A exoneração (nas palavras do ministro, “revogação da nomeação”) de Ilona Szabó de Carvalho, nomeada para suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, confirma o que já dissemos (v. matérias abaixo) sobre a aceitação, por Sérgio Moro, de um Ministério no governo de Bolsonaro.
Com a ordem direta de Bolsonaro para que demitisse Ilona Szabó, Moro descobriu que não tem autonomia para nomear uma suplente de um Conselho em seu Ministério.
Falou-se muito, nos noticiários, sobre a “humilhação” a que Moro foi submetido ou, sem delongas, na “submissão” de Moro a Bolsonaro, no caso da nomeação e revogação da nomeação de Ilona Szabó de Carvalho.
Moro, realmente, não construiu sua trajetória se submetendo, muito menos a um debiloide como Bolsonaro. Portanto, a surpresa de alguns pela exoneração de Ilona Szabó tem alguma razão. Amigos seus comentaram que ele iria passar o carnaval em Curitiba, pensando no assunto. Que os ares curitibanos lhe sejam propícios.
A revogação da nomeação de Ilona provocou, em seguida, a exoneração de Renato Sérgio de Lima, do Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social. Lima, que é diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, comunicou a Moro: “Escrevo para, em caráter irrevogável e em solidariedade à cientista política Ilona Szabó de Carvalho, que foi colocada em uma situação constrangedora no episódio da nomeação e posterior revogação da mesma para uma vaga no CNPCP, fruto da pressão de grupos nas redes sociais, pedir pública e respeitosamente minha exoneração da vaga que ocupo no Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social”.
A base de toda a justificativa – pois era necessário uma – de Sérgio Moro para deixar seu posto à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba, onde era responsável pelos processos da Operação Lava Jato por assalto à Petrobrás, foi que Bolsonaro lhe oferecia “carta branca” no novo Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Isso foi anunciado aos quatro ventos pelo próprio Bolsonaro, pois o problema deste sempre foi usar Moro para dar prestígio a um governo mais do que medíocre, cujas figuras de proa são as mais estúpidas – o Araújo, a Damares, o Vélez e o próprio Bolsonaro – ou as mais suspeitas – a mulher da Monsanto, o sujeito que quer plantar soja na terra dos índios, o cultivador de laranjas em Minas, e, também, o vigarista do mercado financeiro, especializado em golpes sobre fundos das estatais.
Também do ponto de vista de Moro, que outra justificativa poderia haver para deixar um posto em que estava prestando grande serviço ao país, para assumir um cargo em um governo reacionário, alucinadamente obscurantista, com um presidente confessadamente comprometido em burlar a maior das leis – a Constituição – e na companhia da corrupção “baixo clero” (a começar pelo próprio Bolsonaro, os filhos, o Lorenzoni, etc.), corrupção que somente é baixa enquanto não consegue colocar a mão nos grandes cofres da República?
Pois Moro nomeou Ilona Szabó de Carvalho para suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, depois de um debate com ela em Davos, no Forum Econômico Mundial.
Na quarta-feira (27/02), Bolsonaro exigiu que Moro a exonerasse. Os ministros da Casa Civil (Onyx Lorenzoni) e da Secretaria Geral da Presidência (Carlos Alberto Santos Cruz) foram contra, mas, como um deles revelou, Bolsonaro “foi inflexível”. Pela descrição, Bolsonaro estava histérico.
Enquanto isso, um de seus filhos, Eduardo, atacava Ilona, o que foi sinal para que uma matilha passasse a atacá-la na Internet.
Em nota, Moro alegou que a nomeação teve “repercussão negativa entre alguns segmentos”.
Que segmentos?
O segmento Bolsonaro, com certeza, e seu astrólogo oficial, Olavo de Carvalho, diretamente da capital dos escravagistas confederados, Richmond, Virginia.
É pouco importante, nessa questão, qual a posição de Ilona Szabó sobre a Segurança Pública – até porque Moro a nomeou, e ela aceitou a nomeação, pela identidade de pontos de vista entre os dois. Mas é forçoso frisar que sua posição é a favor da posse de armas pela população, ainda que com “um maior controle no porte”.
Embora, na questão da “legítima defesa”, em que Moro e o governo estão propondo, na prática, tornar impuníveis os excessos, ela manifestou-se contrária (sobre a questão dos excessos impuníveis, v. A contribuição da família Bolsonaro ao projeto do Dr. Moro).
Mas nem Moro, quando foi nomeado ministro, era a favor desse dispositivo, que liberaria oficialmente o comportamento “miliciano” dentro da própria polícia.
Logo, não é sobretudo por suas posições sobre a Segurança Pública que Bolsonaro & cia. não querem Ilona Szabó nem para suplente de um conselho do Ministério da Justiça.
O problema é que ela não pertence à seita bolsonarista. E Moro, se quiser permanecer como ministro, mais dia menos dia terá que optar se entra nessa seita ou a manda àquela parte. Nos parece difícil que uma cadeira no STF, que somente ficará vaga no ano que vem, valha esse amesquinhamento. Desse jeito, não se consegue um lugar no Céu. Mas no Inferno…
Após a exoneração, os discípulos do astrólogo – furibundo com a nomeação de Ilona – fizeram uma comemoração virtual.
O assessor especial da Presidência, Filipe Martins, aluno do curso à distância de olavices e parvoíces, escreveu no Twittter: “Grande dia!”. Eduardo Bolsonaro acompanhou, e logo toda uma trupe de anormais estava dizendo a mesma coisa.
Por fim, apareceu o próprio charlatão oficial para, depois de todos os insultos, manifestar, dos EUA, esperanças de que Moro seja homem no Ministério (“Se foi homem como juiz, pode continuar a sê-lo como ministro“), como se ele entendesse alguma coisa disso.
Não é algo que anime ou envaideça algum ser humano.
Alguns órgãos de mídia observaram, como se fosse uma incoerência, que a demissão de Ilona se deu um dia depois de Bolsonaro ter declarado que “nenhum filho meu manda no governo”.
Não é uma incoerência. Bolsonaro é quem manda nos filhos, que são meras extensões suas.
Nenhum deles faz absolutamente nada, que não seja o que ele quer que eles façam.
Abaixo, a íntegra da nota de Moro sobre o caso:
“O Ministério da Justiça e Segurança Pública nomeou Ilona Szabó, do Instituto Igarapé, como um dos vinte e seis componentes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão consultivo do Ministério. A escolha foi motivada pelos relevantes conhecimentos da nomeada na área de segurança pública e igualmente pela notoriedade e qualidade dos serviços prestados pelo Instituto Igarapé. Diante da repercussão negativa em alguns segmentos, optou-se por revogar a nomeação, o que foi previamente comunicado à nomeada e a quem o Ministério respeitosamente apresenta escusas”.
A.S.
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Sempre serei grata ao juiz Sérgio Moro por seu trabalho na Lava Jato, inclusive desbaratando várias quadrilhas importantes de políticos, como a que Lula comandava. Agora, sua decisão de fazer parte do governo do capitão, ainda não consegui me refazer do susto. Sei não. Mas a cada dia que passa me parece mais equivocada.