O governo Bolsonaro prevê destinar a menor porcentagem do PIB (Produto Interno Bruto) em 12 anos para investimentos em 2022. Segundo economistas, enxugar o papel do Estado em um momento de crise será uma tragédia para a economia.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do ano que vem prevê R$ 25,7 bilhões para investimentos públicos – um valor historicamente baixo e conflitante com o momento de crise econômica e sanitária. O valor representa 0,27% do PIB – a soma de bens e serviços produzidos no país – do ano anterior.
Neste ano, apesar da pandemia ter imposto a necessidade de mais investimentos, o valor destinado deverá alcançar não mais do que o equivalente a 0,3% – mostrando que o governo vem, sistemática e drasticamente, tentando reduzir o papel do Estado.
Para o professor e economista Nilson Araújo de Souza, corte no investimento público significa mais estagnação econômica.
“A Proposta de Lei Orçamentária para 2022 prevê um volume de investimento de tão-só 25,7 bilhões de reais, ou seja, exíguos 0,27 por cento do PIB, o nível mais baixo dos já baixos níveis dos últimos 12 anos. E isso ocorre no momento em que o IBGE divulga que, contrariando as promessas do prestidigitador ministro da economia, o PIB estagnou no segundo trimestre deste ano”, disse o professor Nilson ao HP.
“Nos últimos anos, até antigos ortodoxos do neoliberalismo, que prega a ausência do Estado da economia, estão promovendo a redescoberta keynesiana de que, em momentos de crise, só o investimento público pode protagonizar a retomada da economia. Redescoberta porque desde Alexander Hamilton, o primeiro ministro da fazenda dos EUA, se sabia do papel do Estado na alavancagem do desenvolvimento”, pontua o economista, ressaltando que a consequência drástica disso é a manutenção dos elevados níveis de desemprego.
“E, para enfrentar essa situação dramática, só há uma saída: investimento público para alavancar a reindustrialização e a retomada das obras de infraestrutura”, afirma Nilson Araújo.
“Os investimentos em patamar tão baixo são insuficientes para repor a própria depreciação do estoque do capital público. E estamos já há muitos anos com esse investimento líquido negativo”, explicou Amaral. “Isso leva a uma deterioração da infraestrutura do país e sem dúvida dificulta a retomada econômica”, opina o economista Vinicius Amaral, consultor de Orçamento do Senado, responsável pelo levantamento sobre o valor previsto para o Orçamento no ano que vem, divulgado pelo Valor Econômico.
Sob a justificativa de que o teto de gastos e o excesso de despesas discricionárias e obrigatórias “engessam” o orçamento, Amaral afirma que é importante que haja discussão para que os investimentos públicos “saiam dessa restrição forte a que hoje estão submetidos”. “Dentro das atuais regras fiscais, especialmente o teto de gastos, o espaço realmente fica muito curto”, explicou.
Para o economista do Núcleo de Finanças e Políticas Públicas da Faculdade de Campinas (Facamp) Saulo Abouchedid, os dados de investimentos mostram que o governo está encarando 2021 e 2022 como anos “normais”, sem efeitos da pandemia sobre saúde e economia. “Em 2021, já vemos uma volta ao que estava acontecendo desde 2017 por causa do teto de gastos. O ano passado é que foi uma exceção devido ao Orçamento de Guerra e das medidas contra a covid-19”, declarou para reportagem do Valor.
“A redução do investimento público acaba fomentando também a queda do investimento privado”, disse, completando que isso vai afetar também a geração de emprego e renda.
Por dentro da discussão do teto, Abouchedid acrescenta que “independentemente de o teto ser bom ou ruim”, seu cumprimento não deveria ser a prioridade neste momento. “A gente não deveria estar pensando no teto agora, mas na retomada da economia.”
PRISCILA CASALE