Recessão, arrocho e desemprego
Ficou público conchavo com presidente do BC e secretário do governo
Depois que o candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, Mourão, e o seu guru econômico, o mal afamado Paulo Guedes – tão mal afamado que até a maioria dos neoliberais quer estar longe dele – se reuniram com o “secretário de assuntos estratégicos” de Temer, agora foi a vez do Banco Central (BC).
Bolsonaro prometeu, se eleito, manter o atual presidente do BC, Ilan Goldfajn, e, ainda por cima, dar-lhe um mandato de quatro anos – sem que ele tenha de concorrer a qualquer eleição para ficar quatro anos manipulando os juros e o câmbio, somente dando satisfação aos bancos, fundos e outros rentistas.
Goldfajn, israelense de nascimento, nomeado por Temer depois de indicado por Meirelles, é sócio do Itaú Unibanco, do qual era “economista-chefe” até ir para o BC; antes, foi economista e consultor do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Já o “secretário de assuntos estratégicos” – um certo Hussein Kalout, professor da Universidade de Harvard – segundo disse Mourão, “é uma pessoa inteligentíssima, muito preparado”, que poderá ser “incorporado” ao governo, se Bolsonaro vencer as eleições.
Dizem algumas fontes que o plano de Bolsonaro, se vencer as eleições, é chamar o Meirelles. Afinal, pretende manter a equipe de Temer – isto é, a de Meirelles -, a começar pelo Banco Central…
Não se trata de mera blague, leitor. Quem quer continuar com a equipe de Temer é porque pretende fazer a mesma coisa que Temer.
Tanto isso é verdade que a equipe de Temer e a de Bolsonaro têm feito reuniões para implementar, depois das eleições, a “reforma da previdência”.
Existe, inclusive, um documento de autoria de Guedes, explanando que, no início, a “reforma da Previdência” seria igual àquela que Temer não conseguiu fazer (v. “Guru de Bolsonaro defende em documento reforma da Previdência de Temer”, O Globo, 27/09/2018).
Guedes, por sinal, negou que o documento fosse de sua autoria – o que, em se tratando de um mentiroso crônico, contumaz trapaceiro do cassino financeiro, é a melhor confirmação de que foi ele o autor. Como se não bastasse essa prova, “O Globo” obteve a confirmação de alguns outros assessores da campanha de Bolsonaro.
Porém, esse pessoal é muito precipitado. O afobado, já dizia o grande Moreira da Silva, come cru e bebe cerveja quente.
Bolsonaro não foi eleito – e, pela rejeição majoritária da população à pouco brilhante perspectiva que seria para o país, não é provável que seja. Mais de 70% do eleitorado – e deve ser mais, já que estamos nos baseando em pesquisas que não são muito científicas – não querem Bolsonaro como presidente.
Por várias razões.
Sucintamente, como já dissemos aqui, o programa de Bolsonaro consiste em rasgar a Constituição – e, com ela, as conquistas do povo brasileiro, depois de 21 anos de luta contra a ditadura.
Não faltam declarações a esse respeito: seu programa político tem como conteúdo a restauração de uma ditadura que foi derrubada há 33 anos.
Mas para que restaurar uma ditadura que foi extremamente impopular em sua época?
Obviamente, para fazer coisas impopulares, para fazer coisas contra o povo e contra o país. Se não, para que essa malta iria querer uma ditadura?
Ou, em palavras mais precisas: para fazer o que Temer não conseguiu, devido à resistência do povo.
Já apontamos, em outros artigos, o extremo servilismo do programa econômico de Bolsonaro, uma espécie de continência diante da bandeira dos EUA, do ponto de vista econômico.
Mas isso ainda parece abstrato – ou algo vago – a pessoas até muito boas.
Portanto, o anúncio de que o grande plano de Bolsonaro para o BC e para a Previdência é continuar a obra de Temer, tem o mérito de tornar concreto o que dissemos: é essa fossa, ainda mais funda e ainda maior, que Bolsonaro acha que é o melhor para o Brasil.
Alguns bolsonaristas, respondendo a esse fato – que o único plano de Bolsonaro é continuar Temer sob uma ditadura -, têm dito que isso não é verdade, pois seu candidato pretende combater a corrupção.
Deve ser por isso que ele gostou tanto da equipe de Temer…
Mencionemos, apenas de passagem, que Bolsonaro ficou 11 anos (2005-2016) no PP – partido tão corrupto que teve sua extinção pedida pela Procuradoria da República – e exatamente no período em que esse partido se locupletava com as propinas do esquema desbaratado pela Lava Jato.
Pode ser que, durante esse tempo, Bolsonaro tenha sido a própria flor do lodo. Mas que ele gosta um bocado de lodo, lá isso é. A ponto de ficar nele durante 11 anos.
Porém, vamos a uma questão mais importante: o grande historiador brasileiro José Honório Rodrigues afirmou, em artigo publicado antes da derrubada da ditadura, que esta fora o regime mais corrupto da História do Brasil.
José Honório, falecido em 1987, não conheceu, evidentemente, os governos Collor, Fernando Henrique, Lula, Dilma e Temer.
Mas o que ele disse – e, na época, era uma constatação quase banal – foi que até então não houvera regime mais corrupto em nossa história, que a ditadura de 1964.
Existem várias testemunhas desse fato – e, aqui, estamos nos referindo somente àquelas que participaram, em 1964, do golpe de Estado, apoiando-o ou como participantes dele.
Uma delas foi o coronel Dickson Grael, autor de um livro intitulado, precisamente, “Aventura, Corrupção, Terrorismo: A Sombra da Impunidade” (Vozes, 1986).
O coronel Grael – pai dos velejadores olímpicos Lars, Axel e Torben Grael -, que ficou famoso por sua denúncia do “terrorismo de Estado” (sic), no caso do atentado à bomba no Riocentro (1981), apoiou o golpe em 1964 e a ditadura durante longos anos, até que sua vivência tomou contato com coisas que eram incompatíveis com seu caráter e moral.
Uma delas era a corrupção – e, pior que a corrupção, o abafamento, pela ditadura, dos casos de corrupção, sempre garantindo a impunidade dos corruptos.
Aliás, foi o próprio Ernesto Geisel que disse: “A ditadura é a corrupção generalizada e impune”.
Outro participante do golpe de 1964, general de quatro estrelas, Antônio Carlos de Andrada Serpa, disse, depois de romper com a ditadura: “Em 1964, nós seguramos a vaca para os americanos mamarem”.
Voltemos agora, ao momento atual.
Se a ditadura passada – que tinha gente muito melhor do que Bolsonaro, Mourão e Guedes – já era essa mistura promíscua de corrupção, entreguismo, e, claro, repressão, imagine-se uma ditadura para continuar o governo Temer…
CARLOS LOPES