Presidente e esposa tentaram trazer as joias clandestinamente, dentro de uma mochila de um assessor do ministro Bento Albuquerque. Eram presentes dos sauditas dados na época da privatização da refinaria Landulpho Alves, na Bahia, comprada pelos árabes
Reportagem do Estadão desta sexta-feira (3) revelou que o governo Jair Bolsonaro (PL) tentou trazer ilegalmente para o país colar, anel, relógio e um par de brincos de diamantes avaliados em € 3 milhões, o equivalente a R$ 16,5 milhões. As peças foram apreendidas no aeroporto de Guarulhos dentro da mochila do assessor do ex-ministro de Minas, Bento Albuquerque.
JOIAS ESCONDIDAS NA MOCHILA
A apreensão dos diamantes ocorreu no dia 26 de outubro de 2021, durante uma fiscalização de rotina entre os passageiros do voo 773 que desembarcaram nos terminais de Guarulhos, com origem na Arábia Saudita. Após a passagem das malas pelo raio X, os agentes da Receita decidiram fiscalizar a bagagem de Marcos André Soeiro, assessor de Bento Albuquerque.
Ao checar o conteúdo de uma mochila, os fiscais se depararam com a escultura de um cavalo de aproximadamente 30 centímetros, dourada, com as patas quebradas. Dentro dela, encontraram, ainda, o estojo com as joias trazidas para Michelle, acompanhadas de um certificado de autenticidade da marca Chopard, diz a reportagem.
As joias eram um presente do regime saudita para o então presidente e a primeira-dama Michelle Bolsonaro e deveriam entrar oficialmente como presente para a Presidência e, nesta condição, os bens, porém, ficariam para o Estado brasileiro, e não com a família Bolsonaro.
Como a opção foi considerar os presentes como pessoais, eles deveriam entrar no Brasil pela alfândega e seus donos deveriam pagar as taxas exigidas pela legislação. Essas taxas equivalem a 50% do valor estimado do item, além de uma multa de mais 25% pela tentativa de entrar no país de forma ilegal. No caso de Bolsonaro, portanto, a retirada formal e correta das joias apreendidas e estimadas em R$ 16,5 milhões custaria R$ 12,3 milhões.
FISCALIZAÇÃO DETECTOU AS JOIAS CAMUFLADAS
A família Bolsonaro resolveu, então, trazer as joias de forma clandestina, dentro de uma mochila. Deram azar porque a fiscalização descobriu a mutreta. Como o pagamento estava fora de cogitação, o que restou a eles foi recorrer à mochila e depois colocar os órgãos do próprio governo para tentar retirar os diamantes sem pagar as taxas. Bolsonaro já havia dito várias vezes que não gostava de pagar impostos e, sempre que podia, sonegava. Esta aí um desses casos.
As joias estavam na mochila de um militar, assessor do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que viajara ao Oriente Médio em outubro de 2021. Nessa época, coincidentemente, estava sendo feita a privatização da refinaria Landulpho Alves, na Bahia. A refinaria foi comprada por um fundo árabe, Mubadala Capital, a subsidiária de gestão de ativos da Mubadala Investment Company, com sede em Abu Dhabi.
O ministro, assim que soube na apreensão, retornou à área da alfândega e tentou dar uma ‘carteirada’ para liberar as joias. Diante da dificuldade de convencer o servidor, Albuquerque abriu o jogo e disse que se tratava de um presente do governo da Arábia Saudita para a primeira-dama. “Isso era um presente. Como era uma joia, a joia não era para o presidente Bolsonaro, né? Deveria ser para a primeira-dama Michelle Bolsonaro. E o relógio e essas coisas, que nós vimos depois, deveriam ser para o presidente, como dois embrulhos”, disse o ministro.
MINISTRO DEU CARTEIRADA MAS NÃO CONSEGUIU LIBERAR A “MUAMBA”
A cena foi registrada pelas câmeras de segurança, como é de praxe nesse tipo de fiscalização. Isso piorou as coisas e o agente da Receita reteve as joias, porque, no Brasil, é obrigatória a declaração ao Fisco de qualquer bem que entre no país cujo valor seja superior a US$ 1 mil.
Segundo a reportagem do Estadão, nos últimos dois meses, foram quatro as tentativas frustradas de Bolsonaro de reaver as pedras preciosas, envolvendo seu próprio gabinete, três ministérios (Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores) e militares. A última ocorreu quando faltavam apenas três dias para o presidente deixar o mandato, em 29 de dezembro.
Um sargento da Marinha, Jairo Moreira da Silvada, da Ajudância de ordem da Presidência, pegou um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) no dia 29 de dezembro e desembarcou no aeroporto de Guarulhos, dizendo que estava ali para retirar as joias. “Não pode ter nada do (governo) antigo para o próximo, tem que tirar tudo e levar”, argumentava o militar, segundo relatos colhidos pelo Estadão. A viagem foi autorizada pelo próprio Jair Bolsonaro.
Em 28 de dezembro, Bolsonaro já havia enviado um ofício ao gabinete da Receita Federal para solicitar que as pedras preciosas fossem destinadas à Presidência da República, em atendimento ao ofício 736/2022, da “Ajudância de Ordens do Gabinete Pessoal do Presidente da República”. Até o comando da Receita tentou entrar na história para conseguir a liberação. Mas os fiscais, que têm estabilidade na carreira prevista em lei, resistiram e não aceitaram efetivar a entrega irregular.
ATÉ ITAMARATY FOI ENVOLVIDO
Sem sucesso na tentativa de retirar os itens na alfândega, o Ministério de Minas e Energia chegou a envolver outra pasta para recuperar as joias. Em 3 de novembro de 2021, foi acionado o Ministério de Relações Exteriores. O Itamaraty reforçou a pressão sobre a Receita e pediu, em ofício, “providências necessárias para liberação dos bens retidos”.
Em julgamento realizado em 2016, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou à Secretaria de Administração da Presidência da República que todos os presentes recebidos por presidentes devem ser restituídos ao patrimônio da União. Segundo a Corte de Contas, os ex-presidentes só podem ficar com lembranças de caráter personalíssimo ou de uso pessoal como roupas e perfumes.
POLÍCIA FEDERAL VAI INVESTIGAR
O ministro da Justiça, Flávio Dino, afirmou nesta sexta-feira (3) que pedirá para a Polícia Federal (PF) investigar a tentativa do governo de Jair Bolsonaro de trazer ao país ilegalmente joias para ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Segundo Dino, o ofício com as informações deverá ser apresentado à PF na segunda-feira (6).
“Fatos relativos a joias, que podem configurar os crimes de descaminho, peculato e lavagem de dinheiro, entre outros possíveis delitos, serão levados ao conhecimento oficial da Polícia Federal para providências legais. Ofício seguirá na segunda-feira”, escreveu o ministro no Twitter.
O mochilão do Bolsonaro com peças de ouro contrabandeadas foram detidas por agentes da Receita Federal, ainda bem que existem funcionários públicos que não são corruptos nem covardes isto é a grande maioria, no entanto, também tem funcionários públicos que agem como capangas isto é minoria.