“O Instituto Butantan passou dossiê para a Anvisa com 10 mil páginas sobre a CoronaVac. Dessas constam todos os dados de todos os voluntários envolvidos. Causa um espanto tremendo a solicitação de mais documentos”, disse o secretário de Saúde de São Paulo
O secretário estadual da Saúde de São Paulo, Jean Gorinchteyn, disse na noite de sábado (9) que causa “estranhamento” os requisitos da Anvisa no processo de aprovação para uso emergencial da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac.
Há uma preocupação, por parte do secretário, de que a Anvisa possa estar novamente sendo instrumentalizada indevidamente pelo Planalto para fins menores, em detrimento da urgência para salvar a vida dos brasileiros.
“O instituto Butantan passou dossiê para a Anvisa com 10 mil páginas. Dessas constam todos os dados de todos os voluntários envolvidos. O que me causa um espanto tremendo [uma solicitação de documentos que faltam], disse o secretário, em entrevista à GloboNews.
“Isso faz parte dos registros do cabeçalho antes de iniciar cada um dos estudos. Sabemos quais são os requisitos, quem confere a vacina e quem confere o placebo “, afirmou o secretário.
“Foi esse estudo que fez com que o escritório independente que analisou esses dados pôde checar como resultado de eficácia, sabendo quem confere e quem não confere a vacina. Se eu tenho um comitê internacional independente, extremamente rigoroso, que conseguiu analisar … Ora , gera questionamento “, acrescentou.
O governador João Doria (PSDB) também advertiu contra a demora na análise do pedido. “Ritos da ciência devem ser respeitados, mas devemos lembrar que o Brasil perde cerca de mil vidas por dia para a Covid-19. Com a liberação da Anvisa, milhões de vacinas que já estão prontas poderão salvar vidas”, disse ele através de seu twitter.
O doutor Jean Gorinchtey seguiu alertando. “O Instituto Butantan tem 120 anos de história, [projetos de] cunhos científicos voltados principalmente ao desenvolvimento de vacinas, com trabalhos de grandes especialistas em medicina e ciência. Esses dados são o mínimo do que posso saber. E quando isso vem à tona, a população pode falar: ‘pera aí, isso que é básico não está vindo, vou questionar a credibilidade desse estudo’. Isso é inafiançável. Quando colocamos isso em xeque, é muito grave no ponto de vista comunitário”.
O pedido de uso emergencial do Butantan foi feito pela manhã de sexta-feira (8), pouco antes de uma reunião com a Anvisa. Às 22h da mesma sexta-feira, o instituto adicionou informações dos estudos. Ontem, o governo de São Paulo informou que a vacina tem eficácia de 78% para infecção e 100% para evitar casos graves e mortes pela Covid-19.
Diante dos pedidos, o Butantan, em nota, comunicou que tudo está “sendo prontamente atendido” e que continua a fornecer os dados solicitados. “O fato de a Anvisa solicitar mais informações, que estão sendo prontamente atendidas pelo Butantan, não afeta o prazo previsto para autorização de uso do imunobiológico”, informou.
São Paulo já tem um estoque de 10,8 milhões de doses da CoronaVac que foram importadas da China e aguarda apenas a aprovação do registro emergencial da Anvisa para iniciar a vacinação da população paulista. O governo já marcou a data de 25 de janeiro para começar a campanha, podendo até mesmo antecipá-la, se a Anvisa não demorar em sua análise.
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) pediu autorização para uso emergencial também na mesma sexta-feira (8) da vacina de Oxford, desenvolvida em parceria com o laboratório AstraZeneca. A vacina da AstraZeneca foi a única aposta do governo Bolsonaro, já que ele se declarou publicamente contra a compra da vacina do Butantan e não encomendou nenhuma outra.
O problema do governo é que essa vacina da AstraZeneca ainda não chegou ao Brasil e não tem data para chegar. Está na dependência de uma importação de 2 milhões de doses do Instituto Serum, da Índia. Foi por isso que o Planalto recuou da recusa na compra da CoronaVac, mas gostaria que a sua vacina chegasse primeiro.
Um possível atraso deliberado na aprovação do uso emergencial da CoronaVac, para atender interesses políticos, seria um desastre em termos de saúde pública, é a preocupação de autoridades sanitárias e do governo de São Paulo.
Documentos que a Anvisa está cobrando do Butantan e que o Secretário de Saúde de São Paulo diz que já foram entregues
1 – Características demográficas e basais críticas da população do estudo – são os dados com as características de todos os voluntários testados como idade, sexo, raça, peso e índice de massa corporal dos participantes. Também são dados de outras características, por exemplo, função renal ou hepática e comorbidades como hipertensão, diabetes, obesidade. As informações devem ser consideradas tanto para quem tomou a vacina, como para quem tomou placebo..
2 – Resultados do estudo por população de “intenção-de-tratamento” (ITT) – para a análise dos resultados dos estudos clínicos são definidas duas populações básicas: a primeira é definida pela “intenção-de-tratamento” (ITT) que inclui todos os participantes independentemente de violações de protocolo e perdas de seguimento; a segunda, chamada de “por-protocolo” (PP), é um subconjunto da primeira, e inclui somente os participantes que completaram o estudo de acordo com os critérios do protocolo, excluindo todos os que tiveram algum desvio.
3 – Dados sobre a disposição dos participantes – significa ter os números exatos sobre voluntários, doses recebidas e número de voluntários que completaram o estudo em cada grupo. É o dado sobre quantos alunos receberam a vacina, quantos tomaram placebo, quanto concluiu como duas doses da vacinação. Também inclui informação sobre quantos voluntários teve acompanhamento pelo período planejado no estudo e explicação sobre voluntários que não concluiu o estudo.
4 – Descrição dos desvios de protocolo – é o detalhamento sobre o que foi feito de forma diferente do que estava no protocolo de pesquisa. Inclui, por exemplo, informações sobre o intervalo entre a primeira e a segunda dose da vacina (ou do placebo).
5 – Listagem de participantes com desvios de protocolo – por exemplo, quantos participantes tomaram somente uma dose, quantos tiveram um intervalo maior ou menor entre doses, para cada centro de pesquisa que participou do estudo.
6 – Dados de imunogenicidade do estudo fase 3 – é uma avaliação que verifica os resultados gerados pela vacina e por quanto ao tempo estes surgem nos participantes da pesquisa.