refugiar nisso. Assim, pode extrair seis meses, e propor a redução da maioridade penal, o agravamento da lei de execução penal…”, avalia. “A economia é quem será o definidor [do sucesso ou não do governo]. Mas eu não vejo o novo governo nem sequer considerando as questões que tentei dizer na campanha”, observa Ciro.
Sobre a “expectativa” do mercado de que a reforma da Previdência ajude algo na atual crise fiscal, Ciro foi direto. “É uma baboseira”, disse. “Também não há concepção aí”, acrescentou o governador. Ele insistiu na defesa do modelo de capitalização que fracassou no Chile e que Bolsonaro pretende adotar. “O modelo previdenciário brasileiro, de repartição, é irreformável. Impressionante como as pessoas não querem ouvir isso. Só o Brasil, a Argentina e a Venezuela insistem no modelo de repartição”, disse ele.
O ex-governador não está sendo preciso, como costuma ser, quando diz que somente esses três países adotam o modelo de repartição na Previdência e que esse modelo é a causa das crises desses países. Isso seria uma simplificação e, também, uma subestimação do papel do rentismo nessas crises.
França e Alemanha, por exemplo, adotam o modelo de repartição, o Japão, o modelo misto, e assim por diante. E o desastre chileno da capitalização não pode passar em branco. Em nenhuma análise séria da capitalização, modelo preferido de Guedes e Bolsonaro, ele é superior à conquista do modelo de repartição obtida na Constituinte de 88.
Questionado se os lucros não estariam retornando, Ciro negou. “Como pode ter lucro se estamos com 30% de capacidade ociosa e com o Brasil se desindustrializando tão selvagemente? “Sem uma política industrial, a crença de que o Brasil vai pagar eletroeletrônico, bens de capital, informática e química fina com feijão, milho, boi e soja in natura é completamente ilusória”, destacou.
Sobre um possível crescimento da direita, ele disse que “não tem essa direita”. “Essa daí só se reuniu para negar. E nisso é indispensável refletir a contribuição do PT. Não ganhou a direita, ganhou o antipetismo. Se não, eu seria obrigado a achar que 65% do eleitorado do Rio Grande do Sul é fascista, de direita, e sei que não é. Precisa tomar um pouco de cuidado com essa mistificação petista. O PT produziu essa onda [bolsonarista], que é a maior força política, mas é uma força para negar”, afirmou Ciro Gomes.