Técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) investigaram as licitações da Codevasf, vinculada ao governo federal, para asfaltamento e identificaram fraudes em 63 delas, somando R$ 1,13 bilhão.
Empresas organizaram um cartel, liderado pela empreiteira Engefort, para fraudar pregões eletrônicos e abocanhar o dinheiro vindo do governo federal via orçamento secreto.
A Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) é ligada ao Ministério do Desenvolvimento Regional e seu presidente, Marcelo Andrade Moreira Pinto, chegou ao cargo por uma acordo feito entre Jair Bolsonaro e o ex-líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA).
O esquema criminoso agiu na sede da Codevasf, em Brasília, e em suas superintendências regionais, “representando um risco à própria gestão” da estatal, segundo os técnicos.
O TCU abriu uma auditoria sobre o caso depois das notícias veiculadas na imprensa que traziam informações sobre o esquema criminoso no governo. “Diante de tais notícias, em abril de 2022, avaliou-se a existência de indícios de fraude à licitação nos certames de pavimentação”, apontou o TCU.
Foram identificadas fraudes em 63 pregões para asfaltamento, somando um total de R$ 1,13 bilhão. A principal favorecida foi a Engefort, com mais de R$ 890 milhões.
Outras 27 empresas apresentaram propostas de fachada nas licitações, “apenas a cobrir a participação dessa empresa líder [Engefort], compondo o número de participantes dos certames a fim de dar aparência de concorrência”.
Além dessas, sete empresas participaram dos pregões “em troca de garantir a vitória em algumas poucas oportunidades”, como em um rodízio para receber dinheiro público.
Para os técnicos do TCU, 35 empresas participaram do cartel e fazem parte de um “grupo de risco”.
Eles citam a Del Construtora, que é administrada pelo irmão de um dos donos da Engefort. A Del participava das licitações que seriam vencidas pela Engefort apenas para dar um ar de legalidade.
“A ausência de funcionários, as estreitas relações com a Engefort, empresa que sempre participa das mesmas licitações, e a recusa em enviar propostas sempre que convocada indicam que a Construtora Del é utilizada para auxiliar a viabilidade de licitações”, afirmou o TCU.
O esquema criminoso usava propostas falsas para conseguir um desconto abaixo do considerado normal para os técnicos do TCU. A Engefort, nas 50 licitações que ganhou no ano passado, deu um desconto médio de 1%.
Em três anos de governo Bolsonaro, o desconto médio caiu de 24,5% para 5,32%.
O relatório do TCU mostra um caso em Minas Gerais e outro na Bahia em que se suspeita de fraude.
“Nas licitações de Montes Claros [MG] verificam-se indícios de divisão de lotes, onde a Engefort venceu seus lotes com descontos quase sempre inferiores a 1% e outra(s) empresa(s) que participou da disputa se sagrou vencedora de um ou dois outros lotes, sempre com desconto também muito baixo”, apontou o Tribunal.
Em Bom Jesus da Lapa (BA), “a Engefort se sagrou campeã de todos os lotes com descontos entre 0,6% e 1,5%, embora em todos os casos houvesse pelo menos outras três ou quatro empresas participando dos certames”.
O ministro do Tribunal de Contas da União, Jorge Oliveira, reconheceu que houve “elaboração de propostas fictícias, a supressão de propostas e a combinação de rodízio entre as empresas”.
“As questões trazidas pela equipe de fiscalização possuem inegável relevância e materialidade e merecem receber atenção”, comentou.
O indicado de Jair Bolsonaro, no entanto, ignorou o pedido da área técnica para a suspensão de novas licitações.