Lula lembrou que países centrais estão abandonando o neoliberalismo e revendo o papel do Estado na economia e que o Brasil fará o mesmo. “Brasil manterá o poder de conduzir as políticas de fomento industrial por meio do instrumento das compras públicas”, afirmou
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, nesta segunda-feira (12), em declaração conjunta feita à imprensa no Palácio do Planalto, após reunião entre ele e a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, que o Brasil não aceita pressões e quer uma relação de “confiança mútua e não de desconfiança e sanções”.
A observação se refere ao instrumento adicional ao acordo apresentado pela União Europeia em março deste ano, que amplia as obrigações do Brasil e as torna objeto de sanções em caso de descumprimento. “Expus à presidente Van Der Leyen as preocupações do Brasil com o instrumento adicional ao acordo apresentado pela União Europeia em março deste ano, que amplia as obrigações do Brasil e as torna objeto de sanções em caso de descumprimento”, disse Lula.
“Em paralelo”, prosseguiu Lula, “a União Europeia aprovou leis próprias com efeitos extraterritoriais e que modificam o equilíbrio do Acordo”. “Essas iniciativas representam restrições potenciais às exportações agrícolas e industriais do Brasil”, denunciou.
“Reiterei o desejo do meu governo de construir uma agenda bilateral positiva. Com cooperação ativa, podemos abrir horizontes benéficos em diversas áreas”, apontou Lula.
Veja o comunicado conjunto do presidente e Lula e de Ursula Von Der Leyen
Presidente Lula se reúne com a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen https://t.co/yb77U43T7e
— Lula (@LulaOficial) June 12, 2023
O presidente brasileiro destacou a importância da ampliação do comércio entre o Brasil e a União Europeia. “Passados 15 anos, constatamos o acerto dessa decisão. Nosso comércio bilateral avança de forma consistente. A União Europeia constitui o 2º maior parceiro comercial do Brasil e nossa corrente de comércio poderá ultrapassar este ano a marca de 100 bilhões de dólares”, destacou.
Lula citou Europa e EUA como exemplos de regiões que estão revendo a doutrina neoliberal e disse que o Brasil vai na mesma direção. “A Europa e os EUA voltaram a reconhecer, após ciclos de liberalismo exagerado, a importância da ação do Estado em políticas industriais. Programas bilionários de subsídios foram adotados nos países desenvolvidos em favor da reindustrialização”, disse ele.
Lula aproveitou para reforçar que vai defender as compras governamentais como instrumentos de política industrial. “O Brasil, que sofreu um grave processo de desindustrialização, tem ambições similares. Por isso, o Brasil manterá o poder de conduzir as políticas de fomento industrial por meio do instrumento das compras públicas”, afirmou.
A guerra também fez parte da fala do presidente. “A volta da guerra ao coração da Europa reflete a complexidade dos desafios dos tempos em que vivemos”, observou. “Lembrei à presidente Von Der Leyen que o Brasil votou a favor de resoluções na ONU que condenaram a invasão da Ucrânia pela Rússia”, disse Lula, acrescentando que o Brasil quer a paz.
“Reiterei nosso empenho em busca da paz, evitando a escalada da guerra e do uso da força e seus riscos incalculáveis. Não há solução militar para esse conflito. Precisamos de mais diplomacia e menos intervenções armadas na Ucrânia, na Palestina, no Iêmen. O horrores da guerra e o sofrimento que ela prococa não podem ser tratados de forma seletiva”, afirmou Lula.
Em seu discurso a presidente da Comissão Europeia não respondeu às ponderações de Lula. Disse que a União Europeia aguarda uma posição do Brasil sobre o instrumento adicional ao acordo apresentado pelo bloco do “Velho Continente”. Sobre a guerra na Ucrânia, Von Der Leyen falou em paz levando em consideração apenas as reinvindicações da Ucrânia, o que não está em sintonia com as preocupações de Lula que busca uma saída realista para o conflito.
Veja o discurso de Lula na íntegra
Declaração à imprensa lida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva após encontro bilateral com a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, no dia 12 de junho de 2023, em Brasília, no Palácio do Planalto
É um prazer receber a Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen. Esta é a 1ª visita de um chefe do Executivo da União Europeia ao Brasil em 10 anos.
A União Europeia e o Brasil coincidem na importância atribuída por ambos ao multilateralismo, à democracia, à promoção da paz e ao respeito aos direitos humanos.
Foi o reconhecimento da importância dessa relação que nos fez assinar, em 2007, nosso Pacto de Parceria Estratégica.
Passados 15 anos, constatamos o acerto dessa decisão. Nosso comércio bilateral avança de forma consistente. A União Europeia constitui o 2º maior parceiro comercial do Brasil e nossa corrente de comércio poderá ultrapassar este ano a marca de 100 bilhões de dólares.
O Brasil também se destaca como o maior destino do Investimento Estrangeiro Direto dos países da União Europeia na América Latina, que se concentram nos setores de manufatura, infraestrutura digital e serviços.
Novas possibilidades vão se abrir com o plano de infraestrutura que lançaremos em breve.
Hoje, os desafios da conjuntura mundial requerem o relançamento dessa associação entre o Brasil e a Europa.
Tratamos de 3 aspectos desse relançamento.
Um dos temas centrais é Acordo Mercosul-União Europeia.
Expus à presidente Van Der Leyen as preocupações do Brasil com o instrumento adicional ao acordo apresentado pela União Europeia em março deste ano, que amplia as obrigações do Brasil e as torna objeto de sanções em caso de descumprimento.
A premissa que deve existir entre parceiros estratégicos é a da confiança mútua e não de desconfiança e sanções.
Em paralelo, a União Europeia aprovou leis próprias com efeitos extraterritoriais e que modificam o equilíbrio do Acordo.
Essas iniciativas representam restrições potenciais às exportações agrícolas e industriais do Brasil.
Reiterei o desejo do meu governo de construir uma agenda bilateral positiva. Com cooperação ativa, podemos abrir horizontes benéficos em diversas áreas.
O caminho deve ser a formação de parcerias para o desenvolvimento sustentável.
A Europa e os EUA voltaram a reconhecer, após ciclos de liberalismo exagerado, a importância da ação do Estado em políticas industriais. Programas bilionários de subsídios foram adotados nos países desenvolvidos em favor da reindustrialização.
O Brasil, que sofreu um grave processo de desindustrialização, tem ambições similares.
Por isso, o Brasil manterá o poder de conduzir as políticas de fomento industrial por meio do instrumento das compras públicas.
Unir capacidades em matéria de pesquisa, conhecimento e inovação é igualmente decisivo como resposta ao desafio de gerar empregos e distribuir renda.
Queremos estabelecer uma efetiva Parceria Digital com a União Europeia, na área de tecnologias da informação, regulação do espaço digital, 5G e semicondutores.
Senhoras e senhores,
A volta da guerra ao coração da Europa reflete a complexidade dos desafios dos tempos em que vivemos.
Lembrei à presidente Von Der Leyen que o Brasil votou a favor de resoluções na ONU que condenaram a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Reiterei nosso empenho em busca da paz, evitando a escalada da guerra e do uso da força e seus riscos incalculáveis. Não há solução militar para esse conflito.
Precisamos de mais diplomacia e menos intervenções armadas na Ucrânia, na Palestina, no Iêmen. O horrores da guerra e o sofrimento que ela prococa não podem ser tratados de forma seletiva.
Os princípios basilares do Direito Internacional valem pra todos.
Finalmente, conversamos sobre a necessidade de reforma da governança global e as expectativas para a presidência brasileira do G20.
Indiquei que nossas prioridades incluirão o desenvolvimento sustentável, centrado no combate à mudança do clima, à pobreza e à desigualdade.
O planeta não suporta mais as pressões de uma globalização predatória do ponto de vista ambiental, social e econômico.
Essa preocupação levou o Governo brasileiro a sediar em Belém, em agosto próximo, a Cúpula dos Países Amazônicos.
Em 2025, retornaremos à Amazônia para a COP 30 do clima, na qual esperamos forte presença dos líderes globais.
Reformar as instituições de governança global, em especial o sistema financeiro global é inadiável, para coloca-lo a serviço da produção, do trabalho e do emprego.
Reformar o Conselho de Segurança das Nações Unidas é garantia de que teremos capacidade coletiva de responder, com eficiência e credibilidade, às ameaças à paz e à segurança internacional.
Cara presidente Von Der Leyen, estamos construindo uma parceira fundada no respeito mútuo e no entendimento.
Reconhecemos que a solução dos principais problemas que enfrentamos no cenário global passa por respostas que levem em consideração os interesses de todos, e especialmente dos mais vulneráveis.
Queremos reforçar os vínculos do Brasil com cada um dos 27 países membros da União Européia e com suas instituições.
Muito obrigado.