Enquanto mais de 50 países já iniciaram a vacinação de seus povos, o Brasil vive um momento crítico da pandemia e ainda sem um Plano Nacional de Imunização estruturado, ultrapassando a marca de 200 mil mortes pela Covid-19, nesta quinta-feira (7), segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa realizado a partir de dados das Secretarias Estaduais de Saúde.
O total de óbitos registrados nesta quinta é de 200.011 e 7.921.803 casos confirmados.
Para se ter ideia da dimensão da tragédia, dez meses depois da primeira morte causada pelo novo coronavírus no Brasil, morreram no país o equivalente às populações da cidade de Araçatuba (SP) ou de Angra dos Reis (RJ).
Em agosto, quando o país atingiu 100 mil mortos, a média móvel de mortes indicava lentamente um início de queda e parecia que a situação começaria a melhorar, após 3 meses de um platô de óbitos na casa de mil por dia. A partir daí, a média móvel de mortes baixou para pouco mais de 300 na primeira dezena de novembro, mas logo depois voltou a subir.
Nos últimos dias, Manaus atingiu recorde de novas internações que superaram números apurados em abril e maio, quando houve colapsos no sistema público de saúde e funerário. Nesta quarta-feira (6), Manaus registrou 110 enterros nos cemitérios, número que se aproxima do recorde registrado em 26 de abril do ano passado, quando houve 140 sepultamentos.
Enquanto atingimos essa triste marca, Bolsonaro mantém sua postura negacionista. Nesta semana, ele afirmou que suspendeu a compra de seringas e agulhas devido ao preço alto.
Hoje, ao comentar a morte de 200 mil brasileiros, Bolsonaro disse “lamentar”, mas “a vida continua”.
“A gente lamenta hoje, estamos batendo 200 mil mortes. Muitas dessas mortes com Covid, outras de Covid, não temos uma linha de corte no tocante a isso aí. Mas a vida continua. A gente lamenta profundamente, estou preocupado com minha mãe que tem 93 anos de idade. Se contrair o vírus, [ela] vai ter dificuldade pela sua idade, mas temos que enfrentar isso aí”, disse o presidente.
No dia em que o Brasil comemora a chegada de uma esperança, com a vacina CoronaVac, do Instituto Butantan e do laboratório chinês Sinovac, que teve seu resultado de eficácia de 78% apresentado, Bolsonaro nem mesmo cita a possibilidade de uma saída para esta crise. Ao invés disso, o genocida defende que as pessoas se infectem e “enfrentem isso aí”.
Para Deisy Ventura, professora de Ética da Faculdade de Saúde Pública da USP, a posição negacionista de Bolsonaro e de seu governo, na prática deixou, desde o início, o vírus se espalhar sem políticas eficazes para conter o avanço da transmissão e contagio. “O governo federal sempre atuou para que a doença seguisse seu ritmo natural, sem construir obstáculos, com a ideia de que quanto mais rapidamente se disseminasse, mais rapidamente passaria, o que é absurdo por todos os aspectos”, argumenta.
“Temos uma tendência a responsabilizar as pessoas individualmente, mas elas estão respondendo a um movimento político escandaloso que preconiza que a doença não é grave ou só é grave para alguns, o que sabemos que é mentira. Ninguém está livre de um possível agravamento”, diz a pesquisadora que completa: “Em um outro ambiente institucional, esse comportamento seria repudiado. Mas quando a desobediência é encorajada por parte do governo, quando a gente trata criminoso com indulgência, temos um efeito de banalização de condutas que deveriam ser rechaçadas na sociedade”, diz Deisy Ventura.
“Minha impressão é que o governo brasileiro quer disseminar a Covid-19 entre a população. Não se trata de incompetência, mas de uma estratégia do governo federal”, disse a pesquisadora.
Segundo Deisy, “há uma estratégia clara de disseminação do vírus. E essa é uma ideia eleitoral porque quanto antes acabar, mais cedo se retoma o caminho para 2022”.
A professora da USP aponta três eixos pelos quais Bolsonaro obstruiu e prejudicou o combate à Covid-19: comunicação, gestão e normas.
“O governo mobilizou até mesmo a Secom [Secretaria de Comunicação] e o Ministério da Saúde para serem divulgadores de fake news. Para o discurso extremista e populista não há problema em ser contraditório”, afirmou.