Disse que terá de “tirar o dinheiro da Educação e da Saúde” para financiar a distribuição gratuita de absorventes higiênicos para mulheres de baixa renda caso o Congresso derrube seu veto
Jair Bolsonaro afirmou domingo (10) que, caso o Congresso Nacional derrube o veto dele ao projeto de lei que viabiliza a distribuição gratuita de absorventes higiênicos para mulheres de baixa renda, ele irá “tirar o dinheiro da Educação e da Saúde” para custear a ação.
A decisão de vetar a distribuição gratuita dos itens de higiene foi publicada na edição desta quinta-feira (7) do “Diário Oficial da União”.
Com os vetos, o programa para combater a chamada precariedade menstrual – ou seja, a falta de acesso a produtos de higiene no período da menstruação – passou a prever apenas campanhas informativas sobre a saúde menstrual.
Bolsonaro argumentou que o texto do projeto que previa a distribuição gratuita de absorventes higiênicos para estudantes, mulheres em situação de vulnerabilidade e presidiárias não estabeleceu fonte de custeio sendo, portanto, segundo ele, inconstitucional.
Segundo Bolsonaro, a despesa com a distribuição dos absorventes higiênicos é superior a R$ 100 milhões. “Ela colocou em distribuição gratuita, mas não é uma cegonha que vai levar a todo mundo”, disse Bolsonaro. “Se o Congresso derrubar o veto do absorvente eu vou tirar dinheiro da saúde e da educação, tem que tirar de algum lugar”, ameaçou.
O texto original aprovado por deputados e senadores menciona, entretanto, o uso de recursos enviados pela União ao Sistema Único de Saúde (SUS). Outra proposta do PL é a de distribuição de absorventes por meio das cestas básicas viabilizadas pelo Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan).
Além disso, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) revelou no ano passado que o Ministério da Saúde não utilizou R$ 3,4 bilhões para o combate à pandemia desde maio daquele ano. O valor correspondia à parte do orçamento emergencial destinado ao Ministério da Saúde para ações de enfrentamento à Covid-19 no país.
Ainda segundo o CNS, R$ 74 milhões foram perdidos por não terem sido destinados a tempo para nenhuma ação.
Segundo a coordenadora da bancada feminina na Câmara, deputada Celina Leão (PP-DF), o custo para a distribuição gratuita de absorventes era de R$ 84 milhões e estava previsto no orçamento.
“Se R$ 84 milhões for muito dinheiro para o governo não dar condições a meninas e mulheres, eu acho que o governo tem que rever os seus princípios. Repudio esse veto e peço ajuda da bancada feminina para que rapidamente a gente consiga derrubá-lo. Se você compra papel higiênico para escola, não pode comprar absorvente? Para os itens da cesta básica, você não pode incluir absorvente?”, questionou.
Ela citou dados do estudo Pobreza Menstrual no Brasil, segundo os quais 713 mil meninas vivem sem acesso ao banheiro ou a chuveiro em seu domicílio. E quatro milhões não têm acesso a cuidados mínimos menstruais, razão pela qual muitas vezes deixam de ir à escola por se encontrarem no período menstrual.
Celina Leão citou ainda Pesquisa da Sempre Livre, de setembro de 2021, que apontou que 28% das mulheres são afetadas pela pobreza menstrual.
“Conseguimos votar um projeto com impacto orçamentário mínimo para gente começar do mínimo. Nós tínhamos que dar acesso a essas mulheres a esse material que não é só kit de higiene; é kit de saúde. Muitas mulheres pegam infecção porque não conseguem fazer uso adequado dos absorventes”, observou.
A lei que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual é fruto de um projeto de lei de autoria da deputada Marília Arraes (PT-PE) e foi aprovado em agosto pela Câmara dos Deputados e, em setembro, pelo Senado Federal.
“Tenho certeza que a Casa vai fazer jus à vontade do povo brasileiro, como é nossa obrigação, e derrubar esse veto, que é um verdadeiro absurdo para as mulheres do Brasil”, assinalou Marília Arraes.
A deputada lembrou que a aprovação da proposta foi fruto de uma negociação ampla envolvendo parlamentares e líderes de diferentes partidos, inclusive com a liderança do governo.
A decisão de Bolsonaro afeta milhares de jovens e mulheres por todo o Brasil. Para se ter uma ideia da abrangência do problema, uma a cada dez meninas em todo o mundo deixam de ir à escola quando estão menstruadas. No Brasil, essa proporção é de uma para quatro.
A pobreza menstrual é uma realidade devidamente reconhecida pelo Fundo das Nações Unidos para a Infância (Unicef).