A comissão realiza a segunda reunião na próxima quinta-feira (29), quando o relator vai apresentar plano de trabalho ao colegiado. Na semana seguinte, terça-feira (4), a CPI realiza a primeira audiência pública que vai instruir as investigações
O Senado Federal instalou, nesta terça-feira (27), a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que vai iniciar as investigações relacionadas às ações e omissões do governo federal diante da pandemia da Covid-19.
Ao instalar os trabalhos do colegiado foram eleitos à presidência e vice-presidência da CPI, respectivamente, os senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Aziz, por sua vez, designou relator dos trabalhos, o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Omar Aziz recebeu 8 votos, entre os 11 membros da comissão, e derrotou Eduardo Girão (Podemos-CE), que foi autor do requerimento que estendeu o foco de atuação da CPI da Pandemia para abranger a aplicação por Estados e municípios dos recursos repassados pelo governo federal. Para vice-presidente, Randolfe obteve 7 votos e 4 votaram em branco.
Portanto, caiu a primeira tentativa do governo tentar inviabilizar o início dos trabalhos de investigação dos desmandos e omissões do Planalto, sob a liderança do presidente Jair Bolsonaro, na gestão da Covid-19.
A reunião durou mais de 2 horas, porque os senadores governistas — Ciro Nogueira (PP-PI), Eduardo Girão (Podemos-CE), Marcos Rogério (DEM-RO) e Jorginho Melo (PL-SC) —, minoritários no colegiado, tentaram por todo esse tempo, inviabilizar a instauração do inquérito no Senado.
Estes deverão ser os quatro “cavaleiros do apocalipse”. Antes da eleição da Mesa Diretora dos trabalhos, com a respectiva indicação do relator, tentaram cassar a decisão do presidente da CPI, que ainda não tinha sido eleito, e que, portanto, ainda não designara o relator. No que o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que é suplente, chamou de “predição de suspeição”. O senador fez a fala mais incisiva da reunião.
“PREDIÇÃO DE SUSPEIÇÃO”
“Primeiro, eu nunca vi em nenhum tribunal, em nenhum lugar da história, a predição de suspeição. Existe medicina preditiva, mas a predição, alguém predizer que alguém será suspeito, é um ato extremamente equivocado e autoritário, porque é um prejulgamento e não um fato em si”, disse.
“Não há um fato: é uma predição de suspeição. Isto não existe em nenhum lugar — em nenhum lugar — escrito, essa questão da predição de suspeição. Então, eu queria dizer ao meu colega Jorginho que essa categoria não existe”, enfatizou.
“A segunda questão é achar que um parlamentar eleito pela população do seu Estado, que representa um pensamento, não tenha, imanente à natureza da função que exerce, preferências, posições políticas”, destacou.
“É um ato de extremo autoritarismo achar que se deve submeter qualquer que seja o Parlamentar à posição do pensamento de um determinado Parlamentar ou de uma determinada corrente política. Isso é autoritário, isso é incondizente com a condição do exercício da função parlamentar. Essa é a segunda questão”, acrescentou.
CONVOCAÇÕES E DOCUMENTOS PARA AS INVESTIGAÇÕES
Ao assumir formalmente a relatoria dos trabalhos, o senador Renan Calheiros afirmou que “nós estamos discutindo aqui o direito à vida, não se alguém é da direita ou da esquerda. Minhas opiniões ou impressões serão subordinadas aos fatos. Serei relator das minhas convicções, mas serei igualmente o redator do que aqui for apurado e comprovado. Nada além, nada aquém.”
Segundo Renan, a “CPI não é uma sigla de ‘comissão parlamentar de inquisição’; é de investigação”. Ele disse ainda que “nenhum expediente tenebroso das catacumbas do Santo Ofício será utilizado” nos trabalhos da CPI. “A CPI, alojada em uma instituição secular e democrática, que é o Senado da República, tampouco será um cadafalso com sentenças prefixadas ou alvos selecionados”, pontificou.
“Não somos discípulos nem de Deltan Dalagnol, nem de Sergio Moro; não arquitetaremos teses sem provas ou powerpoints contra quem quer que seja. Não desenharemos o alvo para depois disparar a flecha. Não reeditaremos a República do Galeão. Agindo com imparcialidade, a partir de decisões coletivas, sem comichões monocráticos, ninguém arguirá nenhum tipo de suspeição no futuro desse trabalho.”
Já no papel de relator, Renan apresentou 11 requerimentos de convocações e documentos para as investigações.
O documento inclui, entre os pedidos, a convocação do atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e os três últimos ministros que o antecederam: Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello.
GOVERNO COMEÇA MAL
O governo federal primeiro empreendeu guerra psicológica contra a CPI e seus membros. Começou tropeçando na juntada de provas para se defender. Apresentou ao colegiado mais provas contra si do que propriamente defesa. “Delação precoce”, ironizou o vice-presidente eleito da comissão, senador Randolfe Rodrigues.
Na segunda-feira (26), véspera da instalação dos trabalhos da CPI, a Justiça Federal de Brasília impediu, liminarmente, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) de assumir a relatoria da investigação por demanda da deputada bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP). Foi expedida pelo juiz Charles Renaud Frazao de Moraes, da 2ª Vara Federal.
“A decisão é uma interferência indevida que subtrai a liberdade de atuação do Senado. Medidas orquestradas pelo governo Jair Bolsonaro e antecipada por seu filho. A CPI é investigação constitucional do Poder Legislativo e não uma atividade jurisdicional”, escreveu ele.
“Nada tem a ver com Justiça de primeira instância. Não há precedente na história do Brasil de medida tão esdrúxula como essa. Estamos entrando com recurso e pergunto: por que tanto medo?”, acrescentou, em seguida, por meio de rede social.
Durante o transcurso de instalação da comissão, a liminar foi cassada por decisão do desembargador Francisco de Assis Betti, vice-presidente do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), que acatou pedido da Advocacia do Senado, feito na madrugada desta terça-feira.
DECISÕES DA 1ª REUNIÃO
A próxima reunião da CPI, a segunda depois da instalação dos trabalhos, vai ser na quinta-feira (29), pela manhã. Nessa, o relator designado, Renan Calheiros, vai apresentar e submete ao colegiado o plano de trabalho.
Na próxima terça-feira (4), a comissão ouve o primeiro convidado para instruir os trabalhos da investigação.
PLANOS DE TRABALHO
Há, em princípio duas sugestões de planos de trabalho entre os membros da comissão, apresentadas pelos senadores Eduardo Girão e Alessandro Vieira (Cidadania-SE), suplente na CPI. O plano de trabalho oficial da CPI vai ser apresentado pelo seu relator e deverá ser aprovado pelos membros da comissão.
Ambos os documentos dividem o trabalho em áreas temáticas, que poderão ser tratadas como “sub-relatorias”. As duas propostas incluem:
- o emprego de verbas federais repassadas para estados e municípios;
- as medidas sanitárias contra o vírus, incluindo prevenção (como isolamento social) e vacinação;
- insumos para o tratamento de pacientes, como remédios e oxigênio; e
- a situação do Amazonas, primeiro Estado a reportar desabastecimento nos hospitais, no início do ano.
O plano de trabalho de Girão inclui ainda uma quinta sub-relatoria, que trataria de contratos e licitações firmados pelo poder público durante a pandemia.
Os senadores querem a presença do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. As investigações, no que diz respeito aos gastos públicos, seriam auxiliadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República), pela PF (Polícia Federal), pelo TCU (Tribunal de Contas da União) e pelos TCE (Tribunais de Contas estaduais).
MARCOS VERLAINE (colaborador)