“Quando há uma crise grande como esta, nós temos que contar com o Estado na área da saúde e contar com o Estado na economia. Não podemos contar com o mercado de forma nenhuma, porque se deixar por conta do mercado a crise realmente será sem tamanho”, afirma o economista.
Em webconferência promovida pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) sobre “O efeito da COVID-19 na economia brasileira”, o ex-ministro e professor de economia Luiz Carlos Bresser Pereira afirmou que numa crise desta magnitude não podemos contar com o mercado, mas sim com o Estado.
“A pandemia está causando uma crise certamente maior que a de 2008, e uma bem diferente, mas de gravidade semelhante ao grande crash (quebra) da Bolsa de Valores de Nova York e a grande depressão dos anos 30. Quando há uma crise grande como esta, nós temos que contar com o Estado na área da saúde e contar com o Estado na economia. Não podemos contar com o mercado de forma nenhuma, porque se deixar por conta do mercado a crise realmente será sem tamanho”, disse Bresser Pereira, afirmando que a civilização está reaprendendo que o “Estado faz uma diferença” e que o Estado “é um instrumento de organização fundamental para os povos”.
“Nós, há quarenta anos, vimos, primeiros os norte-americanos e os ingleses, depois os europeus em geral e depois os brasileiros liberais, que não se precisava de Estado, que o Estado era mínimo, quer dizer, que tudo teria que ser resolvido pelo mercado; uma loucura completa, uma loucura neoliberal”, enfatizou o economista.
Bresser Pereira explicou que o problema da crise é que enquanto não houver uma vacina ou medicamentos que combatam o coronavírus, medidas de restrições sociais serão necessárias para preservar vidas. Disse que nesta situação o Estado tem que injetar dinheiro na economia para socorrer as empresas, que terão suas atividades prejudicadas até que as pessoas possam transitar pelas ruas e ocuparem os estabelecimentos de trabalho com segurança.
Neste contexto, Bresser disse que isto não só exigirá uma coordenação do próprio Estado, mas também exige muito dinheiro, gastos grandes, porém necessários para que a economia não entre em colapso.
O economista defende que o governo financie ações contra a crise através da emissão de moeda, afirmando que seria ruim aumentar o gasto público através da emissão de títulos da dívida pública. Segundo Bresser, o aumento do déficit público traz medo para setores da sociedade, e por isto, ele defende que ao invés do Tesouro Nacional tomar emprestado do setor privado – o que elevaria a dívida pública – o Tesouro pode pegar dinheiro com o Banco Central, e isto não aumentaria a dívida porque os dois são órgãos do Estado.
“Imprimir dinheiro permite que os gastos sejam maiores, o que é bom para economia e não cria uma dívida para os brasileiros pagarem no futuro. Outros países já estão emitindo moedas no caso do coronavírus, afirmou Bresser, lembrando que a autorização para o Banco Central (BC) está no meio da discussão da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do orçamento de guerra, que tramita no Congresso.
O professor afirmou que o aumento da emissão de dinheiro não fará subir a inflação. Para Bresser essa tese “é uma grande bobagem, um mito dos economistas monetaristas”. Ele explicou que esta é uma ideia errada que os neoliberais têm e que esta teoria já caiu por terra há muitos anos.
“Com a crise de 2008, Estados Unidos, Japão, Inglaterra e outros países europeus fizeram esta operação, emitiram moedas em grandes quantidades para combater a crise, e não aconteceu nada, nenhuma inflação foi constatada nestes países”.
O ex-ministro criticou a atuação da equipe econômica e do presidente da República na atual crise. Disse que o Congresso Nacional está cumprindo papeis que deveriam ser desempenhados por Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes.
“Nós estamos vendo que o ministro Paulo Guedes está resistindo a tudo e a qualquer jeito. O General Braga, ministro-chefe da Casa Civil, fez um plano de investimentos, propôs 70 obras de infraestrutura em funcionamento, uma coisa que me parece em princípio muito boa, e o Guedes protestando, uma situação patética que demostra que o governo não sabe o que fazer”, criticou o economista.
Questionado se a crise abre para o Brasil uma possibilidade para um novo modelo econômico e social, Bresser Pereira disse que espera que o Brasil possa sair da “crise com um sistema econômico melhor, mais eficiente, menos desigual”. O professor destacou que para esta situação ocorrer, “o Brasil precisa de autonomia nacional”.
“Temos que perceber que os nossos interesses são diferentes dos interesses de outras nações, como Estados Unidos, França, Rússia e China. Nós temos que ter uma estratégia de desenvolvimento e essa estratégia precisa ser também com a participação do povo, com melhorias nas condições na vida da população”, defendeu o professor. “Isto só será possível desde que haja crescimento, porque sem crescimento será muito difícil”.
Bresser defendeu também que mecanismos de renda mínima sejam ampliados, como o Bolsa família, por exemplo.
ANTONIO ROSA