MARIA DANIELA YACCAR*
As primeiras conclusões dos cabildos [reuniões extraordinárias dos cidadãos para debater seus problemas e apontar soluções] que viraram prática comum em consultórios, recintos educacionais, grupos de vizinhos, lugares de trabalho, centros culturais e clubes — houve um muito grande no estádio do clube Colo Colo, com a participação de 1.200 pessoas — mostraram que a demanda central do povo chileno é uma Assembléia Constituinte que deveria gerar uma nova Constituição.
Estes encontros com uma metodologia de discussões grupais continuarão até o dia 7 de novembro. Não são vinculantes, ou seja, “não têm impacto na estrutura formal”. “Vamos levá-los a todo mundo e fazer pressão. Geram poder popular. Isso é o que temos ganhado. Estamos rompendo uma maneira individualista de viver, dedicada ao consumo”, afirmou a sindicalista Carolina Espinoza Tapia, porta-voz da organização NO+AFP (NÃO+ Administradoras de Fundo de Pensão).
Daniela – Quais são as perspectivas da Assembléia Constituinte?
Carolina – No momento ainda não há um caminho definido. A Constituição não tem mecanismos de participação popular. Nem sequer o Poder Legislativo tem faculdade de formular leis que gerem custo fiscal. É muito presidencialista o nosso sistema. Sabemos que ambas as câmaras se puseram de acordo no caminho da Assembleia Constituinte, iniciando por um plebiscito para determinar se o Chile a quer ou não. Isso está começando a caminhar. Nossos cabildos funcionam de maneira autogerenciada e autofinanciada. Algumas autoridades comunais têm inventado seus próprios cabildos. Da parte do Executivo, até o momento não há nenhum sinal nem intenção de escutar ou caminhar em direção a um mecanismo que nos permita transformar esta Constituição.
Daniela – Na agenda da segunda-feira (11) também há uma extensa sessão na Comissão de Constituição da Câmara dos Deputados, com o objetivo de debater e chegar a um consenso sobre um mecanismo que permita a redação de uma nova Carta Magna. Isso implica algum tipo de avanço?
Carolina – Poderia acontecer que se chegasse a ganhar, mas, ainda assim, se poderia questionar a legalidade desse mecanismo. Esta Constituição foi desenhada por Jaime Guzmán, ideólogo do modelo econômico, que tem conseguido implementar este sinistro sistema. Há um montão de meandros que não deixam espaço onde poder gerar transformações. Por isso temos que seguir mobilizados. Não é possível que o Chile continue vivendo assim. Temos medo de que isto possa tratar-se pela mídia como o poder sabe muito bem fazer. Que nos baixem os braços, nos esgotem, nos cansem. Temos zonas de sacrifício meio ambiental, territórios onde há gente que está morrendo intoxicada porque as grandes empresas geram tremendos danos ao ecossistema. Este país privilegia o desenvolvimento empresarial por sobre os direitos à vida.
Encarecem os serviços básicos; a água está privatizada. As empresas fazem negócios com um direito elementar, falham, nos deixam sem provisão por semanas e ninguém faz nada. Acumulou-se tudo. Levantamos-nos de uma vez. Mas foram muitos anos.
*Jornalista, teve esta entrevista publicada no portal Página 12