Reunião do Conselho de Segurança da ONU, realizada sob pressão do governo Trump para “debater a crise no Irã” na sexta-feira (5), acabou num tremendo fiasco para Washington, com a Rússia, a China e a França reiterando tratar-se de “questão interna” fora da alçada do CS, enquanto manifestações massivas por todo o Irã no dia 3 exigiam “morte à América e a Israel” e o chefe da Guarda Revolucionária Iraniana reiterava o “fim da sedição”.
Anúncio da alta de 50% do preço da gasolina e corte de subsídios pelo governo Rouhani desencadearam protestos, que imediatamente foram manipulados por agentes americanos, sionistas e sauditas, com cartazes em inglês surgindo do nada, arruaceiros armados tentando invadir delegacias de polícia e gritos contra o apoio fraterno do Irã à Síria e ao Líbano e contra o aiatolá Khamenei.
Em grande parte, além dos equívocos de Rouhani, os problemas econômicos do Irã se devem ao extremado bloqueio sobre o país, que chegou a ser impedido de exportar petróleo para os países ocidentais e de usar o sistema internacional de pagamentos bancários Swift.
Os confrontos deixaram 22 mortos –entre eles, policiais – e mais de mil presos. Ao contrário da “revolução colorida” de 2009, centrada nos bairros abastados de Teerã, os protestos atingiram cidades menores e três províncias.
O governo Rouhani – que apostou na redução do investimento público para supostamente ‘abrir espaço’ para o capital privado -, principalmente estrangeiro -, agora anunciou o cancelamento imediato dos aumentos no preço da gasolina, e das tarifas de água, luz e gás, assim como um programa de emergência para criar 900 mil empregos até março de 2019.
Na reunião do CS, o embaixador russo Vasiliy Nebenzia bateu de frente com Washington, dizendo à enviada de Trump, Nikki Haley, que ela estava “dispersando a energia do Conselho de Segurança, em vez de concentrá-la em lidar com as principais situações de crise no Afeganistão, Síria, Líbia, Iraque, Iêmen, RPDC, continente africano. O que você está propondo é que “interferamos nos assuntos internos de um Estado”.
Nebenzia acrescentou que Moscou “lamentava a perda de vidas como resultado das manifestações que não eram tão pacíficas. No entanto, deixe o Irã lidar com seus próprios problemas, especialmente porque isso é precisamente o que está ocorrendo “.
A Rússia denunciou a manobra dos EUA contra o Irã como uma hipocrisia deslavada. “Se seguirmos sua lógica, deveríamos ter reuniões do Conselho de Segurança após os eventos em Ferguson ou após a dispersão pela força do movimento Occupy Wall Street em Manhattan”. “Nós não queremos nos envolver em desestabilizar o Irã ou qualquer outro país”, complementou. O pronunciamento do embaixador chinês foi na mesma direção.
Também foi extremamente claro o posicionamento da França, o que coube ao próprio presidente Emmanuel Macron, que reiterou que “a linha oficial perseguida pelos Estados Unidos, Israel e Arábia Saudita, que são nossos aliados de muitas maneiras, é quase uma que nos levaria à guerra “. Ele acusou ainda alguns países de aparentarem ter uma “estratégia deliberada” para minar o acordo nuclear 5+1 com o Irã.
“Caso contrário, acabamos reconstruindo subrepticiamente um” eixo do mal “, disse Macron em referência à infame frase do então presidente George W. Bush para descrever Irã, Iraque e Coréia do Norte.
O presidente francês advertiu ainda que o mundo poderia seguir o caminho de um “conflito de extrema brutalidade”, se as pressões dos EUA sobre o Irã continuassem. No CS, o embaixador François Delattre assinalou que “sim, é claro, para a vigilância e para exigir o pleno respeito da liberdade de expressão , mas não à instrumentalização da crise desde o exterior – porque só reforçaria os extremos, que é precisamente o que queremos evitar”.
Assim, a reunião do CS só reafirmou o isolamento dos EUA e de Trump no mundo inteiro. Para analistas, a exploração da situação doméstica do Irã pelo governo Trump tem como objetivo prejudicar o acordo nuclear de 2015, constantemente repelido pelo presidente bilionário e que foi assinado por Obama, mas mantido pelas nações europeias.
O chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif, denunciou em Teerã que “os eternos companheiros de cama [EUA] Arábia Saudita e Estado Islâmico, seguindo a ordem de Trump, endossam a violência, a morte e a destruição do Irã. Por que nos surpreenderíamos?”.
Apesar de não fazer parte do CS, como parte interessada o Irã teve o direito à palavra, com o embaixador de Teerã, Gholsmsi Khorshroo, afirmando que seu governo tem “provas firmes” de que os confrontos no Irã “foram muito claramente dirigidos do exterior”. Conforme o Washington Post, o procurador-geral do Irã, Mohammad Jafar Montazeri, afirmou na véspera da reunião do CS que um funcionário da CIA americana era o “principal planejador” das manifestações. O governo Trump negou, asseverando tratar-se de “protestos espontâneos”, e a CIA não quis comentar.
ANTONIO PIMENTA
Um país, como o Irã, que está quase tendo armas nucleares, pedindo a morte de Israel, quer o que, que Israel leve numa boa sem se preocupar? Um país, metade do Estado de Alagoas, não pode dormir de touca.